Seria o caos se todas as pessoas, empresas e governos com dívidas simplesmente decretassem que não iriam pagar o que devem. Digamos que seja um casal com dois filhos, e que a mãe teve que parar de trabalhar para cuidar do filho que, digamos, tem um problema de doença. Agora o pai perde o emprego. É muito triste, e ele não tinha ideia disso quando fez o financiamento da sua casa, dois anos atrás.

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A história é triste, mas a família poderia parar de pagar suas dívidas? De jeito nenhum. Poderia, quem sabe, fazer uma negociação com o banco, tentar um fiado no mercado da esquina, reunir a família, para debater e decidir o que fazer.

A história das finanças do Brasil, dos estados e dos municípios é tão ou mais triste que isso, mas também não se pode admitir qualquer ação que lembre um calote. Não é a força do tratoraço do governador Beto Richa na Assembleia Legislativa que vai legitimar práticas como essa.

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Não importa qual a situação atual, o fato é que, em um Estado Democrático de Direito, se a Assembleia Legislativa aprova uma lei concedendo reajuste ao funcionalismo, e essa lei está tecnicamente correta, não há como voltar atrás em um passe de mágica.

Ao enviar à Assembleia o projeto de lei suspendendo o aumento, a gestão de Beto Richa escolheu o caminho do conflito. É de se imaginar que os servidores protestem e entrem em greve para tentar assegurar os termos firmados em 2015.

Para a oposição, há jurisprudência no Supremo Tribunal Federal (STF), garantindo o “direito adquirido”: no Tocantins, uma lei tentando suspender um reajuste foi considerada inconstitucional. O julgamento foi em março de 2016, quando a ministra Cármen Lúcia, hoje presidente da Corte, declarou que houve “nítida ofensa à irredutibilidade de vencimento dos servidores”.

O governador Beto Richa, ao ser questionado sobre possíveis greves, se mostrou estupefato. Disse que o Paraná foi o único estado a dar reajuste aos funcionários e que a possibilidade de greve deve ser “brincadeira”, disse em vídeo veiculado pelo portal CGN.

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Há uma boa intenção por trás, a de gerir bem os recursos para toda a sociedade, e não apenas para o funcionalismo. “Em vez do sindicato cuidar do interesse dos professores, querem me prejudicar para me desgastar politicamente. Eu me dirijo aqui aos paranaenses e digo que o dinheiro é de vocês, que pagam impostos, e eu tenho obrigação de administrar bem”, disse Richa.

Senhor governador, de fato, é obrigação administrar bem o Paraná. Mas tentar suspender uma lei que previa o reajuste não é o caminho indicado, juridicamente falando. Digamos que, com a ajuda dos deputados aliados, seja aprovado o novo projeto. Fora o desgaste político, a possibilidade de greve que prejudica milhões, é quase certo que haverá um passivo milionário para ser pago no futuro.

O dinheiro que não for pago agora, conforme manda a lei, se tornará um precatório, com correção monetária acumulada até um tempo impreciso no futuro, talvez em um momento em que o governante de plantão resolva aumentar impostos dizendo que precisa sanear as contas públicas.

Diz o governo estadual que está seguindo a determinação do Tribunal de Contas, que determinou mudanças na contabilidade das despesas com pessoal. Com o novo entendimento, o Paraná está perto de atingir o limite máximo de gasto com o funcionalismo.

Curioso é que a decisão do TC se tornou pública apenas em 13 de setembro. Já desde o começo de julho o governo estadual dizia que não tinha como pagar o reajuste combinado em 2015.

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“A situação é a seguinte. As duas questões que nós temos com os servidores públicos não cabem no orçamento de 2017. Temos um passivo de progressões, avanços e promoções em várias categorias, que temos de pagar a partir de janeiro. Não tem alternativa. Não tem como pagar isso junto ao aumento salarial”, disse o chefe da Casa Civil, Valdir Rossoni (PSDB) ao blog Caixa Zero, em 1º de julho.