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Reza a mais recente lenda que a preservação do mandato do deputado condenado à prisão e, em decorrência, à suspensão dos direitos políticos pelo Supremo Tribunal Federal foi um tiro que saiu pela culatra. Por esse raciocínio, o Congresso, envergonhado, apressaria a aprovação de duas emendas constitucionais: uma para acabar com o voto secreto para cassação de parlamentares – ou, numa versão mais radical, para todos os tipos de votações –, outra para tornar automática a perda do mandato de condenados em ações penais depois do trânsito em julgado da sentença.

Pelo que se viu no plenário da Câmara na noite da última quarta-feira, é mais prudente esperar para ver antes de acreditar. A julgar pelo histórico de suas excelências na abordagem do tema melhor mesmo é seguir a lei de São Tomé a fim de economizar frustrações.

Ainda sob os efeitos da ressaca moral da inusitada decisão, deu-se um corre-corre de senadores e deputados a declarar a urgência de se tomar uma providência. Antes tarde, poder-se-ia dizer com boa vontade, não fosse o cinismo. Renan Calheiros, o presidente do Senado absolvido duas vezes por força do voto secreto, pontificou: "A sociedade não tolera mais essa situação", fazendo-se de alheio ao fato de ser personagem de destaque na referida "situação".

Ato contínuo Calheiros marcou para a semana que vem a votação em plenário da emenda do senador Jarbas Vasconcelos que dirime a dúvida constitucional sobre quem dá a última palavra sobre a cassação de condenados, vinculando definitivamente o mandato à decisão da Justiça. Isso depois de assistir inerte à lenta tramitação da proposta desde o arrefecimento do ânimo em torno da "agenda positiva" resultante dos protestos de junho. A coisa só voltou a andar no dia seguinte ao estapafúrdio perdão dado a Natan Donadon, por causa da reação de fora. Se dependesse da "de dentro", a emenda continuaria sendo cozida em banho-maria.

Mas, vamos que o Senado a aprove no dia marcado (10 de setembro), a PEC terá ainda de passar por dois turnos de votações na Câmara. E lá anda a passos de tartaruga a emenda que acaba com o voto secreto. O presidente Henrique Alves determinou a suspensão de cassações até que a regra seja mudada. E quem garante que será? Note-se: falamos de quórum de três quintos nas duas Casas, muito mais difícil de ser alcançado que a maioria absoluta exigida no caso de Donadon.

O andar da carruagem dessa proposta é tortuoso. No meio do escândalo do mensalão, em 2006, a Câmara aprovou em primeiro turno o fim total do voto secreto, até para o exame dos vetos presidenciais. A segunda votação que permitiria o projeto ir ao Senado nunca se realizou.

No ano passado, empurrados pelo episódio que resultou na cassação de Demóstenes Torres, os senadores concluíram a aprovação do voto aberto só para cassação de mandatos. A emenda chegou à Câmara praticamente ao mesmo tempo em que se iniciava no Supremo o julgamento do processo do mensalão.

O então presidente da Casa, Marco Maia, chegou a dizer ao relator na Comissão de Constituição e Justiça, Alessandro Molon, que queria aprovar a PEC ainda em sua gestão. Mas o julgamento começou, a situação dos réus foi se desenhando periclitante e, certamente não por coincidência, o voto aberto deixou de ser urgente.

O assunto foi retomado em junho como parte da "agenda positiva". Aprovada na CCJ, a emenda seguiu para uma comissão especial e lá está no aguardo da realização de 10 a 40 sessões, das quais até agora só uma foi realizada.

Esse é o ritmo, cuja lentidão autoriza a desconfiança sobre o que vem adiante. Pode ser que os protestos marcados para 7 de setembro surtam algum efeito, pois as manifestações de junho, ao que se vê no Parlamento, entraram por um ouvido e saíram pelo outro.

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