Ex-governador do Paraná, Jayme Canet Júnior, morreu nesta quarta-feira (31).| Foto: Marco André Lima/Gazeta do Povo

Imagine a situação de um governante que assume o mandato e, quatro meses depois, vê a economia do estado virar cinzas. Esse foi o cenário enfrentado por Jayme Canet Júnior, que assumiu o governo do Paraná em março de 1975 e que, em julho do mesmo ano, enfrentou a geada negra, dizimando toda a produção cafeeira.

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Ele faleceu na tarde de quarta-feira (31), de falência respiratória, aos 91 anos. O velório começou às 8 horas desta quinta-feira (1º), no Palácio Iguaçu, e o enterro está marcado para 17 horas, no Cemitério Municipal.

No ano passado, depois de mais de quatro décadas de resistência, o ex-governador concordou com o lançamento de um livro sobre sua vida e gestão. “No tempo do Canet – a história do Paraná na década de 1970” foi assinado por Belmiro Valverde – ex-secretário de Planejamento daquele período e falecido em 2014 – Antônio Freitas e Adherbal Fortes.

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Ainda impactado pela notícia da morte do ex-governador, é Adherbal quem conta uma das histórias mais emblemáticas da passagem de Canet pelo governo. Ele teria levado toda a família para conhecer o Palácio Iguaçu. Ao fim da visita, decretou: será a última vez que colocarão os pés aqui. “Ele era contra o nepotismo”, comenta.

Já no discurso de posse, ele deu mostras de que pretendia transformar o Paraná. Declarou que o desafio seria deixar “a condição secular de essencialmente agrícola” para ser “predominantemente agroindustrial”. Só não esperava receber um “empurrão meteorológico”, apenas quatro meses depois. A geada que matou a produção de café – uma das maiores do mundo e motor da economia paranaense – forçou a aceleração dos planos de diversificar as bases produtivas do estado.

Celso Nascimento, que foi assessor de imprensa da Secretaria de Agricultura e é colunista da Gazeta do Povo, conta que só depois de percorrer boa parte do Paraná para avaliar o estrago é que ele foi verificar como havia ficado a plantação de café da própria fazenda. Canet aproveitou para diversificar a agropecuária, incentivando a expansão da soja e do trigo, e para atrair indústrias. Além disso, implantou uma gestão austera, mantendo o número de secretarias em 12 e congelando despesas. Ao final do governo, a revista Veja fez uma reportagem cravando que o Paraná estava pronto para o futuro.

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“A gente se orgulha muito de tudo o que ele fez e do legado que deixou”, revela o neto Marcelo Canet Krause. Ele comenta que apesar de todas as obras feitas pelo avô, foi o jeito empresarial de tocar o governo, com contas em dia, sem deixar dívidas ou gastar mais do que pode, que mais marcou as impressões da família sobre a gestão Canet. Depois de deixar a política, o ex-governador destinou tempo à família e aos negócios nas áreas agropecuária, hoteleira e imobiliária. Sempre que podia, passava um tempo na fazenda em Bela Vista do Paraíso.

Canet enfrentou muitos problemas de saúde. Na década passada, teve um câncer no cérebro, operado nos Estados Unidos, e se recuperou bem. Restaram problemas na visão e na coluna, que não os impediam de continuar indo, vez ou outra, ao escritório que mantinha no centro da cidade. Ele se manteve lúcido até o fim. Deixa viúva, três filhos, oito netos e treze bisnetos. A família pede, atendendo a um desejo expresso por Canet, que não sejam enviadas flores ao velório. Ele preferia que fossem feitas doações ao Instituto TMO, de transplante de medula óssea, que ajudou a fundar.

A gestão

“Primeiro a estrada, o resto vem depois”, era um bordão que Canet, costumava repetir em reuniões com secretários, assessores e prefeitos. Aliou o discurso do “milagre econômico” do governo militar às necessidades da fase pré-industrial do Paraná. Contou com um clima favorável ao Paraná em Brasília, num período de grande influência de lideranças paranaenses na esfera federal.

