O Paraná está em situação melhor do que os falidos Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul? Sim, mas isso não significa que as finanças estão indo de vento em popa. O governo do Paraná escolhe alguns números para mostrar de acordo com o freguês: se são servidores pedindo aumento, mostra os dados que comprovam a dificuldade financeira (eles são verdadeiros).
Se é para propaganda e para animar deputados estaduais que muitas vezes questionam se vale a pena aprovar pacotes de maldade, o governo mostra dados positivos (eles também são verdadeiros).
As finanças públicas são complexas, e cada rubrica tem sua função de ser (ainda que muitas vezes sejam desrespeitadas). Se Dilma Rousseff sofreu o impeachment pela contabilidade criativa, isso deveria servir de exemplo para todos os governantes, mas não é o que aconteceu.
Mesmo seguindo à risca todas as normas contábeis, é possível para o governo enaltecer números positivos e esconder os negativos. Isso não dá direito de chamar de mentiroso quem publica os números negativos, mas adotar esse caminho é da consciência de cada um.
A Gazeta do Povo noticiou que o governo do Paraná gastou mais do que arrecadou em 2016 e fechou no vermelho em R$ 481 milhões. Esse número é o resultado primário, que leva em conta a receita primária total (R$ 49,82 milhões) e a despesa primária total (R$ 50,3 bilhões).
Em apresentação na Assembleia Legislativa na quarta-feira (22), o secretário da Fazenda, Mauro Ricardo, destacou outro número: um superávit orçamentário de R$ 500 milhões. Todos esses números constam no Relatório Resumido de Execução Orçamentária (RREO). Nenhum é falso, nenhum é mentiroso. Mas o que querem dizer esses dados?
O superávit orçamentário é a soma de todas as despesas e receitas. Mas ele não representa a realidade das contas públicas. Aliás, o governo bem sabe disso: nas reuniões com o funcionalismo público, o secretariado de Beto Richa sempre ressalta que precisa definir as despesas fixas (salários) de acordo com as receitas fixas (arrecadação). Isso deixa de fora as receitas de capital, por exemplo.
Sobram as receitas primárias. Que, junto com as despesas primárias, formam o resultado primário. Que em 2016 foi negativo no Paraná, em R$ 481 milhões.
Ou seja: o superávit orçamentário existe, foi positivo, mas ele pouco importa. Diz um manual de contabilidade pública da Unifesp (há centenas por aí disponíveis): “Os desequilíbrios e equilíbrios que efetivamente interessam são aqueles decorrentes da confrontação das receitas próprias que o governo arrecada, em sua maioria derivada de impostos, taxas, contribuições, aluguéis, alienações patrimoniais, serviços etc., com as despesas que espera realizar”.
Em 2015, quando o resultado primário foi positivo, o número foi destacado pela Agência Estadual de Notícias e pelos bajuladores de plantão. “Outro dado importante apresentado foi o superávit primário de R$ 1,9 bilhão, o que significa que o Paraná inverteu o déficit de R$ 178 milhões registrado em 2014”, diz o texto publicado em 24 de fevereiro de 2016, em referência à apresentação de contas feita por Mauro Ricardo no ano passado na Assembleia Legislativa.
LRF
O superávit orçamentário não é um conceito que importe para a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). O resultado primário sim.
O governo do Paraná sabe disso. A Lei de Diretrizes Orçamentárias traz a meta para o exercício: não importa se será positivo (superávit primário) ou negativo (déficit primário), o importante é cumpri-lo.
Só para lembrar, em 2014, o governo não cumpriu a meta do resultado primário. Em 2015, o governo conseguiu aprovar uma lei na Assembleia para rever a meta estipulada, mesmo com meses de atraso. O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado apontou que isso era uma “manobra escusa e inconstitucional de se dissimular o atendimento à meta mediante a sua alteração a posteriori”. O TC deixou passar, mas há quem considere que era caso semelhante ao de Dilma Rousseff.
Neste ano não há necessidade de manobras. A meta para 2016 foi bem pessimista: déficit primário de R$ 2,5 bilhões.
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