Faz parte do folclore político do Paraná a esperta aprovação pela Assembleia, na década de 60, de um dispositivo que dava aos conselheiros do Tribunal de Contas o direito de computar 15 anos de tempo de serviço para fins de aposentadoria já a partir do mesmo dia de sua nomeação para o cargo. Foi uma daquelas "obras" do matreiro deputado Anibal Khoury, que enxertou no texto de uma lei que tratava de educação o absurdo privilégio aos conselheiros.
A história, real, documentada por Sylvio Sebastiani, um dos mais profundos conhecedores (e combatentes) dos métodos heterodoxos há muito praticados na Assembleia, repete-se agora em âmbito federal. Na Lei 12.382/11, que em fevereiro último elevou o salário mínimo de R$ 510,00 para R$ 545,00, foi enxertado um artigo (o 6.º) que nada tem a ver com o objeto principal. Só agora, no entanto, se percebe o tamanho da dor de cabeça que o tal artigo pode provocar para incautos contribuintes.
A artimanha foi notada pelo presidente da Associação Comercial do Paraná (ACP), Edson Ramon, que começou ontem um movimento junto à bancada federal do Paraná pedindo a retirada do enxerto, que classificou como uma "ação sorrateira que fere os princípios da boa-fé que, fatalmente, contribuirá para sobrecarregar ainda mais a Justiça", diz no ofício que endereçou ontem aos parlamentares.
O assunto é grave: o dispositivo contrabandeado para a lei do salário mínimo muda uma lei de 1996 que determinava a extinção dos processos criminais contra contribuintes inadimplentes com o fisco federal a partir do momento em que firmassem acordo de parcelamento de suas dívidas junto à Receita Federal. Agora não: os processos criminais seguirão seu curso mesmo com o compromisso formal de regularização dos débitos tributários aceito pelo governo.
"Isto representa a cassação de um direito consagrado, o direito de acordo", diz Ramon, para quem coisas assim "são próprias de um estado fiscalista e totalitário, ou seja, contrárias aos pressupostos de um estado de direito".
O presidente da ACP recorre à Lei Complementar 95, de 1998, para argumentar pela retirada do enxerto feito na lei do salário mínimo. Diz o artigo 7.º: "A lei não conterá matéria estranha a seu objeto ou a este não vinculada por afinidade, pertinência ou conexão".
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Olho vivo
Bituca
Mais um importante projeto foi aprovado ontem na Câmara Municipal de Curitiba. De autoria da vereadora Noemia Rocha, ele prevê a reciclagem dos filtros de cigarro. Por isso, proíbe os fumantes de jogar bitucas em qualquer lugar devem jogá-las em lixeiras especiais que a prefeitura será obrigada a instalar nas ruas da cidade. Feito isso, as bitucas (com os respectivos filtros) serão doadas a cooperativas e associações para reciclagem. O projeto passou pela Comissão de Economia e Finanças da Câmara e logo concorrerá, no plenário, com outras votações importantes, como de nomes de rua, homenagens e títulos de cidadania.
Voo cego 1
O líder do governo na Assembleia, deputado Ademar Traiano, continua com dificuldades para explicar o contrato firmado pela Casa Militar de aluguel de jatinho e helicóptero para uso de Beto Richa. Por três meses de locação das duas aeronaves, o governo vai pagar R$ 2 milhões à empresa contratada, a Helisul tudo sem licitação. À falta de informações fornecidas pelo próprio governo, Traiano confessou ter se valido de explicações da Helisul, a empresa contratada.
Voo cego 2
A empresa não está sendo questionada no pedido de informações aprovado pela Assembleia e endereçado ao governo. Os questionamentos dizem respeito às justificativas e aos atos oficiais que envolveram a locação dos aviões. Dentre os esclarecimentos solicitados está a caracterização do alegado estado de calamidade pública que serviu para justificar a dispensa de licitação. O deputado Traiano, citando opinião de um estudioso, informou que a emergência está legalmente amparada em razão do mau estado de conservação da atual frota.
Voo cego 3
O líder do governo citou a disposição do governo anterior de leiloar dois de seus aviões o jato Citation e o turbohélice King Air por considerá-los inservíveis, o que demonstraria, na sua opinião, o calamitoso estado dessas aeronaves. Entre os declarados inservíveis, no entanto, não estava nenhum helicóptero, embora o governo tenha incluído helicóptero no contrato de locação.