As últimas semanas marcaram um tempo sem precedentes na história da quase centenária Gazeta do Povo. Colunas de jornalistas de prestígio ficaram em branco. Discretos informativos comunicavam aos leitores um amargo silêncio imposto pela censura e pelo sigilo judicial. Jornalistas foram ameaçados com pedidos milionários.

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Tudo isso levou o Jornal a bater às portas do Supremo Tribunal Federal para buscar aquilo que, numa democracia, deveria ser o óbvio: a garantia do exercício da liberdade de imprensa.

Até então, em respeito à decisão judicial de sigilo, a violência sofrida por intermédio de ações judiciais movidas pelo Presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, Des. Clayton Camargo, não foi informada aos leitores.

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Enquanto o Jornal vitimado pela censura cumpria rigorosamente o segredo de justiça, o advogado que pediu a providência, em nome do Des. Clayton Camargo, concedeu ampla entrevista ao site do UOL, abordando em pormenor o conteúdo discutido no processo secreto.

A decisão de censura, proferida pelo Juiz Benjamin Acácio de Moura e Costa, na Corte presidida pelo Des. Clayton Camargo, em favor do Des. Clayton Camargo, foi publicada no Diário de Justiça. No corpo da decisão encontra-se a menção expressa ao nome da Gazeta do Povo, sem qualquer sigilo.

Na noite de quarta-feira, evidentemente buscando evitar o julgamento do pedido liminar formulado ao Supremo Tribunal Federal, o Des. Clayton Camargo manifestou "desistir" da ação contra a Gazeta do Povo e, a despeito do sigilo, fez publicar no site do Tribunal, por ele dirigido, um comunicado que trata da ação inibitória na qual, outrora, o mesmo Des. havia requerido o segredo de justiça.

O tema tomou proporções enormes. Os principais jornais de todo o Brasil denunciaram a agressão sofrida pela Gazeta do Povo. O Corregedor do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Ministro Francisco Falcão, lamentou publicamente o ato de censura. A Ordem dos Advogados do Brasil – Paraná, a Associação Comercial do Paraná, o Movimento Pró-Paraná, o Instituto dos Advogados do Paraná e a Federação das Indústrias do Paraná divulgaram manifestação em defesa da liberdade de imprensa. O Supremo Tribunal Federal divulgou notícia a respeito dos fatos em sua página na internet.

Nada mais justifica o silêncio.

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A decisão de censura foi derrubada em virtude da desistência, pelo Des. Clayton Camargo, do recurso judicial que lhe concedeu a extraordinária imunidade contra a atividade jornalística desenvolvida pela Gazeta do Povo.

Inexistiu qualquer acordo com a Gazeta do Povo. Muito pelo contrário. O Jornal pretende buscar do Poder Judiciário um julgamento de mérito sobre o pedido de censura. A desistência do Des. Clayton Camargo não pode significar um ponto final. Não é possível que essa espécie de ameaça continue a pairar impunemente contra a imprensa. Espera-se um posicionamento firme e definitivo da Justiça.

Nada disso significa uma defesa da liberdade de imprensa como valor absoluto ou mesmo superior aos outros direitos e garantias fundamentais. Nesse embate, não se pode fugir do caso concreto e, aqui e agora, resta evidente que o Jornal se limitou a divulgar a existência de inúmeras e diferentes investigações que pesam, e dia a dia aumentam, no Conselho Nacional de Justiça, contra a autoridade maior do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná.

Seria correto furtar essas informações do leitor? A resposta somente pode ser negativa e isso não significa uma apologia de uma ilimitada liberdade de imprensa. Fatos públicos, verdadeiros, de interesse jornalístico a respeito de autoridades públicas não devem ser interditados. O fato dessa violência contra a Constituição da República ser movida pelo Presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná sublinha a história com contornos particulares.

Para além do direito de informar, exercido com diligência pelo Jornal, não se pode esquecer do direito à informação, ou seja, do direito de acesso à informação que é de titularidade de toda a população. Isso se torna ainda mais evidente quando a informação aborda a vida pública do dirigente de um dos Poderes do Estado.

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A lição que se colhe de um precedente do Supremo Tribunal Federal é edificante e merece citação: "(...) não se pode privar o público em geral, e os lidadores jurídicos em particular, da possibilidade de saber quando trabalham, quanto trabalham e como trabalham os membros do Poder Judiciário. Afinal, todo servidor público é servidor do público e os ministros do Supremo Tribunal Federal não fogem a essa configuração republicana verdadeiramente primaz." (STF – ADPF 130 – Rel. Min. Carlos Ayres Britto – J. 06.04.2009).

Noutro trecho dessa mesma decisão, pode-se ler: "todo agente público está sob permanente vigília da cidadania (é direito do cidadão saber das coisas do poder, ponto por ponto), exposto que fica, além do mais, aos saneadores efeitos da parábola da ‘mulher de César’: não basta ser honesta; tem que parecer. E quando o agente estatal não prima por todas as aparências de legalidade e legitimidade no seu atuar oficial, atrai contra si mais fortes suspeitas de um comportamento antijurídico francamente sindicável pelos cidadãos." (STF – ADPF 130 – Rel. Min. Carlos Ayres Britto – J. 30.04.2009)

A reclamação movida pela Gazeta do Povo no Supremo Tribunal Federal pretende que a sabedoria colhida nesses excertos, provenientes de uma histórica decisão da Corte Suprema, sejam também aplicados, no Estado do Paraná, nas ações movidas pelo Des. Clayton Camargo, atual Presidente do Tribunal de Justiça.

Pede-se e espera-se Justiça.

Diligite Justitiam Vos Qui Iudicatis Terram (Amai a justiça vós que julgais a Terra). Eis a inscrição luminosa encontrada por Dante, já ao final de sua épica trajetória, diante do céu de Júpiter, que é o céu dos Justos.

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Eis a esperança e a advertência que se sobrepõem à intimidação.