Empresas que contrataram os serviços de consultor do ex-ministro da Casa Civil, José Dirceu, afirmam que buscaram análises do petista sobre conjuntura política ou sua atuação como lobista em países da América Latina ou África. Até mesmo encontros com o ex-presidente Hugo Chávez Dirceu teria intermediado, admitiu um dos contratantes. O ex-ministro alega que todos os serviços teriam sido prestados dentro da lei.
A lista de clientes da JD Assessoria e Consultoria foi tornada pública nesta terça, depois que o juiz da 13ª Vara Criminal da Justiça Federal do Paraná, Sérgio Moro, retirou o sigilo do inquérito que apura a relação do ex-ministro com empresas investigadas no âmbito da Operação Lava-Jato. Entre 2006 e 2013, a empresa do petista recebeu R$ 29,2 milhões, dos quais R$ 8,5 milhões foram repassados por prestadoras de serviço da Petrobras suspeitas de corrupção. Outros R$ 1,45 milhão foram pagos a uma empresa de Milton Pascowitch citado em depoimentos como operador de pagamento de propinas ao PT.
Cliente que mais pagou oficialmente pelos serviços de José Dirceu, a empresa farmacêutica EMS S/A disse ter buscado com a contratação a “internacionalização da empresa”, por meio da “prospecção, expansão e diversificação dos negócios do grupo, exclusivamente em outros países”. Segundo relatório da Receita Federal, Dirceu recebia R$ 150 mil por mês da empresa, que não quis dizer em que países o petista trabalhou por ela. Os pagamentos ocorreram entre meados de 2009 e 2013, e totalizaram R$ 7,8 milhões.
Holding que pertence ao controlador da Hypermarcas, a maior empresa de bens de consumo do Brasil, a empresa Monte Cristalina Ltda. pagou R$ 1,59 milhões ao petista entre 2008 e 2013. Em troca, recebeu “análises e palestras eventuais sobre o cenário político brasileiro”, usada como “suporte para as suas decisões de investimentos”. Em nota, a firma lembrou que “nenhuma empresa em sua carteira de investimento tem contrato de fornecimento com o setor público”.
Quem também buscou a “análise do cenário político brasileiro e latino-americano” a um custo de R$ 20 mil por mês foi o Grupo ABC, do publicitário Nizan Guanaes, que pagou R$ 1,1 milhão ao petista. Os pagamentos foram realizados por meio de duas empresas diferentes: a 24\7 Inteligência Digital, que atualmente não pertence mais ao grupo, e a YPY Participações S.A.
O dono da Consilux Tecnologia, Aldo Vendramin, disse ter contratado Dirceu, ao custo de R$ 1,22 milhão, para assessorar a empresa “no relacionamento com o governo venezuelano”, um de seus principais clientes. Desde 2006 a Consilux participa de projeto de construção de moradia e infraestrutura em bairros populares da Venezuela, ao custo de 416 milhões de dólares, se considerados o valor do contrato e dos aditivos.
“Tínhamos muitas dificuldades com o recebimento (por contratos), havia um desgaste grande com o governo. Foi muito satisfatório o serviço prestado, a relação (com o governo) melhorou muito. Sou grato”, disse Vendramin, segundo o qual Dirceu atuou em conversas com ministros venezuelanos e com o próprio presidente à época, Hugo Chávez.
Responsável por pagamentos que totalizaram R$ 1,5 milhão, a maior empresa de bebidas do Brasil, a Ambev, disse também ter contado com os serviços de consultoria em atendimento às suas operações na Venezuela e “em função do notório conhecimento de que dispunha (Dirceu) acerca do país vizinho”. Na época, o petista teria atuado para evitar que Chaves levasse adiante projeto de confiscar uma das fábricas mantidas pela companhia no país.
Prestadora de serviços de coleta, tratamento e destinação de resíduos em 16 estados brasileiros, a Solví Participações pagou R$ 448 mil a Dirceu entre 2008 e 2010, em apoio “às ações de internacionalização da empresa”, segundo a assessoria. De acordo com a Solví, a atuação de Dirceu se deu “principalmente no Peru”. A empresa considerou o serviço prestado “satisfatório” e disse ter contratado o ex-ministro pelo seu “conhecimento geopolítico da América do Sul”.
Os mesmos atributos foram considerados pela Arns Engenharia e pela Credencial Construtora que pagaram, respectivamente, R$ 600 mil e R$ 200 mil ao ex-ministro. Os pagamentos da Arns foram realizados por meio de sua controladora, a Adne Consulting Group, que buscava novas oportunidades de negócios na área de energia no Peru e na Nicarágua, entre 2007 e 2009. O contrato foi encerrado “em razão do insucesso do objetivo”, disse a empresa, em nota.
Sócio da Credencial Construtora, o empresário Eduardo Meira disse ter procurado Dirceu por intermédio do irmão do ex-ministro, em 2008, em busca de oportunidades fora do Brasil.
“Vislumbrei a hipótese de fazer vendas externas, principalmente para países que dependem da produção de energia por termelétricas”, disse Meira, segundo o qual as reuniões foram “muito proveitosas” e teriam contado com a participação de empresários do Peru, de Angola, de Cuba e até mesmo do Iraque.
Embora afirme não ter conseguido fechar contratos com pessoas apresentadas por Dirceu, Meira considerou a contratação do ex-ministro uma “tentativa válida”. Atualmente, a Credencial presta serviços apenas no Brasil.
Na lista de clientes estão escritórios de advocacia que mantinham relacionamento com o escritório do ex-ministro desde sua saída do governo, como o Tessele & Madalena Advogados Associados, que repassou R$ 179,4 mil, em 2010, e dividia uma sala com ele em Brasília.
O sócio do escritório Lacerda e Franze Advogados Associados, Sidney Franze, disse ter apenas intermediado o pagamento a Dirceu a pedido de um terceiro cliente, que não quis revelar qual é.
“Vou deixar para me manifestar mais à frente, em momento oportuno”, disse o advogado, que intermediou o pagamento de R$ 460 mil a Dirceu entre 2008 e 2011.
Presidido pelo empresário Mário Granero, do grupo Brasil Invest, o Fórum das Américas pagou R$ 100 mil por serviços de consultoria de Dirceu, em 2006. De acordo com a empresa, foram realizados seminários em países como Espanha e Portugal. O ex-ministro foi escolhido, segundo a instituição, porque sua “estatura internacional foi sempre reconhecida”. No mesmo ano, a Brasil Invest pagou outros R$ 20 mil a Dirceu.
As empresas SPA Engenharia, Brasil Vidro, TMKT Serviços, Serveng Civilsan, Comapi Agropecuária e SMK Serviços não responderam aos questionamentos da reportagem. A SNS Automóveis se comprometeu a responder nesta quinta-feira. Não foram localizados representantes das empresas Vox Engenharia, Arbi Rio, Casa Brasil, Carmo Consultoria e Delta Engenharia . Também não foi encontrado um representante da Parmalat do Brasil, que está em processo de recuperação judicial. A marca mundial foi comprada em 2011 pela empresa francesa Lactalis, que não tem escritório no Brasil.
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