Seja nos 140 caracteres do Twitter, ou no “textão” do Facebook, é difícil encontrar quem não tenha entrado (e se irritado) nos últimos tempos com uma discussão política nas redes sociais. A velocidade dos fatos parece só botar mais lenha na fogueira: as idas e vindas de Lula como ministro, o eterno processo de cassação de Eduardo Cunha e, mais do que nunca, o impeachment da presidente Dilma Rousseff. Para postar, ou melhor, para analisar esse quadro, a reportagem ouviu personalidades que carregam milhares de seguidores. Elas se dividem entre a desilusão com a agressividade dos debates e a esperança na troca de ideias. Já brigaram, já bloquearam. Mas seguem teclando.
"As redes sociais são a grande democratização da informação, mas também do ódio. Hoje em dia, procuro levar as coisas mais no bom humor. Quando extrapola, bloqueio. Se eu responder, entrar na provocação, a pessoa acaba saindo do anonimato”, comenta o escritor Marcelo Rubens Paiva, que, apesar de não ser petista, se posiciona contra o impeachment: “Tenho percebido mais pessoas nessa linha, principalmente depois dos últimos abusos do (juiz Sérgio) Moro”.
Ativo nas manifestações contra o governo, o humorista Marcelo Madureira, com 100 mil curtidas em sua página no Facebook, conta que tem evitado a discussão política com os amigos petistas mais próximos. Ele diz que, na internet, não quer levar a “discussão para a arquibancada”.
Brasil sofre epidemia de intolerância
Discussão política cria cenário de extremos em que pessoas têm medo de usar roupas vermelhas ou são acusadas de fascistas por usar preto.
Leia a matéria completa“Procuro combater através das minhas ideias. Uso fundamentos. Quando a pessoa começa a me xingar, não levo em consideração. Política é civilização”, afirma Madureira, que lembra um episódio recente que o entristeceu: “Fui muito aplaudido quando cheguei num restaurante em Belo Horizonte e fiquei inicialmente feliz pelo gesto de reconhecimento das pessoas. Mas, logo em seguida, vi um tumulto: era um grupo que saiu da manifestação pró-governo, queria entrar para jantar e foi impedido pelos clientes que estavam lá dentro. Isso me preocupa muito”.
Com quase 2,3 milhões de curtidas em sua página no Facebook, o músico Tico Santa Cruz, da banda Detonautas, que se posicionou contra o impeachment, acumula fãs, mas também inimigos. Ele acredita que consegue tirar debates produtivos das redes, mas admite que há uma parcela considerável que é intransigente e não procura estabelecer um diálogo com argumentos:
“Infelizmente, essa rachadura atingiu também pessoas próximas que considerava amigos. É uma onda insuportável de intolerância e falta de boa vontade para perceber que a democracia permite discordâncias. À medida que a crise política vai se agravando, os nervos de todos ficam à flor da pele, e o cenário se torna cada vez pior. Existe uma dicotomia que beira a infantilidade, ignorando a complexidade da diversidade política institucional, e tudo fica parecendo disputa de time de futebol”.
Também músico, mas a favor do impeachment, o vocalista do Ultraje a Rigor, Roger Moreira, é mais direto ao criticar o outro lado da trincheira:
“Todo esse ódio foi criado justamente pelos petistas com seus métodos sujos. O Twitter era outro ambiente completamente diferente. É impossível ter tolerância com alguém que não respeita as regras de convivência. Ou você ignora essa gente ou parte para a ignorância. Não existe a via da lógica. E eles sabem disso. Sabem que a educação, tanto a formal como a de costumes, nos impede de sermos brutamontes ignorantes como o pessoal da CUT, do MST...”
Se é motivo para postagens de lado a lado, a discussão política na internet também tem servido de inspiração para críticas bem-humoradas às disputas. O tema vem sendo bastante explorado pelo cartunista e colunista de Esportes do jornal O Globo Arnaldo Branco, que já comparou até um morno Fla X Flu em Brasília com as acaloradas brigas entre os contra e os que são a favor do governo.
“Perdi a fé sobre a efetividade dessa discussão na internet. Fica uma esgrima de argumentos que só tem a ver com a sua opinião ganhar. Nessas horas, prefiro o Twitter, pois ao menos lá ninguém escreve “textão”. O clima está tão louco que até quando posto foto de comida no Instagram as pessoas reclamam”, comenta Branco, que tem cerca de 12 mil curtidas em sua página no Facebook.
Bolsonaro e mais 36 indiciados por suposto golpe de Estado: quais são os próximos passos do caso
Bolsonaro e aliados criticam indiciamento pela PF; esquerda pede punição por “ataques à democracia”
A gestão pública, um pouco menos engessada
Projeto petista para criminalizar “fake news” é similar à Lei de Imprensa da ditadura
Deixe sua opinião