Alvaro Uribe, presidente da Colômbia, acaba de conseguir o sonho de todo político ambicioso. Fez o Senado e a Câmara de seu país modificarem a Constituição para permitir que ele dispute mais um mandato no próximo ano. Se conseguir ganhar a eleição (e isso ainda não se sabe se acontecerá) chegará a seu terceiro mandato consecutivo. Segue assim o caminho de outros presidentes latino-americanos em tempos recentes.

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Hugo Chávez aprovou a lei de reeleições infinitas na Venezuela e foi seguido por Evo Morales, na Bolívia, e por Rafael Correa, no Equador. Manuel Zelaya, presidente de Honduras, tentou o mesmo e se deu mal – acabou vítima daquilo que o New York Times classificou de "o primeiro golpe de Estado na América Latina depois do fim da Guerra Fria".

A aprovação de novos mandatos para o presidente que já está no poder é uma ação vil. Muda as regras do jogo enquanto ele está em andamento – e para que uma democracia funcione bem, é necessário que todas as partes envolvidas saibam de antemão quais são as regras que irão encontrar. Essa é a beleza do sistema pós-Revolução Francesa: o mandatário não pode tudo, tem de ficar sujeito a uma Constituição que é superior a ele.

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No Brasil, o presidente Lula teve juízo e não caiu na tentação de disputar um terceiro mandato. Apesar de alguns de seus próprios correligionários instigarem o presidente a fazer isso, ele manteve a cabeça no lugar. E com isso deixou o Brasil numa situação privilegiada na América do Sul.

Na verdade, na história da República brasileira foram poucos os períodos em que as regras do jogo político foram claras (e democráticas). No início, depois dos governos provisórios dos marechais responsáveis pelo golpe que derrubou dom Pedro II, tínhamos eleições com voto aberto (não-secreto) e fraudes que não acabavam mais. Até 1930, para falar a verdade, nem democracia tínhamos.

Depois veio Getúlio Vargas, que derrubou um governo pela revolução e se instalou no governo por 15 anos. No meio do caminho, quando não tinha mais como evitar eleições, aproveitou uma falsa ameaça comunista para desmarcar a votação e dar um autogolpe. Virou ditador e adiou a estabilidade do país até 1945.

Tivemos um curto período democrático até 1964, quando os militares acharam que, de novo, havia uma ameaça comunista no ar e decidiram dar um novo golpe. Prometeram que logo devolveriam o país aos civis. Mas foram gostando da brincadeira e ficaram 21 anos por lá. O país voltou à democracia em 1985. E democracia de verdade, com voto livre, secreto, vários partidos e candidatos. Mas quem disse que os políticos se cansaram de mudar a regra do jogo?

Já no primeiro governo civil, José Sarney conseguiu estender em um ano seu mandato. Fer­­nando Collor não chegou ao fim do governo, não sabíamos como iria se portar. O próximo presidente eleito, Fernando Henrique Cardoso, não se contentou com um só mandato e deu um jeito de mudar a Constituição a tempo de possibilitar que ele ficasse oito anos no poder (o sonho eram 20, mas não foi possível).

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Lula se elegeu e se reelegeu dentro da regra aprovada por seu antecessor e manteve a regra até agora. Enquanto metade dos vizinhos submerge no caudilhismo e vê a estabilidade política oscilar de acordo com o humor de seus governantes, o país caminha tranquilo para o processo eleitoral de 2010. Será a sexta eleição presidencial consecutiva desde a volta da democracia.

Não é muito, mas é um bom começo.

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