Responsável pela decisão que suspendeu, de forma provisória, a posse do ex-presidente Lula como ministro da Casa Civil, o juiz da 4ª vara federal Itagiba Catta Preta Neto, 55 anos, diz ter perdido a conta de quantos protestos já esteve em Brasília desde o último ano.
“Se não em todos, os que eu não fui foi por algum impedimento que não lembro. Devo ter ido em alguma manifestação a favor do PT também, mas não sei se quando o PT era governo”, afirma ele, que mantinha fotos no Facebook de sua participação nas manifestações pró-impeachment até a manhã desta quinta-feira (17) - após a decisão que anulou a posse de Lula, a página pessoal do juiz, que continha mensagens “Fora, Dilma” foi excluída.
Juiz que suspendeu posse de Lula participou de protesto contra Dilma
Leia a matéria completaA iniciativa, afirma, foi tomada pelo filho, de 19 anos, após outras pessoas da família ficarem incomodadas com a divulgação das imagens. Ele nega que o tenha orientado a esconder as postagens. “Estive nos protestos e compartilho da indignação das pessoas que estiveram naqueles protestos. Não tenho nada a esconder”, diz ele, que aparece em uma das fotos com o adesivo de campanha do Aécio Neves (PSDB) na camisa.
“Votei nele nas últimas eleições”, relata o juiz, que afirma já ter votado também em Marina, Dilma e Lula em outras ocasiões, e tem dois filhos filiados ao PSDB. “Não tenho ligação com o partido nem pretendo ter.”
Questionado se sua postura favorável aos protestos pró-impeachment não poderia impedi-lo de julgar a nomeação de Lula, o magistrado diz não ver problemas em ter analisado o processo.
“Meu posicionamento cidadão não me impede de julgar com total imparcialidade o que acontece”, afirma ele, que recebeu a imprensa em seu gabinete horas depois de participar de outro protesto -desta vez, com cerca de 30 juízes federais, em apoio ao juiz Sergio Moro, que conduz a operação Lava Jato.
‘BOLA DA VEZ’
Com atuação em direito há 34 anos, Catta Preta diz já ter julgado outros casos de repercussão. Um dos mais conhecidos, conta, foi um crime de genocídio de índios ianomâmis em Roraima, em 1996.
Pouco mais de vinte anos depois, acabou enredado em sua mesa em processos sobre a crise política. “Pensei: é comigo. Sou a bola da vez”, disse, ao ver a ação que pedia a suspensão da nomeação de Lula para a Casa Civil.
A análise ocorreu um dia após a Polícia Federal retirar o sigilo de interceptações telefônicas do ex-presidente, que tomou posse pouco tempo antes de ter o cargo suspenso pelo juiz.
“As gravações não só eu, mas o Brasil inteiro escutou ontem [quarta]. Todos nós ouvimos e ninguém é cego ou surdo para achar que aquilo não vai influenciar em nada o que a gente faz”, afirma.
“Dizer que não em influenciou seria uma tolice. Mas o que me levou a decidir é o que está demonstrado na petição inicial do processo.”
Segundo ele, a gravação que mais o incomodou foram as referências ao STF (Supremo Tribunal Federal) e à ministra Rosa Weber.
“Fiquei tão estarrecido, preocupado e indignado como qualquer outra pessoa”, disse. “Primeiro por ser uma conversa da presidente com um ex-presidente. Segundo que as palavras que Lula usa são não convencionais para um ex-presidente da República”, relata.
‘MORALIDADE’
Segundo o juiz, a decisão ocorreu por questões de “moralidade pública” e pelo risco de uma possível interferência de Lula na análise dos casos operação Lava Jato.
Ele cita o fato de que, ao assumir o cargo, o ex-presidente passa a ter foro privilegiado, o que deslocaria as análises sobre o caso da primeira instância, em Curitiba, para o STF.
“Isso já é evidência da tentativa de haver uma intromissão do Poder Executivo no Poder Judiciário”, afirma ele.
Apesar da avaliação desfavorável ao atual governo, o juiz evita se posicionar sobre a possibilidade de impeachment.
“Se o Congresso achar que houver ofensa aos dispositivos legais, sou a favor do impeachment. Se não, sou contra.”