Dilma e a onça-mascote: Planalto avalia que Lula a prejudicou.| Foto: Antonio Lacerda/EFE

A presidente Dilma Rousseff (PT) afirmou nesta terça-feira (23) que o ex-presidente Lula tem o direito de fazer críticas. Nos últimos dias, Lula tem criticado tanto a gestão de Dilma no governo federal quanto seu partido, o PT. Apesar da declaração pública de Dilma, nos bastidores o Planalto admite que as manifestações de Lula vem causando mal-estar. “Todos têm direito de fazer críticas. Principalmente o presidente Lula, que é muito criticado por vocês [jornalistas]”, disse a presidente em rápida entrevista no Rio de Janeiro, onde ela participou do lançamento do mascote da equipe brasileira para a Olimpíada de 2016.

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Ex-presidente tenta se afastar da rejeição ao PT e ao governo, diz especialista

  • São Paulo

Entre o discurso de Lula na abertura do 5º Congresso do PT, exaltando as conquistas da legenda, e as duras críticas feitas nesta segunda-feira (22) há uma pesquisa de opinião. O cientista político e especialista em PT, Rudá Ricci, vê o levantamento, que mostra o ex-presidente atrás de Aécio Neves (PSDB) em uma eventual disputa pelo Planalto, como o principal motivo para a radicalização do discurso de Lula. “Lula já estava sofrendo desgaste em função do PT e do governo, mas lento. A pesquisa mostrou que agora está corrosivo”, avalia Rudá Ricci, que foi integrante do PT até 1993.

Na visão de Ricci, o PT vive uma encruzilhada por contrariar sua história. Lula, percebendo a situação e prevendo dificuldades para a recuperação política e econômica, estaria tentando se descolar do governo e do partido.

Em evento promovido pelo Instituto Lula na segunda-feira (22), Lula criticou duramente o PT e sua burocracia, acusou correligionários de pensarem apenas em cargos e resistirem à mudança interna. “A questão é que foi ele quem colocou o PT nesta estrada”, diz o especialista.

“O Lula tenta criar uma manobra discursiva para, possivelmente, resvalando no populismo, caminhar para dizer ao eleitor que ele não é a Dilma”, analisa Rudá. A manobra, na avaliação do cientista, é arriscada. “Só uma ruptura pública com Dilma causaria um frisson nacional. Só assim Lula seria capaz de articular setores que hoje têm dificuldade de ficar ao lado do PT”, diz.

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Na segunda-feira (22), Lula havia defendido uma “revolução” no PT e afirmado que a sigla tem os vícios de todo partido que cresce e chega ao poder. “Não sei se o defeito é nosso, se é do governo. O PT perdeu a utopia”, afirmou. O ex-presidente afirmou ainda que colegas de partido “só pensam em cargo, em emprego, em ser eleito”. “Nós temos que definir se queremos salvar nossa pele, nossos cargos, ou nosso projeto”, discursou Lula.

Na quinta-feira (18), Lula havia dito que a gestão de Dilma está como “um governo de mudos”. Reunido com líderes religiosos, o ex-presidente disse ainda que Dilma “está no volume morto” e falou de promessas descumpridas pela sucessora, como a de “não mexer no direito dos trabalhadores”. E listou notícias negativas, como a alta da inflação e aumentos de tarifas.

Abandonado

Embora Dilma tenha dito que Lula tem o direito de fazer críticas, o movimento do ex-presidente contrariou o governo. Nos bastidores, ministros do PT observaram que Lula toma a dianteira para se afastar dos escândalos de corrupção que abalam o partido e aponta falhas do governo por não ser ouvido e se sentir abandonado por Dilma. Avaliaram, porém, que essa atitude escancara a divisão entre “criador” e “criatura” e prejudica a presidente.

O líder do governo na Câmara Federal, José Guimarães (CE), disse que as críticas de Lula são pertinentes enquanto observações internas e “não públicas”. “Vamos esperar as eleições. Já vi tantas projeções feitas e não realizadas. Vamos aguardar 2016.”

Para o senador Lindbergh Farias (RJ), “o PT não pode só dizer amém ao governo Dilma”. “É preciso mais independência e Lula está certo ao dar essa chacoalhada. Ele está preocupado com a política e o andar das coisas. Tudo o que está dizendo precisa ser visto à luz desse momento de tensão”, completou o senador Jorge Viana (AC).

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O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, disse que Lula tomou uma “posição de vanguarda” que deve levar os petistas à reflexão “daquilo que é necessário” corrigir. “O presidente Lula é um dos grandes líderes da história do Brasil, é um líder com peso nacional e internacional. É absolutamente legítimo que ele professe aquilo que ele ache correto”, disse Cardozo a jornalistas, ao participar da divulgação do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen), em Brasília.

“Eu, pessoalmente, participo de uma corrente do PT que há alguns anos acha que algumas questões teriam de se reformuladas. Acho que o nosso líder maior, ao fazer essa reflexão, induz todos os petistas e simpatizantes a refletirem sobre isso”, comentou Cardozo, que integra a corrente Mensagem ao Partido, mais à esquerda da corrente majoritária Construindo um Novo Brasil (CNB), à qual pertence o ex-presidente.