O Judiciário alfinetou de maneira quase elegante a presidente Dilma Rousseff nesta semana. Numa portaria conjunta dos tribunais superiores, os meritíssimos ministros informaram que o corte de verba anunciado pelo governo inviabiliza as eleições em formato eletrônico para o ano que vem.
Sem estridências: nada mais formal do que uma portaria. Sem adjetivos: tudo na linguagem sisuda do pessoal que veste a toga. Mas o recado estava dado. A presidente atrapalha o bom andamento da nação.
Obviamente, apesar da elegância, a mensagem é um blefe, para não usar termo mais pesado. No fundo, claro que ninguém quer perder dinheiro, e é evidente que o governo federal tem imensa parcela de culpa na falta de verba. Afinal, cortar R$ 10 bilhões do orçamento é coisa para quem gastou demais. A estocada tem seu sentido, e Dilma bem mereceu ser alvejada. Mas os senhores ministros também têm sua parcela de culpa no cartório.
Os tribunais dizem que a compra de urnas eletrônicas, necessária para que não se volte a votar em papel, depende de R$ 200 milhões. Dilma anunciou a suspensão de R$ 428 milhões para a Justiça Eleitoral daqui até novembro. Culpa do governo? Culpa do governo.
Mas o repórter Andrea Torrente lembra bem: só o auxílio-moradia implantado recentemente pelos meritíssimos custa aos mesmíssimos cofres coisa de R$ 1 bilhão por ano – ou mais, contando os efeitos-cascata que sempre se seguem às mordomias.
Daria para dizer que as casas de nossos juízes custaram cinco vezes o necessário para garantir as eleições do ano que vem? Não. Pelo simples fato de que o auxílio-moradia, como se sabe, não é para pagar moradia. O próprio presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, Renato Nalini, disse ao vivo e a cores em rede de tevê que isso era um jeito de aumentar o salário dos juízes. Afinal, dizia ele, a população merece um juiz bem vestido e não dá para ficar indo a Miami comprar terno toda hora.
A Bolsa-Miami não é o que vai nos roubar a eleição eletrônica. Até porque é evidente que se trata de um blefe para que não tirem verbas do Judiciário. Mas é uma pequena amostra de como os juízes desperdiçam tanto dinheiro quanto os políticos.
Aumentam os próprios salários, criam benefícios, apresentam uma nova lei da magistratura que garante privilégios até para seus filhos e ao mesmo tempo reclamam que não têm como atender minimamente a população.
Os juízes não precisam do auxílio-moradia. Os que ganham menos ganham muito bem: acima de R$ 20 mil. Os R$ 4,5 mil extras que lhes são pagos todo mês foram um presente do próprio Supremo Tribunal Federal, que agora assina a resolução conjunta ameaçando com o fim da votação eletrônica. Os juízes não precisam estar fora de sua cidade de origem para receber a verba; nem precisam gastá-lo com residência; nem precisam comprovar como gastaram. É salário em cima de um salário já alto.
Nada contra juízes ganharem bem. Mas os privilégios têm que ter como teto o bom senso. Mais do que juízes bem vestidos, a população precisa de bons serviços. E num país em que falta tanta coisa já está mais do que na hora de suas excelências pararem de aumentar os gastos consigo mesmos.
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