Em nova frente de investigação sobre os tentáculos da máfia dos sanguessugas, a Controladoria Geral da União (CGU) faz uma devassa nos contratos de compra de mais de cinco mil ônibus, microônibus e outros carros de transporte escolar financiadas com recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) de 2001 a 2003. Só nesse período o fundo liberou R$ 223 milhões para prefeituras comprarem carros escolares. O valor corresponde ao dobro do que a máfia dos sanguessugas movimentou na venda de ambulâncias superfaturadas, conforme cálculos da Receita Federal.
A CGU decidiu investigar a suposta incursão dos sanguessugas sobre as verbas do FNDE, fundo de financiamento das principais atividades do Ministério da Educação, depois de descobrir que empresas ligadas à máfia participaram de licitações para a compra de ônibus escolares. Os índices de fraudes são considerados surpreendentes. Numa primeira amostra, os técnicos detectaram provas de irregularidades em todos os dez convênios auditados.
Nesta etapa inicial, a CGU analisou contratos do FNDE com nove prefeituras no Mato Grosso, base de atuação dos sanguessugas, e uma no Pará, firmados ao longo de 2001.
Os técnicos apontam falhas grosseiras em licitações promovidas pelas prefeituras de Pontes e Lacerda, Cláudia, São José do Rio Claro, Alta Floresta, Vila Rica, Nova Brazilândia, Santa Cruz do Xingu, Planalto da Serra, Salto do Céu, São Félix do Araguaia e Placas, esta última no Pará. Relatório reservado da controladoria informa que as licitações foram vencidas em todos esses municípios pela Santa Maria, Torino Veículos, Comercial Rodrigues ou pela Planam, todas empresas ligadas a Darci José Vedoin, apontado pela polícia como o chefe dos sanguessugas.
Entre as principais irregularidades encontradas constam superfaturamento de preços, entrega de carros com potência de motor e marcas diferentes das especificadas em edital e até a apresentação de ônibus usados em licitações para compra de carros novos. Um dos ônibus foi entregue até com multa vencida. Os sanguessugas atuavam com desenvoltura. Num dos casos, um deputado, autor da emenda destinada a financiar a compra promovida pela prefeitura de Placas, ainda usou o ônibus para fazer autopromoção. O nome do parlamentar consta nas duas laterais do ônibus. A lei proíbe esse tipo de propaganda.
- Eles faziam a festa em 2001, quando ainda não existia a Controladoria-Geral. Agora essa festa acabou e vamos descobrindo todos os podres que eles deixaram para trás - afirmou o ministro Jorge Hage, chefe da Controladoria.
Diante das constatações, Hage resolveu fazer uma auditoria em todos os contratos de compra de ônibus financiados pelo Ministério da Educação entre 2001 e 2003. Segundo o ministro, a investigação está restrita a esse período porque em 2004 o governo modificou o Programa Nacional de Transporte Escolar e suspendeu os financiamentos de compras de veículos escolares. Na primeira parte desta nova fase, os fiscais vão concentrar a análise em 87 convênios firmados com 57 prefeituras do Mato Grosso e 30 do Rio Grande do Sul em 2001.
Os convênios, da ordem de R$ 2,8 milhões, foram firmados a partir de emendas apresentadas pelas bancadas parlamentares dos dois estados. Pela apuração da CGU, as suspeitas de fraudes nos contratos para a compra de ônibus escolares seguem o mesmo padrão de irregularidades detectadas nos convênios para financiamento de ambulâncias. O deputado Raul Jungann, vice-presidente da CPI dos Sanguessugas, disse que a comissão deverá ampliar o foco e também entrar nessas investigações.