Uma das perguntas que mais se fazem a uma mulher que tem a po­­lítica como instrumento de trabalho é a razão pela qual o público feminino não está representado no Con­­gresso, nas Assembleias Legis­­lativas e nas direções partidárias na proporção adequada à força quantitativa de seu voto.

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Escolher um motivo e a partir dele tentar desvendar essa questão é impossível, dada a gama de causas objetivas e subjetivas envolvidas. Mas uma coisa é certa: a desproporção in­­dica que há correções de rumo a serem feitas, e urgentemente, sob pena de a democracia brasileira perpetuar uma deformação que põe em xeque a própria legitimidade da representação.

O público feminino hoje no Brasil representa 52% do eleitorado. No entanto, as deputadas são 9% da Câmara, as senadoras 15% e as deputadas estaduais em média têm presença de 12% nas Assembleias Legislativas.

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Nesse ritmo, pesquisa do demógrafo José Eustáquio Diniz garimpada pela senadora do PT do Paraná, Gleisi Hoffmann, indica que as mulheres brasileiras levariam 207 anos para alcançar, nos Legislativos, condição de igualdade já obtida em vários setores.

Gleisi é a favor do sistema de cotas para mulheres nos partidos, mas não como vem sendo aplicado, na forma de reserva de vagas para registro de candidaturas. Na opinião dela, o modelo ideal é o que consta na proposta de reforma política a ser examinada pelo Senado: cotas nas cadeiras a serem ocupadas, 50% para homens, 50% para mulheres.

Quanto às razões da baixa participação e representação das mulheres na política, a se­­nadora aposta num conjunto de fatores: resistência dos homens em dividir o poder, um acentuado grau de misoginia (aversão às mulheres) dos políticos quando se trata de compartilhar a profissão, discriminação histórica, imposição de obstáculos que impedem as mulheres de adquirir prática e com isso melhorar o desempenho.

"As regras não são iguais, por isso as cotas me parecem o caminho mais adequado", diz, baseada na experiência do PT, onde a presença feminina na base era ampla, mas ínfima no diretório nacional. O cenário mudou e hoje os 30% de vagas reservadas às mulheres estão ocupados.

Além de adequação da re­­presentação à proporção do eleitorado, Gleisi Hoffmann aponta um dado essencial para que se abra o caminho da paridade: "Questões essenciais para mais da metade da população estão sendo decididas pela parte minoritária".

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Precedentes

Todo mundo se lembra do de­­putado "motosserra" Hilde­­bran­­do Pascoal. Menos gente, mas certamente muitos se lembram do deputado Talvane Albu­­querque.

Ambos foram cassados em 1999 por crimes ocorridos antes de assumirem seus mandatos. Hildebrando, por homicídios cometidos quando era coronel da Polícia Militar do Acre, e o alagoano Talvane, pela acusação de ser mandante do assassinato da deputada Ceci Cunha, em dezembro de 1998, depois da eleição e antes da posse, para assumir como suplente o mandato dela.

O entendimento do Con­­selho de Ética da Câmara de que não se pode cassar parlamentares por atos anteriores ao mandato em curso foi obra do atual ministro da Justiça, José Eduardo Car­­do­­zo. Em 2007, quando era deputado, usou o argumento e instituiu a "doutrina" para salvar mensaleiros descobertos em 2005 e reeleitos em 2006.

Hoje a "jurisprudência" é usa­­­­da pela defesa da deputada Jaqueline Roriz, filmada recebendo R$ 50 mil do operador de um esquema de corrupção montado no governo de Brasília, quatro anos antes de obter mandato federal.

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O senador Aloysio Nunes Ferreira lembra-se bem, pois era deputado quando do julgamento dos casos de Hildebran­­do Pascoal e Talvane Albu­­querque, atuando em um deles como relator e no outro como integrante da Comissão de Constituição e Justiça.

"O decoro é atemporal e se a Câ­­mara concluir que um de seus integrantes é indigno de compor o colegiado por ações presentes ou passadas tem o dever de excluí-lo", diz Aloísio.

Para isso, contudo, é preciso que o Poder Legislativo considere que ainda tenha alguma reputação a zelar.