O professor Michael Sandel, de Harvard, conta a seguinte história a seus alunos. Uma senhora idosa tem um problema no encanamento de seu banheiro. O vaso sanitário está com um vazamento. Chama um encanador que, depois de conversar com ela, decide dar um golpe na velhinha: diz que o conserto vai custar 50 mil dólares.
A senhora, seja por ingenuidade ou por não saber o preço das coisas, aceita o acordo. E o negócio só não foi concluído por pura sorte. Ao ir até o banco para sacar 25 mil dólares (a primeira prestação do pagamento), o caixa teria perguntado para que ela precisava de toda aquela quantia. Ela explicou. "Meu vaso sanitário está com problemas". O caixa chamou o gerente, eles conversaram com a velhinha e ela, obviamente, foi instruída a cancelar o acordo com o encanador.
Sandel pergunta a seus alunos sobre a justiça do cancelamento do acordo. E, curiosamente, nenhum deles achou que o encanador acusado de ser inescrupuloso merecia receber uma indenização pelo contrato desfeito.
Os responsáveis por defender o dinheiro público de Curitiba talvez devessem estar presentes à aula. Poderiam falar sobre um outro caso interessante envolvendo contratos, acusações de falta de escrúpulos e cancelamento de acordos. Teriam de contar, no entanto, que, na versão tropical, o acusado corre o risco de sair de cena com uma bolada milionária nas mãos.
Pelo menos é o que parece estar acontecendo no caso da Consilux. A empresa responsável pelos radares da cidade ficou em situação constrangedora depois de uma reportagem nacional mostrando um diretor da empresa falando que era possível apagar multas do sistema. O prefeito Luciano Ducci decidiu de pronto cancelar o contrato, que vinha de uma década atrás. A alegação, claro, é de falta ética grave.
Indenização
Mas, logo em seguida, veio a notícia de que a procuradoria do município já estudava o tamanho da indenização devida à empresa. Preste-se bem atenção: indenização pelos meses em que a empresa não vai prestar serviço nenhum aos curitibanos. Na conta da reportagem, a conta pode ficar em R$ 11,4 milhões.
Então, fica combinado: pagamos o valor sem achar demais. Mesmo sabendo que pelo menos uma dúzia de creches públicas poderia ser erguida por esse valor.
O papel da procuradoria do município, a essa altura, é tentar defender o dinheiro público. Afinal, a falta ética alegada pela prefeitura era ou não grave o suficiente para anular o contrato? Se sim, não devemos à Consilux. À procuradoria restaria defender na Justiça o ato do prefeito como sendo correto. Se a falta não justificava o cancelamento do contrato, o erro foi jogar milhões fora sem antes se ter certeza do que se estava fazendo.
O que definitivamente não é justo é pagarmos todos pelo erro de alguém. Ou da Consilux, por fazer o que não devia; ou da prefeitura, por indenizar um contrato que agora não parece disposta a contestar na Justiça.
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