O ex-ministro Borges da Silveira, amigo pessoal de Canet, contou certa vez que uma das primeiras providências que o governador tomou foi montar uma equipe de não políticos, atraindo nomes de destaque da iniciativa privada, que assumiram funções públicas sabendo que prestariam um serviço temporário e depois voltariam para suas empresas.

Grande legado da administração, o investimento na malha rodoviária promoveu a integração do estado, com a construção de mais de 4 mil quilômetros de novas estradas. Belmiro Valverde contou, em uma entrevista antiga à Gazeta do Povo, que quando Canet assumiu, havia 290 municípios, mas apenas 60 cidades tinham acesso asfaltado. Ao fim do mandato, o número se inverteu: 230 já tinham asfalto.

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De acordo com arquivos da Casa Civil, a rede de transmissão e distribuição de energia elétrica dobrou e o consumo industrial de energia elétrica aumentou em 86%; os serviços de fornecimento de água da Sanepar atingiram 242 sedes municipais e 27 distritos e a capacidade de armazenamento de grãos cresceu de 180 para 440 toneladas. A estimativa é de que o governo teria destinado 36% da receita orçamentária em investimentos públicos, número muitas vezes superior aos pequenos porcentuais destinados nas últimas gestões.

Com 6 mil salas de aula construídas, Canet aumentou em 50% a oferta de vagas nas unidades educacionais do estado. Como reconhecimento pelo apoio à educação, ganhou o título de “Doutor Honoris Causa” pela Universidade Federal do Paraná. Após concluir seu governo, com as modificações políticas que se operaram no país, Canet ajudou a fundar o Partido Popular, que tinha o Tancredo Neves como a grande figura nacional, e depois absorvido pelo PMDB.

Histórico

Canet era paulista de Ourinhos, filho de Jayme Canet e Anita Lopes Canet. O pai, comerciante de café, veio para a promissora região do Norte do Paraná na década de 30. Ele fez seus estudos em Curitiba no grupo escolar 19 de Dezembro e no Ginásio Paranaense. Ainda na década de 40, ingressou na Escola de Engenharia, mas não concluiu a carreira universitária. Optou por seguir na gerência dos negócios da família no comércio e na agricultura, principalmente no ramo da cafeicultura.

A aproximação com a política deu-se durante a eleição para o governo de estado de 1960. Liderança econômica na região de Londrina, coordenou a campanha do candidato azarão Ney Braga em oposição ao candidato Souza Naves, que morreu durante a campanha e foi substituído por Nelson Maculan.

Ocupou importantes cargos na administração pública: como presidente da empresa Café do Paraná e do Banco do Estado do Paraná. Durante o regime militar, após a renúncia do governador Haroldo Leon Perez em 71 e a morte do vice Pedro Parigot em 73 (e de uma rápida passagem do deputado João Mansur pelo cargo) foi nomeado vice-governador do estado na chapa de Emilio Gomes, então o quarto nome a ocupar o Palácio Iguaçu no governo Médici. No ano seguinte, Canet foi escolhido governador do Paraná pelo presidente Ernesto Geisel, decisão homologada pela Assembleia Legislativa, para o mandato de 1975 a 1979.

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Luto oficial

O governo estadual e a prefeitura de Curitiba decretaram luto oficial por três dias. Em nota, o governador Beto Richa declarou que a gestão de Canet foi uma das mais realizadoras na história do estado. “Íntegro, dinâmico e austero, Jayme Canet contribuiu para o nosso processo de transição de um Estado essencialmente agrícola para uma economia industrial”, diz a nota.

Durante o jogo do Coritiba contra o Vitória, na tarde desta quarta-feira (31) no Couto Pereira pela Copa Sul-americana, foi respeitado um minuto de silêncio em homenagem a Canet. Ele foi presidente do Conselho Deliberativo do clube na década de 70.

Em nota, o prefeito Gustavo Fruet afirmou que Canet Junior deixa um legado de honradez e realizações para o Paraná. “A passagem de Jayme Canet Junior pelo governo do Estado está registrada na história como um período de busca de eficiência na gestão pública, rigor na aplicação dos recursos e grande investimento em infraestrutura, além de uma notável ampliação da estrutura da educação, área que ele sempre prezou muito”, disse Fruet.