No início da madrugada desta terça-feira, em entrevista ao "Jornal da Globo", da Rede Globo, a candidata do PSB à Presidência, Marina Silva, disse que a retirada do trecho sobre união de pessoas de mesmo sexo de seu programa de governo "foi uma correção". No entanto, ela disse que não interferiu no processo.
"A equipe foi quem fez a correção, nem interferi nesse processo. Assim como na parte sobre energia nuclear. Foi um documento tal qual eles (o movimento LGBT) enviaram. Obviamente, nenhum setor colocou 100% das suas contribuições (no programa de governo). Eu mesma, como ambientalista, não tinha essa pretensão (para as propostas de meio ambiente). O que aconteceu foi uma correção. Mas os direitos civis da comunidade LGBT, o respeito à liberdade individual, o combate ao preconceito, estão muito bem escritos, melhor do que (no programa) de outros candidatos."
Perguntada, porém, especificamente sobre casamento entre pessoas do mesmo sexo, Marina disse defender o que está na Constituição para o termo "casamento", ou seja, que é apenas para pessoas de sexo diferente.
"A Constituição tem uma diferença em relação ao casamento. O casamento é utilizado para pessoas de sexo diferente. Para pessoas do mesmo sexo, o que a lei assegura, o que o Supremo já deu ganho de causa com os mesmos direitos equivalentes ao do casamento, é a união civil."
Questionada se a manchete de jornal "Marina é contra casamento de pessoas de mesmo sexo" estaria correta, ela respondeu que estaria correta a manchete: "Marina é a favor da união civil de pessoas de mesmo sexo".
"Em termos da palavra 'casamento', você está errado, porque defendemos é a união civil entre pessoas do mesmo sexo", disse Marina, que, questionada se "casamento" seria uma palavra que não sairia de sua boca, respondeu que "é a forma que colocamos o problema".
Democracia representativa
Ainda na primeira parte da entrevista, mas tratando sobre política, Marina Silva foi questionada sobre o fato de, apesar das críticas que ela faz à democracia representativa, ela própria, com sua candidatura, ser um exemplo de representação democrática.
"Tenho falado na verdade da crise da política. Não teci nenhum comentário (sobre democracia representativa)", disse, ouvindo, então, que esse ponto estaria no seu programa de governo. "Não acho que as pessoas devem fazer vista grossa para o que está acontecendo não só no Brasil. A gente precisa aprofundar nossa democracia".
Segundo Marina, esse aprofundamento se daria com uma combinação da democracia representativa com a democracia direta.
"É ampliar a participação das pessoas e melhorar a qualidade das instituições de representação. Se partimos do princípio de que a representação está muito boa, obrigada, de que não temos problema em relação às instituições políticas, vamos ficar na situação de crise dramática que estamos hoje no Brasil de que as conquistas estão sendo ameaçadas por um atraso na política", disse Marina, falando em "descolamento" das pessoas em relação aos políticos atualmente, por conta dessa crise. "O que busco é democratizar nossa democracia".
Marina foi, então, perguntada se ela apoia o projeto de conselhos populares que encontra resistências no Congresso e que é chamado por críticos de "bolivarianismo".
"O que significa ampliar a participação das pessoas? Isso não tem a ver com bolivarianismo, tem a ver com a qualidade das instituições. Os partidos têm que se renovar", respondeu. "A Constituição assegura as duas coisas (representação e participação direta). Não podemos achar que uma coisa é em prejuízo da outra. Pelo contrário."
Lembrando que dialogou com parlamentares quando foi senadora e também como ministra do Meio Ambiente, a candidata disse, ainda, que o governo não deve ser "para a sociedade", mas "com a sociedade"
Marina também foi perguntada se a religião é o que a impediria de ser a favor da lei que equipara homofobia ao racismo.
"Não. É que a lei que está em tramitação ainda não faz a diferenciação adequada em vários aspectos. Por exemplo, ninguém pode defender homofobia, qualquer forma de preconceito, discriminação. Por outro lado, você tem os aspectos ligados à convicção ou à manifestação de uma opinião. Você tem que separar isso, e na lei isso não está adequadamente claro. Por isso que nós não colocamos tal qual o movimento havia encaminhado. Mas há que se ter os regramentos legais para que não se permita nenhuma forma de discriminação, preconceito, e que se possa tratar todas as pessoas com direitos iguais, porque vivemos num Estado laico, que não pode permitir discriminação contra quem quer que seja."
Em relação à influência que a religião teria na tomada de decisões da candidata caso ela seja eleita - e citando reportagem da "Folha de S. Paulo" que afirma que Marina costuma consultar a Bíblia para tomar decisões importantes -, a ex-senadora afirmou que os seres humanos têm "Subjetividade" e "referências":
"Todos nós agimos com base na relação realista dos fatos. Mas os seres humanos têm uma subjetividade. Uma pessoa que crê obviamente tem na Bíbilia uma referência, assim como tem referências na arte, na literatura. Às vezes você pode ter um insight assistindo a um filme. O quanto já avançamos na ciência e na tecnologia pela capacidade emancipatória da indústria cinematográfica", disse Marina.
A candidata destacou, ainda, que dizer que ela toma decisões lendo a Bíblia "aleatoriamente" é "uma forma que as pessoas estão construindo para tentar passar a imagem de que sou uma pessoa fundamentalista, essas coisas que muita gente de má-fé acaba fazendo".
