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Algumas reflexões sobre o auxílio-moradia para juízes aprovado pela Assembleia Legislativa do Paraná:

• 1) Os magistrados reclamam há anos da defasagem de salário causada pela falta de reajustes. A remuneração deles está vinculada ao teto do funcionalismo público no país – o subsídio pago a ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).

• 2) Como a remuneração dos ministros do STF precisa da aprovação do Congresso Nacional, o que tem dificultado a implementação de reajustes para os demais magistrados, em todo o país os tribunais passaram a criar benefícios adicionais, entre eles o auxílio-moradia.

• 3) Mas o artigo 39, 4§, da Constituição Federal determina que membros de poder sejam exclusivamente remunerados por subsídio "fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória". Ou seja, a Constituição literalmente proíbe recebimento de adicionais.

• 4) Para criar benefícios proibidos, só com malabarismos linguísticos. Os defensores desses auxílios argumentam que a Constituição proíbe adicionais "remuneratórios", mas não impede a criação de vantagens "indenizatórias". Por essa linha de raciocínio os auxílios indenizatórios não violariam a Constituição. É o "jeitinho jurídico", algo que quando usado por altos agentes públicos tem o poder de minar a credibilidade das instituições.

• 5) A concessão de auxí­­­lio-moradia é polêmica e está em discussão no STF. Se o Supremo aceitar julgar válida a concessão do benefício, será uma vitória do patrimonialismo corporativo sobre o texto literal da Constituição.

• 6) Ao aprovar o projeto do auxílio-moradia sem discussão com a sociedade, a Assembleia foi antidemocrática e irresponsável. Aprovou um projeto obscuro, que não apresenta impacto orçamentário, nem especifica em que circunstâncias o benefício será pago, contrário à letra da Constituição, e em disputa judicial sob o qual o STF ainda não se pronunciou.

• 7) É equivocado o argumento de que magistrados devem receber salários semelhantes aos de advogados bem sucedidos e que o auxílio-moradia seria uma forma de compensar salários inferiores aos da advocacia. É também equivocado o argumento de que é preciso valorizar a carreira porque seus membros vão desistir dela.

• 8) Se a intenção é enriquecer, o caminho é a iniciativa privada, assumindo os riscos inerentes à ela. Quem escolhe uma carreira pública deve encará-la como missão de vida.

• 9) O Ministério Público está pronto para criar o seu auxílio-moradia. Em entrevista à Gazeta publicada em 11 de janeiro deste ano, o procurador-geral do MP, Gilberto Giacoia, considera que não existe "uma vedação constitucional tão explícita" para o auxílio-moradia e que o órgão não trabalha com a questão de "se é certo ou errado, mas sim se é justo defender uma categoria funcional", a fim de ter os mesmos benefícios que os magistrados. É uma argumentação em que a defesa corporativa se sobrepõe à prudência.

• 10) As instituições precisam de gente com vocação para o serviço público. Vocação para ser promotor, para ser juiz, para ser deputado. Jamais interesses corporativos deveriam se sobrepor ao que diz à Constituição. Em casos de dúvidas sobre a validade de um ato do poder público é recomendável a prudência - no caso, aguardar o julgamento do STF.

• 11) Evidentemente as carreiras de magistrado e promotor devem ter bons salários. E como contrapartida à remuneração espera-se celeridade na administração da Justiça, eficiência da atuação do Ministério Público, transparência total e facilidade de acesso a dados públicos de posse do Judiciário e do MP, livre acesso a sistemas digitais de estatísticas de produtividade de promotores, procuradores e magistrados.

• 12) Afinal, as instituições existem para servir os cidadãos. Não o oposto.

• 13) Contra o corporativismo, o cidadão pode começar a resolver o problema em outubro – não reelegendo os deputados que aprovaram os benefícios de constitucionalidade duvidosa.

• 14) Diferentemente dos parlamentares, os membros do MP e do Judiciário são escolhidos mediante concurso público e eles próprios presidem essas instituições. Insistir em um caminho de imprudência na defesa corporativa de benefícios pode causar danos duradouros à imagem dessas instituições. Já pensou se a sociedade começar a achar que a melhor forma de evitar o corporativismo é escolher os dirigentes do Judiciário e do MP mediante voto popular?

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