O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse na noite desta segunda-feira (26) que, embora “politicamente” também seja responsável pelos escândalos de corrupção que dragaram o governo, a presidente Dilma Rousseff é “pessoalmente honrada”. O tucano não se permitiu, no entanto, usar os mesmos adjetivos para definir o também ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “Tem que esperar para ver”, ressalvou, ao falar sobre o petista. FHC falou sobre os dois personagens durante entrevista ao programa Roda Viva, para divulgar o primeiro volume de seu novo livro, “Diários da Presidência”.
Tucano diz que não há tentativa de golpe
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso avalia que o seu partido, o PSDB, tem sido “bastante prudente” na oposição ao governo Dilma Rousseff e refuta que a legenda tente “qualquer alternativa” para tirar a petista do poder. “Se houver impeachment no Congresso, se houver razões, vai votar”, disse no programa Roda Viva da TV Cultura, sobre o comportamento que o PSDB adotaria em eventual processo de afastamento contra a presidente da República.
Sobre a ação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para cassar a chapa de Dilma e do vice Michel Temer (PMDB), FHC rechaçou a classificação petista de que seria uma tentativa de golpe. “O PSDB se sentiu lesado e foi à Justiça por abuso de poder econômico na campanha. A lei é a lei, não é que o PSDB queira isso.”
Para o tucano, o Brasil hoje não corre qualquer risco de golpe pois as ações da oposição e do governo seguem a Constituição como “roteiro”.
O ex-presidente repete sua tese de que já “passou da hora” de haver um “congresso de cardeais” que reúna os nomes mais fortes de diferentes setores e partidos para tirar o País da crise política e econômica em que se encontra.
Grandeza
Fernando Henrique voltou a sugerir também que Dilma Rousseff poderia recorrer a uma “renúncia com grandeza”, em que colocasse na mesa a renúncia com um prazo de um ano, por exemplo, na condição de, em troca, ter do Congresso o compromisso de aprovar reformas essenciais ao país.
Para o ex-presidente, falta rumo ao governo Dilma e capacidade de diálogo. “Eu governei porque tinha um objetivo, um programa, apoiado pelo PSDB e também pelos partidos coligados. Acima de tudo, governei porque falei o tempo todo à Nação”, afirmou. FHC repetiu ainda que o governo petista não está mais num presidencialismo de coalizão para ficar refém de um presidencialismo de “cooptação”. “Hoje a política dança o ritmo da crise econômica e da Lava Jato, não estão conduzindo, estão sendo conduzidos”, afirmou.
O tucano disse que atualmente não tem uma posição institucional, um cargo, para tomar uma iniciativa mais clara pelo País, mas defendeu o papel desempenhado pelo PSDB.
Questionado sobre a declaração que deu sobre a honradez pessoal de Dilma, FHC justificou ter falado sobre o assunto a uma revista alemã. “Imagina que um ex-presidente vai dizer a uma revista estrangeira que o presidente do seu país não é honrado? Não vai. Não deve. Mas, além disso, eu acho. Não vejo que a Dilma tenha pessoalmente envolvimento”, falou. “Quanto ao Lula, eu tenho que esperar para ver. Tem que esperar porque tem saído muita coisa que tem que ser passada a limpo. E o Lula deve ser o primeiro a querer ver ser passado a limpo. São muitas acusações, uma coisa aqui, uma coisa ali”, concluiu.
A fala de FHC coincide com o momento em que os escândalos chegam mais perto do ex-presidente petista. Nesta segunda (26), agentes da Polícia Federal cumpriram uma ordem de busca e apreensão no escritório de um dos filhos de Lula, em São Paulo, para apurar possível envolvimento dele num esquema de fraude tributária, objeto da Operação Zelotes.
O tucano ainda falou sobre as investigações a respeito das relações entre Lula e empreiteiras que firmaram negócios no exterior, com o auxílio de financiamento do BNDES. “Uma coisa é você ter um convite de um empresário e fazer uma palestra. Mas aí você faz a palestra, as pessoas vão [assistir]. Agora, você abrir portas...”, alfinetou. “Se [Lula] fez uma palestra e ganhou, tenho inveja porque ganhou dez vezes mais do que eu”, concluiu.
Para o tucano, o PT se perdeu ao chegar no poder. “O PT, de alguma maneira, foi engolfado pelos setores mais atrasados da sociedade”, disse. Ele disse ainda que Lula é responsável por parte desse processo. “Ele permitiu que se chegasse a esse desvario.”
Lava Jato
FHC voltou a dizer que o país está sem rumo. Ele avaliou que, hoje, a política “dança ao ritmo da crise econômica e da operação Lava Jato”. Ao falar sobre os personagens que permeiam a investigação do esquema de corrupção na Petrobras disse que a prisão do empreiteiro Marcelo Odebrecht “se justifica pelos dados que foram apresentados pela Justiça, mas tem limite”. “Acho que o Estado de Direito é uma coisa importante. Não pode transformar prisão preventiva em instrumento de prisão permanente. Quem tem que julgar isso não sou eu, é o Supremo”, afirmou.
O tucano disse que “apesar de tudo”, o país deu “grandes passos” e afirmou que prova disso é o funcionamento de instituições, como o Ministério Público e a Justiça.
Fominha
Ao relembrar os fatos de seu governo que serão abordados no livro que está lançando, o tucano admitiu não descartar que tenha havido compra de votos para a aprovação da emenda que instituiu a reeleição no Brasil, mas ressaltou que “se houve”, não foi patrocinada por ele. “Se houve compra, não foi minha, não foi do PSDB”, disse FHC, que lembrou, em seguida, que prefeitos e governadores também foram beneficiados com a medida.