Em um momento de crise política, a presidente Dilma Rousseff (PT) desgastou sua autoridade ao se encontrar de forma secreta com o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, no dia 7 de julho, no Porto (Portugal). A avaliação é do cientista político Roberto Romano, professor da Unicamp.
Como o senhor vê o encontro, do ponto de vista da ética?
Penso inicialmente que esse episódio pertence mais aos temas clássicos da Razão de Estado, doutrina que apareceu no século 17 para permitir ao chefe de Poder governar sem muitos empecilhos. Quando há lei que atrapalha, invoca-se a Razão de Estado, com ênfase na prática do segredo. Como o governante não pode obedecer a lei que vale para todos, vale-se do segredo. Ele parece obedecer à lei, mas na verdade age de maneira dissimulada. Gabriel Naudé, em seu livro Considerações Políticas sobre os Golpes de Estado, de 1640, aponta os golpes bem-sucedidos, em que o segredo é mantido, e os mal-sucedidos, em que são revelados.
Esse encontro seria classificado entre os mal-sucedidos...
Sim. É preciso lembrar também da análise de Hannah Arendt [filósofa alemã], de que o ruim do segredo e o bom de lutar contra ele é que não dura muito, pois qualquer regime tem dissensões internas que denunciam o segredo, que tem essa fragilidade. Voltando à questão ética do encontro... Aí o problema não está tanto no sigilo, mas em procedimento anterior: a tentativa de burla ao cumprimento da lei. A suspeita que todos temos é que a presidente, para salvar seu mandato, estaria apelando a alguém que deveria manter a integridade da lei funcionando. Do ponto de vista da ética, um chefe de Poder fala com outro no palácio, com testemunhas, não em reuniões secretas.
E do ponto de vista legal?
Está na Constituição Federal que o exercício do Poder tem que ser impessoal. Quando o presidente da República encontra o presidente do STF, não são as pessoas Dilma Rousseff e Ricardo Lewandowski que se reúnem. Deve-se seguir um ritual que o Poder exige. A publicidade é o primeiro ponto numa república democrática. Se o segredo passa a ser conhecido, você perde autoridade. Com um presidente da República isso é gravíssimo. Com um presidente do STF, é catastrófico.
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