Os Jogos Olímpicos de 2016, com início em 5 de agosto, vão ocorrer em meio ao processo de impedimento da presidente Dilma Rousseff, ao caos financeiro do governo do Rio de Janeiro e sob o temor de proliferação de doenças transmitidas pelo mosquito da dengue. E ainda há a possibilidade de as disputas coincidirem com operações policiais da força-tarefa da Operação Lava Jato. Diante de tudo isso, é quase certo que a imagem do Brasil no exterior ficará prejudicada – o Comitê Olímpico Internacional (COI) até pediu para o Senado atrasar ou adiantar o cronograma do impeachment.
Obstáculos para a Rio-2016
- Processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff ainda em andamento
- Estado do Rio de Janeiro em calamidade pública, tentando colocar em dia pagamento de servidores e dos serviços públicos
- Temor quanto à propagação de dengue, zika vírus ou outras doenças
- Possibilidade de operações policiais da força-tarefa da Lava Jato
- Protestos
- Cobertura maciça de mídia, para reverberar essas situações para todo o mundo
Pelo calendário da Comissão do Impeachment no Senado, a votação do parecer está marcada para 4 de agosto, um dia antes da cerimônia de abertura. O COI informou que Dilma é uma das convidadas, assim como o presidente interino, Michel Temer, a quem caberá representar a nação. As presenças ainda não estão confirmadas, mas entre os políticos há o temor de se repetirem as vaias como as que marcaram a Copa do Mundo de 2014.
“Manifestações desse tipo afetam a credibilidade, mostram falta de confiança no líderes e fragilidade das lideranças”, afirma Ana Luisa Almeida, professora de Comunicação na PUC-MG. Ela também é presidente do Reputation Institute no Brasil, consultoria internacional que lançou, no dia 23 de junho, a edição 2016 da pesquisa “Os países mais respeitáveis no mundo”, com 48 mil entrevistas no mundo.
O levantamento mostra que o índice de percepção do país no exterior é de 57,8, bem acima da nota interna: 47,5. “Quem mora aqui tem mais informação, reconhece mais os problemas. Com os Jogos e a cobertura maciça da mídia, essa impressão pode reverberar para o resto do mundo. Sem dúvida haverá impacto negativo”, opina Ana Luisa.
Uma percepção ruim pode afetar o turismo, no futuro, assim como exportações e trocas comerciais. “No momento em que o Brasil anunciou que traria a Copa e a Olimpíada, todas as notícias eram positivas. Mas foram feitas promessas para além da possibilidade de entrega”, acrescenta.
Além dos problemas políticos, a situação financeira do Rio agrava a percepção negativa, avalia o professor de marketing da Faculdade Presbiteriana Mackenzie Rio, Alexandre Coelho. “Havia os grandes exemplos de Barcelona, que se transformou após os Jogos, e de Londres, que conseguiu recuperar áreas poluídas e degradadas. Estamos fazendo exatamente o contrário”, diz.
Para Coelho, houve uma sucessão de erros políticos e de planejamento. Além da posse do presidente interino, houve troca de governo no Rio de Janeiro – o titular, Luiz Fernando Pezão, se licenciou por motivos de saúde, e Francisco Dornelles assumiu. No dia 17, ele decretou situação de calamidade no estado por causa de problemas financeiros. “A prefeitura do Rio vende a imagem de perfeição, mas a gente sabe que não depende só do município”, diz o professor.
País precisa passar alegria com o evento, diz consultor
Para o professor de marketing Alexandre Coelho, a única alternativa para a imagem do Brasil não ficar prejudicada é a união do povo em torno dos Jogos Olímpicos. “Se virar uma grande festa popular, como foi a Copa do Mundo, com adesão de todos, alegria, bom humor, seria a salvação.” Ele destaca, porém, as dificuldades para isso ocorrer. “Há ingressos encalhados, muitos deles caros, afastando a população dos jogos”, observa.
Para Ana Luisa Almeida, do Reputation Institute, mesmo que os Jogos sejam um sucesso, há risco para a imagem do Brasil. “Por melhor que seja o evento, as reportagens que estão saindo já mostram os diversos problemas, com destaque para os milhões de desempregados. Se tudo der certo durante a Olimpíada, diminui o impacto, mas já é um cenário negativo”, afirma.
Otimismo
O presidente da Associação Brasileira de Turismólogos (Abbtur), Elzário Pereira da Silva Junior, avalia que a estrutura para os Jogos está pronta, e que tudo funcionará com tranquilidade, porque é organizado pelo Comitê Olímpico Internacional (COI), outras entidades internacionais e multinacionais. “A parte operacional está pronta. Nada vai impactar no andamento dos Jogos. Cada órgão ou empresa contratada pelo COI tem uma função bem específica, bem definida”, diz ele, que atua no Rio de Janeiro.
Segundo ele, os turistas da Olimpíada querem acompanhar os esportistas de seus países, e por isso não se preocupam muito com a situação interna da sede. “O que importará é a mobilidade, mas a prefeitura do Rio já garantiu alguns feriados e montou um esquema para que todos cheguem aos locais de disputa”, afirma. Para ele, não há problema se ocorrerem protestos durante os Jogos. “A indignação precisa mesmo ser mostrada”, diz. Nas últimas semanas, algumas pequenas manifestações vêm ocorrendo nas cidades pelas quais passa a Tocha Olímpica, além de situações inusitadas.
Consultor internacional diz que Brasil precisa ser genuíno
O espanhol Jacob Benbaun, presidente da Saffron, consultoria internacional de gestão de marcas, também avalia que o Brasil passará por uma fase ruim de imagem durante a Olimpíada. Segundo ele, a reputação se constrói ao longo de vários anos, mas ganha destaque em eventos como esse. Ele foi responsável pela marca “Visite Londres”, criada para fomentar o turismo após a realização dos Jogos 2012.
Em entrevista por e-mail, Benbaun ressaltou, porém, que é preciso mostrar atributos genuínos. “Nenhuma marca pode ser construída em palavras vazias, promessas e fogos de artifício. Aliás, até pode, mas seria uma piada de uma marca”, afirma.
O consultor diz que o Brasil merece uma marca para expressar sua diversidade, potencial e beleza. O momento, porém, é de obstáculos. “O país atravessa uma fase ruim, a qual está afetando as percepções internas e externas. Será preciso muita visão política e esforços para corrigir todos os erros de populismo e má gestão.” Ele avalia que o tamanho do Brasil, o consumo interno e a influência política podem contribuir para isso no futuro.
“Os próximos Jogos serão uma oportunidade única para mostrar o que o Brasil realmente é. Não se trata de parecer com o Japão, Suíça ou Noruega. Trata-se de ser genuinamente o Brasil e fazer o mundo enxergar isso”, acrescenta.
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