- "(O amparo que tem na Bíblia) É o mesmo amparo que você pode tomar a partir de outros referenciais. A Bíbilia é sem sombra de dúvida uma fonte de inspiração para qualquer pessoa que é cristã, ou um judeu. Mas existem outras fontes de inspiração. As decisões são com base racional para todas as pessoas, mas dificilmente você vai encontrar uma pessoa que é 100% racional, ela estaria presa à realidade, e se os especialistas do comportamento forem avaliar essa pessoa vão ver que ela tem uma subjetividade muito pobre. Qualquer pessoa toma suas decisões considerando vários aspectos. É atravessado pela cultura; se tem uma crença, pela espiritualidade; se é da ciência, pela ciência. O ser humano não é uma unidade, digamos, pura de alguma coisa. Somos seres subjetivos."
Economia
Já na segunda parte da entrevista ao "Jornal da Globo", Marina Silva respondeu sobre economia. E bateu na tecla da busca por fontes de energia limpa, como energia solar e eólica. Além disso, prometeu recuperar "o tripé da política macroeconômica" (meta de inflação, câmbio flutuante e superávit).
"Essa conquista da sociedade está sendo completamente desconstituída. A presidente Dilma ganhou o governo dizendo que ia fazer a baixa de juros, que ia reduzir a inflação e que ia fazer o país crescer. Nosso país não está crescendo, a inflação está aumentando, e os juros estão subindo. É fundamental que o país tenha estabilidade econômica para que a gente não perda (sic) as conquistas, inclusive as sociais. Para aumentar investimentos, é fundamental que se readquira a confiança em dois níveis: a que o governante passa, e sinto que a sociedade já não consegue mais ter confiança na forma como a presidente Dilma governa; e outra é combinando instrumentos de política macroeconômica e microeconômica criando ambiente favorável para investimentos."
Questionada se, caso eleita, vai aumentar impostos, a ex-senadora disse que "nosso compromisso é de não aumentar impostos". No entanto, depois, afirmou que o governo deveria corrigir o preço da gasolina.
"Nosso compromisso é de não aumentar impostos, é de dar eficiência ao gasto público. Porque tem muito desperdício, inclusive da corrupção. Quando o país volta a crescer, a gente vai adquirindo espaço fiscal para fazer os investimentos sociais. É uma questão de escolha. Se a escolha é de que queremos prover a sociedade com Saúde (...), vamos conseguir os meios para se ter os 10% da receita corrente bruta da União para a Saúde. Se conseguiu R$ 500 bilhões para ungir empresas que recebem esses recursos a juros subsidiados, e depois se vem com argumentos de que não é possível alocar os recursos para atender os brasileiros na Saúde, na Educação, na Segurança?"
Pré-sal
A candidata do PSB foi perguntada também sobre como usaria os recursos do pré-sal, já que defende outros tipos de energia.
"Se estou dizendo que o pré-sal é uma prioridade entre outras, estou dizendo que nós vamos explorar o pré-sal, mas também vamos dar um passo à frente, investir em energia limpa, com uso da biomassa, uso do vento, uso do sol. Não faz sentido termos a maior área de insolação do planeta e termos a quantidade de energia solar que temos. A Alemanha tem 0,9% de sol e tem 20% da sua matriz energética de energia solar", disse, e continuou fazendo uma metáfora: "É você cuidar do lugar onde a bola está, mas sem ficar apenas nesse lugar. É você ir também para onde a bola vai estar. O mundo inteiro está correndo atrás de economia de baixo carbono. O petróleo é necessidade não só do Brasil, é do planeta, ainda não se conseguiu a fonte que vai substituir esse combustível fóssil".
Ao ser perguntada quando subiria o preço da gasolina para "salvar" o etanol, Marina chamou a política do atual governo de "desastrosa", referindo-se ao subsídio atual dado à gasolina, o que, para ela, "acabou destruindo a indústria do etanol". E completou:
"Espero que os preços administrados pelo governo possam ser corrigidos pelo próprio governo. (...) Quero que se tenha uma visão de país. Não essa visão tacanha de como vai ganhar o voto do cidadão, deixando a conta pra depois, a conta da energia, a conta de todos os preços administrados, que senão a inflação estaria pior. Isso não é a melhor governança. Fico impressionada como se sacrifica os recursos de milhares de anos por apenas uma eleição. Por isso sou contra a reeleição. (...) Porque não quero governar pensando no que vou fazer para a próxima eleição", disse, afirmando, ainda, que "quase 30% da nossa produção agrícola" seriam perdidos por "falta de armazenamento, de estrada".
Sobre investimentos em termelétricas - o programa de governo de Marina fala em diminuir seu uso, por causa da poluição --, e o risco de apagão que representaria não usá-las no caso de baixo volume de produção nas hidrelétricas, Marina disse que "falando desse jeito tem uma certa simplificação do problema":
"Hoje temos as termelétricas como recurso complementar quando os reservatórios baixam. Com custo muito alto. Se tivéssemos já investido na produção da biomassa, usando bagaço e palha da cana de açúcar, que é equivalente a 3, a 4 (usinas de) Belo Monte, com certeza teríamos megawatt/hora de R$ 200; hoje estamos com megawatt/hora de R$ 1 mil a R$1,7 mil. Você advoga isso como política energética? Não podemos prescindir dessa fonte auxiliar, mas temos que buscar novos investimentos"afirmou, sendo em seguida questionada se os especialistas estariam, então, errados quando dizem que fontes de energia limpa seriam suplementares, e não livrariam o país de um apagão, em situações de crescimento da economia. "Os especialistas também dizem que o Brasil pode avançar cada vez mais com fontes limpas de geração de energia. Temos uma grande fonte que é a hidroeletricidade; 63% desse potencial estão na Amazônia. Se os projetos têm viabilidade econômica, ambiental, social, é fundamental que se façam esse projetos. Mas é preciso avançar. (...) O pré-sal é importante, vamos usar os recursos para Educação. Mas vamos também usar para ciência, tecnologia, inovação."
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