Com a citação de 48 políticos em sua delação premiada, muitos do altíssimo escalão da República, o ex-vice-presidente de Relações Institucionais da Odebrecht Claudio Melo Filho abalou Brasília neste fim de semana. Mas, ele é apenas um dos 77 executivos da empresa que firmaram acordo de colaboração com a força-tarefa da Lava Jato – o que abre a perspectiva de um potencial ainda mais explosivo da chamada “delação do fim do mundo”.
Veja o possível alcance da “megadelação” da Odebrecht
Assista a um debate sobre o acordo que pode desestabilizar a República
O horizonte de “terra arrasada” na política nacional se desenha por vários fatores. Os outros 76 executivos da empresa teriam muito mais a falar – o que inclui o fundador da empreiteira, Emílio Odebrecht, e o ex-presidente da construtora Marcelo Odebrecht, preso em Curitiba e condenado a 19 anos de prisão pelo juiz Sergio Moro.
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Além disso, as acusações de Melo Filho se concentraram no financiamento de campanhas, legal e ilegal, para facilitar os negócios da empresa. E ele citou “apenas” 48 nomes. O presidente da Odebrecht Infraestrutura, Benedicto Barbosa Silva Junior, outro delator, tinha em mãos uma planilha que mostra doações da empresa a cerca de 200 políticos de 24 partidos – incluindo congressistas, ministros, governadores, prefeitos, entre outros. Segundo um dos procuradores da força-tarefa em Curitiba, a rede de corrupção entregue nas delações vai chegar inclusive aos governos estaduais e municipais, gerando diversos “filhotes” da Lava Jato pelo país.
O chamado de “listão” da Odebrecht foi apreendido em março deste ano. Silva Junior deve ajudar a esclarecer quais políticos da lista receberam dinheiro irregular de campanha. Na campanha eleitoral de 2014, a empreiteira doou R$ 46 milhões para 15 partidos políticos, e as delações podem expor doações legais disfarçadas para pagamentos de propina.
Desvios de dinheiro
Além disso, outra vertente das delações vai envolver o desvio de dinheiro público em obras federais, estaduais e eventualmente até municipais. Por enquanto, o foco da Operação Lava Jato foi a atuação da Odebrecht em contratos irregulares envolvendo a Petrobras. Mas, além do setor de petróleo, a empresa tem atuação em várias outras áreas que já são alvo de suspeitas mas que ainda não tiveram investigações aprofundadas pela Lava Jato: aeroportos, portos, rodovias, ferrovias, setor elétrico, transporte coletivo (metrô), estaleiro, defesa nacional, estádios, entre outros – veja infográfico.
As delações também devem atingir em cheio o BNDES e o FI-FGTS, duas fontes de financiamento federal das obras da empreiteira. E, de quebra, implicar uma série de governos de outros países no esquema de corrupção, pois a empresa tem obras em 17 nações estrangeiras – várias delas financiadas pelo BNDES.
Quem mais vai falar
O responsável pela Odebrecht Energia, Henrique Valladares, também deve ser ouvido pelos investigadores da Lava Jato. Segundo Claudio Melo Filho, Valladares tinha um relacionamento próximo ao ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e pode esclarecer pagamentos feitos ao ex-presidente da Câmara.
Claudio Melo Filho citou no acordo de colaboração premiada o nome de outros executivos da Odebrecht, que segundo ele, mantinham uma agenda própria no Congresso. São pelo menos 11 executivos de nove braços da empreiteira. Segundo Melo Filho, todas as empresas possuem uma “equipe técnica dedicada a relações governamentais para assuntos em Brasília e nos estados”.
Entre as empresas citadas pelo executivo estão a Odebrecht Agroindustrial (que produz açúcar e etanol); Enseada do Paraguaçú (estaleiro); Odebrecht Ambiental (saneamento); Odebrecht S.A. (a holding que administra o grupo de empresas); Braskem (petroquímica); Odebrecht Internacional (negócios externos); Odebrecht Properties (administração imobiliária, incluindo o estádio do Maracanã); Odebrecht Defesa e Tecnologia (desenvolvimento de submarinos e armas de defesa); e Infraestrutura Brasil (obras de infraestrutura).
Na Odebrecht S.A., segundo Melo Filho, Rubio Fernal e Souza “desenvolvia a função de relações institucionais junto ao Senado, Casa Civil e Itamaraty”. O executivo afirma ainda que Souza, atualmente, “desenvolve esta função na Odebrecht Infraestrutura Brasil” e tem atuação no projeto do submarino brasileiro.
Setor de propina
O acordo de colaboração premiada dos executivos da Odebrecht começou a ser costurado em março deste ano, após a deflagração da Operação Xepa. Essa fase da Lava Jato descobriu o Setor de Operações Estruturadas da empresa – que, segundo a força-tarefa da investigação, funcionava como um departamento de propinas. Desde então, o clima em Brasília esquentou com a possibilidade dos executivos revelarem a participação do alto escalão de diversos partidos políticos no esquema.
Marcelo Odebrecht, que deu o primeiro depoimento no âmbito de seu acordo de colaboração nesta segunda-feira, sofre pressão para fechar um acordo desde que foi preso, em junho de 2015, mas relutou em fechar a delação. Em depoimento à CPI da Petrobras, no ano passado, Odebrecht disse que não tinha “nada a dedurar” e fez questão de frisar que um acordo não estava em seus planos. “O meu legado tem valores morais dos quais eu nunca abrirei mão”, disse o executivo aos deputados. Ele usou os filhos como exemplo. “Eu talvez brigasse mais com quem dedurou do que com aquele que fez o fato”, afirmou.