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Você pode ter achado a Marcha das Vadias odiosa. Seja pelo nome agressivo ou pela forma de protesto, ou até por não concordar com a causa em si. Ou você pode ter achado o máximo. Aliás, pode ter gostado do protesto pelos mesmos motivos. Mas, em qualquer dos casos, o que não dá para negar é que se trata de uma novidade em Curitiba. De uns anos para cá, começaram a aparecer movimentos sociais de classe média na cidade que, de um jeito ou de outro, lutam por causas.

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Surgiram ONGs de direitos dos negros, passeatas gays, bicicletadas e, sim, agora as feministas. No jargão dos cientistas políticos, é gente que está defendendo valores "pós-materialistas". Ou seja: não estão pedindo asfalto, creche e posto de saúde. Nas palavras dos Titãs: eles não querem só dinheiro, querem ter saída para qualquer parte. Não querem só comida, querem comida, diversão e arte.

No fundo e aos poucos, isso vai fazendo diferença na vida da cidade. Surge uma praça para homenagear os negros que fizeram Curitiba (ainda que meio escondidinha); aparece uma ciclovia no meio da Marechal Floriano; e aos poucos os políticos vão tendo de aprender a lidar com questões de direito que antes não estavam na agenda.

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"Movimentos novos como esses, na forma e no conteúdo, são importantes para sinalizar para os políticos que a retórica saúde-educação-e-segurança não atende mais todos os eleitores", diz o professor Adriano Codato, da UFPR. "Não que essas coisas não sejam necessárias: o Brasil ainda vive uma miséria imensa e é preciso resolver as questões materiais", diz ele. Mas pelo menos a sociedade se vê obrigada a discutir outros temas, e é assim que a coisa vai adiante.

Codato, porém, faz um alerta: isso não quer dizer, necessariamente, que a classe média curitibana está se politizando. "Movimentos como esses, porém, fazem questão de marcar sua distância em relação à política dos partidos. Estão, ou pretendem estar, longe do Estado e de costas para o Parlamento. O que não é necessariamente um bem em si mesmo", fala, citando o cientista político Adam Przeworsky, da Universidade de Nova York. O espírito por trás das manifestações ainda é um tanto anarquista. A política tradicional é vista como um mal a ser evitado – o que pode tornar a coisa toda mais infrutífera.

É certo que os políticos brasileiros andam desacreditados. A Câmara de Curitiba mais ainda. Mas não adianta o sujeito, por si só, achar que vai mudar o mundo. Esse é o primeiro passo: você decidir quais são as coisas boas para você e para o mundo. O segundo passo é convencer amigos, ter um grupo, uma associação de qualquer tipo. Mas depois é preciso lutar para que isso seja estendido para a cidade, para o mundo. Para que vire realidade, e não seja só um projeto quixotesco.

O filósofo francês André Comte-Sponville diz que o erro da geração dele foi acreditar que a moral podia fazer o que só a política pode. No fim das contas, cem pessoas andarem de bicicleta muda algo. Mas para ter uma ciclovia é preciso de ação da prefeitura. E para pressionar a prefeitura, o caminho do Parlamento, da boa e velha ação política não deveria ser descartada.

Que venham mais passeatas. O mundo precisa delas. E nós, mais ainda.

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