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Horrorizados, 450 deputados federais demonstraram ao país que não poderiam aceitar o crime de Eduardo Cunha. Há um ano e meio, metade deles elegeu Cunha presidente. Experientes, votaram crendo se tratar de alguém capaz de manter o decoro. Jamais imaginaram tal afronta.

O crime julgado é o único verdadeiramente não aceito no Parlamento. Basta ver que as bancadas todas se uniram para expelir o corpo estranho – até pouco tempo atrás tão querido por tantos! – que se mostrou uma decepção.

A aversão do Congresso a esse erro é tamanha que mesmo numa Casa com 150 investigados ele foi julgado de maneira sumária. Uma votação fragorosa, para não deixar dúvidas – verdadeira punição exemplar. Avalie: 18 réus da Lava Jato fizeram questão de comparecer simplesmente para votar pela cassação do ex-presidente.

A bancada dos indignados inclui Paulo Maluf. Sem poder deixar o país, procurado pela Interpol, réu em três ações penais, Maluf chegou a ser preso. Responde por crimes contra o sistema financeiro nacional e está condenado na França a três anos de prisão por lavagem de dinheiro. Mas contra o crime de Cunha ele foi firme. Não pode aceitá-lo: votou pela cassação.

Alberto Fraga, do Distrito Federal, com ainda mais processos do que Maluf, também se indignou. Coronel na PM, Fraga é acusado de concussão, peculato, falsidade ideológica e de crimes contra o sistema nacional de armas. Mas não pode aceitar o erro de Cunha. Esse tipo de coisa, na cartilha de Fraga, não se faz – há limites para tudo.

Mas afinal, qual foi esse crime tão imperdoável?

Num papelzinho que correu pelo plenário e que será arquivado nos anais da Câmara, afirma-se que foi o de mentir para seus pares durante uma CPI. Quebra de decoro. Uma formalidade.

Como se sabia que essa versão, por ingênua, não colaria, criou-se a versão em off: Cunha, como Dilma, caiu pelo “conjunto da obra”.

Sabe como é: dinheiro na Suíça, acusações de propina... o pacote todo. Fosse isso, e pelo menos uma centena de deputados teria de deixar suas vagas ainda hoje. O que aconteceu foi outra coisa.

O crime de Cunha é algo tão grave que, segundo alguns, é pecado mortal. Hitchcock, especializado em retratar o mundo do crime, chamava-o de décimo primeiro mandamento: “Não serás pego”. Outros parlamentares foram pegos, investigados e até denunciados. Mas jamais da forma escandalosamente inaceitável como ocorreu com Cunha.

Em Brasília, todo mundo sabe: é preciso uma certa discrição. Não basta apagar rastros. É preciso não criar inimigos poderosos o suficiente que queiram devassar sua vida e que queiram destruí-lo publicamente. E, principalmente, é preciso não deixar que sua reputação se torne ruim a ponto de poder contaminar a de todos os seus pares.

Todos os demais erros poderiam ser perdoados. Mas colocar os outros deputados na situação de ter que provar que não são corruptos é algo que não se faz. Se Cunha não fosse expulso, seria possível que alguém pensasse que todas aquelas outras denúncias de corrupção contra os outros deputados são verdadeiras.

Mas agora tudo voltou à calma de sempre. Cunha caiu. E os 150 investigados da Câmara podem olhar tranquilos para a população e dizer que a corrupção, enfim, está sendo vencida.

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