Há 23 anos, a Nova República vivia sua primeira votação de impeachment. No dia 29 de setembro, os então 503 deputados se reuniram para votar a saída do presidente Fernando Collor, acusado de corrupção. Vinte e nove dos 30 deputados paranaenses participaram da sessão, mas apenas três discursaram: Abelardo Lupion, contra o impeachment, Rubens Bueno e Luiz Carlos Hauly, ambos favoráveis.
Ao contrário de hoje, havia quase unanimidade a favor da saída do presidente – tanto que o impeachment foi aprovado por 441 votos a 38. Collor não tinha uma base de apoio sólida e até mesmo deputados do PRN, partido ao qual era filiado, votaram pela admissibilidade do pedido – incluindo os paranaenses Carlos Massa, mais conhecido como Ratinho, Antônio Barbara, Otto Cunha e Werner Wanderer. No Paraná, apenas Basílio Villani, além de Lupion, foi contrário ao impeachment.
Mesmo assim, algumas coisas eram bastante similares. Os poucos defensores do presidente também falavam em golpe, e evocavam o risco à democracia que o impeachment poderia causar. “O golpe de estado político-congressual é tão imoral ou até mais imoral que o golpe militar. Meu voto é ‘não’ ao parecer e à forma engendrada de se conquistar o poder”, declarou Lupion. “Estou convencido de que milhões de brasileiros, longe das manipulações de grande parte da mídia e de partidos políticos interessados, também pensam assim.”
O voto contrário ao impeachment e a defesa pública de Collor não tiveram consequências negativas para Lupion. Ele foi reeleito deputado federal por cinco mandatos consecutivos depois do impeachment, e decidiu não se candidatar em 2014 para coordenar a campanha de Aécio Neves no sul do país. Hoje, é presidente da Cohapar. Ele segue filiado ao DEM, nova roupagem do PFL – partido que, hoje, é um dos defensores mais ferrenhos da saída de Dilma Rousseff.
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A reportagem entrou em contato com Lupion, mas ele preferiu não comentar o assunto.
Favoráveis
Na mesma sessão, as falas de Bueno e Hauly foram bem diferentes. Então filiado ao PSDB, Bueno classificou a situação como uma “orgia de corrupção”. Em seu discurso, outra similaridade da defesa de Dilma com a defesa de Collor transparece: a ideia de que o impeachment não pode se sobrepor à soberania popular.
“O que mais ouvimos, nestes últimos dias, da boca daqueles que ainda defendem essa triste figura instalada no Palácio do Planalto, é que não se depõe um presidente eleito por 35 milhões de votos”, disse Bueno. “O argumento de defesa constitui agravante do crime, porque maior traidor é aquele em quem mais se confiou. Traiu os 35 milhões de brasileiros que o elegeram e tripudiou sobre os 32 milhões que, desde o início, perceberam o farsante que se escondia por trás de um discurso demagógico e vazio.”
Hauly, então filiado ao PST (partido hoje extinto, criado por Alvaro Dias), foi além: disse que Collor precisava ser punido pelo Congresso, pelo Supremo Tribunal Federal e até mesmo pela justiça divina. “É uma ação pedagógica – para a juventude e para o povo brasileiro – o processo de impeachment, com base na recuperação daquilo que foi roubado ao povo brasileiro pelo presidente Collor: o sonho e a esperança”, declarou.
“Muito pior”
Por coincidência, os dois são os únicos deputados daquela legislatura que ainda estão na Câmara – Bueno hoje está filiado ao PPS, e Hauly, ao PSDB. Os dois, hoje, defendem o impeachment, e acham que a situação atual é mais grave que no passado. “Se formos comparar com o PT, o Collor deveria ser julgado no tribunal de pequenas causas”, ironiza Bueno.
Para ele, Collor era um presidente enfraquecido, sem base política, que foi alvo de uma série de denúncias isoladas de corrupção. Ao PT, ele reserva críticas mais pesadas. “Hoje estamos diante de um grupo criminoso sofisticado, que tomou conta de todo o poder político no país”, afirma.
Já Hauly avalia que há mais motivos para o impedimento de Dilma do que para o de Collor. “Na época, o processo todo se resumia ao PC [Farias, operador do esquema de corrupção pelo qual Collor foi denunciado]. Não tinha crise econômica, os escândalos eram menores. Hoje, onde você procura, aparece algum motivo”, diz.
Além deles, outras figuras ainda ativas na política participaram da sessão: Flávio Arns (PSDB), Paulo Bernardo (PT), Luciano Pizzato (PFL, hoje DEM) e Edésio Passos (PT) votaram a favor da saída de Collor.