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Parece ter passado meio despercebida pelos curitibanos uma declaração de Jaime Lerner. Numa entrevista à rádio CBN neste mês, o ex-prefeito, que praticamente inventou o atual sistema de ônibus da cidade, fez uma denúncia grave: afirmou que atualmente a prefeitura prefere deixar o transporte coletivo da cidade se degradar. Para ele, a intenção seria "justificar o metrô" que se pretende instalar por aqui.

Há dois jeitos de se interpretar o que Lerner disse. Por um lado, pode-se pensar que seja apenas a vaidade do ex-prefeito que esteja se manifestando. Urbanista e arquiteto de renome, Lerner sempre se orgulhou das canaletas, dos ex­­­pressos e do modelo que instalou por aqui nos seus três mandatos. Tanto é que não perde uma chance de espalhar aos quatro ventos quantas centenas de cidades (de Seul a Bogotá) teriam copiado suas ideias.

Lerner, assim, seria contra o metrô porque isso representaria sua obsolescência. Deixaria definitivamente para trás o seu legado mais importante como prefeito. E, como sua moral de ex-governador nunca andou muito bem das pernas, a passagem pela prefeitura continua sendo seu xodó.

Por outro lado, é possível levar a declaração a sério. Lerner não é nenhum tolo. Nesse jeito de pensar, pode-se imaginar que o ex-governador não sairia por aí dizendo coisas como essa à toa. Além do mais, Lerner poderia muito bem defender que o metrô não seja instalado usando apenas argumentos técnicos (o número de pessoas atendidas não cresce o suficiente; a obra custa caríssimo, etc).

O ponto é que, vindo de quem veio, a declaração mereceria ser analisada. Senão pelo Ministério Público, pelo menos pelas autoridades políticas encarregadas de fiscalizar a prefeitura. Ou seja: a Câmara Municipal. Mas sabe-se que a prefeitura (desde os tempos do próprio Lerner, diga-se) mantém uma maioria tão esmagadora e obediente no Legislativo que jamais alguém vai conseguir apurar a sério qualquer suspeita sobre a prefeitura partindo de lá. Basta ver o que aconteceu com a CPI dos Radares, morta cruelmente a pauladas pelos nobres vereadores.

E, embora o sistema de ônibus da cidade tenha seus pontos positivos (não estamos tão mal quanto outras cidades, isso é certo), é visível que a população está realmente insatisfeita. Basta pegar um ligeirinho a qualquer hora, um mi­­­cro-ônibus com motorista tendo de cobrar passagem ou um expresso em horário de pico para ver como é a real situação do transporte na cidade.

De qualquer jeito, já que a Câmara não discute nada que tenha a ver com a prefeitura, cabe aos cidadãos o papel de fiscalizar o que acontece nas ruas. E refletir se o ex-prefeito pode ter razão em sua denúncia ou se estamos apenas vendo um resmungão infeliz com o que fazem com seu legado.

No lixo

O deputado Pastor Edson Praczyk (PRB) apresentou na Assembleia Legislativa do Paraná um projeto que impede as escolas particulares e públicas de usar livros que "contrariem a gramática" ou que tenham elevado teor sexual, com descrições de atos obscenos, erotismo e referências a incesto, ou apologias e incentivos diretos ou indiretos à prática de atos criminosos. O projeto começa por jogar uma ciência inteira no lixo (a Linguística) e acaba colocando no mesmo depósito metade da literatura brasileira. De Mário de Andrade a Guimarães Rosa, tudo estaria proibido.

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