A casa citada pelo policial federal Jayme Alves de Oliveira Filho, o Careca, como destino do dinheiro da propina paga pelo doleiro Alberto Youssef, delator da Operação Lava-Jato, pertence ao advogado Francisco José Reis, aliado do deputado estadual eleito Jorge Picciani, atual presidente do PMDB do Rio. Chico Reis, como o advogado é conhecido na política fluminense, serviu ao peemedebista como assessor parlamentar, de 1991 a 1997, e como subchefe da 1ª Secretaria da Assembleia Legislativa (Alerj) entre 1997 e 2001 — quando Picciani era o primeiro-secretário. Indicado pelo deputado, deixou a Casa para ser conselheiro da Agência Reguladora de Serviços Públicos Concedidos do Estado do Rio (Asep) e, depois, da Agetransp, a agência reguladora do transporte público no Rio, onde trabalhou até dezembro de 2013.

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Careca, que servia no Aeroporto Internacional do Rio, era um dos entregadores da propina distribuída por Youssef. Ele contou aos investigadores que o doleiro teria lhe dito que a casa pertencia ao deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ), favorito para vencer a disputa pela presidência da Câmara em fevereiro — Cunha negou ter recebido dinheiro de Youssef. Depois, em retificação entregue à PF por seus advogados em 5 de janeiro, o policial disse que não poderia afirmar que Cunha fosse o proprietário. Não mudou, porém, a versão de que teria ouvido de Youssef que a casa era de Eduardo Cunha.

Em dois anos, Careca teria distribuído R$ 16,7 milhões. Em seu depoimento à Polícia Federal do Paraná, no dia 18 de novembro do ano passado, o agente informou inicialmente aos investigadores da Operação Lava-Jato que levou dinheiro em mochilas duas ou três vezes, "há cerca de dois anos, mais ou menos", a uma casa amarela de dois andares na Barra da Tijuca, entregando-o ao suposto proprietário.

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Casa amarela na Rua Fala Amendoeira

Inicialmente, o agente disse que a casa ficava no condomínio Nova Ipanema, na Barra da Tijuca. Na retificação, esclareceu que a propriedade onde entregou dinheiro era, na realidade, no condomínio Novo Leblon, na Rua Fala Amendoeira, também na Barra da Tijuca.

O imóvel, de matrícula 2937, registrado no 9º Ofício de Registro de Imóveis da Capital em 29 de março de 2010, pertence a Francisco Reis e sua ex-companheira, Carmelita Barbosa Santana. Pela casa, o casal pagou na época R$ 1,9 milhão. Na frente do imóvel, Chico Reis costuma deixar estacionado um carro Mercedes branco registrado em seu nome.

No depoimento, Careca descreveu para os policiais como chegava à casa amarela de dois andares onde entregou o dinheiro: "Entrando no condomínio, vira à esquerda, vai até o final, vira à direita, vai quase até o final e vira à direita. É uma casa amarela de dois andares, à esquerda de quem entra na rua". O caminho apontado pelo agente dá exatamente no endereço da rua Fala Amendoeira que está na retificação entregue pelos advogados. A casa, protegida por um muro alto, fica numa rua de mansões vigiadas por câmeras e seguranças.

Prestes a completar 73 anos, o advogado Francisco Reis conhece Picciani há quatro décadas. Eram vizinhos (Picciani morava no bairro Mariópolis, no Rio, e Francisco, em Olinda, bairro de Nilópolis, Baixada Fluminense). Em 1990, Reis teve uma destacada atuação como cabo eleitoral quando Picciani elegeu-se deputado pela primeira vez.

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Em agosto de 2003, quando a composição de conselheiros da Asep foi discutida na Alerj, Picciani pediu que os deputados aprovassem a recondução de seu aliado. Na época, já tinha 30 anos de amizade com o advogado: "Venho à tribuna para pedir um voto pela recondução do Dr. Francisco José Reis. Pessoa que conheço há três décadas e sei que é qualificado e preenche os pré-requisitos de equilíbrio, de moral e de interesse público para compor a Agência do Serviço Público do Estado do Rio de Janeiro".

Chico Reis advogou para Picciani

Políticos ligados ao PMDB garantem que, até hoje, Chico Reis é fiel ao ex-vizinho. Como advogado, defendeu Picciani em ação popular iniciada em 1992 e que se arrastou até o ano passado. No tempo em que atuou na Alerj, era visto como o homem de confiança, responsável pelo cumprimento de missões políticas importantes.

Antes da divulgação do depoimento de Careca, a imprensa já havia noticiado o envolvimento de políticos fluminenses na Operação Lava-Jato. Uma das reportagens, publicada pelo jornal "O Estado de S. Paulo" em dezembro do ano passado, inclui entre os 28 políticos citados no depoimento do delator Paulo Roberto Costa o ex-governador Sérgio Cabral (PMDB), o senador Lindbergh Farias (PT) e os deputados federais Alexandre Santos (PMDB) e Simão Sessim (PP). O nome de Eduardo Cunha, segundo o jornal "Folha de S. Paulo", foi citado na delação premiada do doleiro Alberto Youssef.

Picciani, que vai disputar a presidência da Alerj em fevereiro, informou que não tem nenhum envolvimento com Careca ou com o ex-assessor, e que "cabe a Francisco Reis responder e não a ele, Picciani". "Cada um que carregue o seu fardo, tenho zero envolvimento nisso", disse Picciani, alegando que, há 14 anos, Francisco Reis deixou de trabalhar em seu gabinete e que, depois da sua nomeação como conselheiro, poucas vezes se falaram desde então.

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Procurado, Chico Reis não quis dar entrevista. "Não tenho nada a dizer. Passar bem — disse, desligando o telefone em seguida."