Prédio no qual fica o Ministério do Turismo, na Esplanada, em Brasília| Foto: Geyzon Lenin/Jornal de Brasilia

O escândalo do desvio de recursos públicos do Ministério do Turismo por meio de emendas ao orçamento da União reabriu a discussão a respeito desse mecanismo utilizado no Congresso para os parlamentares destinarem verbas às suas bases eleitorais. Especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo são taxativos em afirmar que as emendas servem, na verdade, como garantia de reeleição e instrumento de barganha nas votações de projetos do interesse do Executivo, que é quem libera o recurso das emendas. Outro problema apontado é a falta de transparência nas verbas destinadas a ONGs – boa parte delas de fachada. Uma solução, segundo eles, seria exigir uma fundamentação exaustiva que justifique a liberação de cada emenda.

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Na última semana, a Opera­ção Voucher, da Polícia Federal (PF), e uma auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) apontaram casos no Amapá e no Paraná que representam um esquema fraudulento disseminado no Congresso. De início, o parlamentar apresenta uma emenda para destinar dinheiro a determinado projeto. Com a autorização do ministério da área, o recurso é repassado a um instituto intermediário – muitas vezes de pessoas ligadas ao parlamentar – e, por fim, chega às mãos de uma empresa, geralmente com endereço falso e em nome de laranjas, que deveria executar o serviço.

O resultado das fraudes é um desvio milionário dos cofres públicos. Para se ter uma ideia, as emendas individuais em 2011 somam R$ 7,7 bilhões, sendo que cada parlamentar pode em­­penhar até R$ 13 milhões num total de 25 emendas.

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Problemas

Para o advogado Rodrigo Ma­­theus, especialista em Direito do Estado e conselheiro do Instituto dos Advogados de São Paulo, a distribuição de verbas por meio de emendas atende a interesses políticos e não ao interesse pú­­blico. "O que prevalece hoje é o interesse do parlamentar em ser eleito e reeleito, quando, na verdade, deveria preponderar a utilização do dinheiro público com racionalidade, eficiência, economicidade", afirma.

Já o advogado Gustavo Justino de Oliveira, professor de Direito Administrativo da USP, critica o fato de a liberação das emendas ser usada como moeda de troca entre o Legislativo e o Executivo – nesta semana, por exemplo, o Planalto prometeu liberar recursos de emendas para acalmar aliados no Congresso. "Além disso, há um grande problema no fato de o próprio Parlamento ser o responsável pela aprovação do orçamento. Nesse cenário, as emendas acabam sendo instrumento de barganha", ressalta.

Outra falha grave apontada por eles é a total falta de controle sobre os recursos que são repassados a ONGs, uma vez que quase todas elas não prestam contas da aplicação do dinheiro. "É claro que há organizações sérias, que podem dar muito benefícios à sociedade. Mas infelizmente, isso não tem sido a regra das ONGs que recebem capital estatal. Trata-se de dinheiro público, que precisa da devida transparência urgentemente", argumenta Matheus.

Soluções

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Matheus defende que seria uma medida muito radical simplesmente acabar com as emendas individuais. Para ele, é preciso es­­tabelecer exigências claras e efetivas para a liberação das emendas, que devem trazer justificativas muito bem embasadas.

"A emenda deveria ser vinculada a determinadas finalidades. Nesse caso, caberia ao parlamentar destiná-la a um projeto no sentido de cooperação com Executivo; destiná-la para uma finalidade específica", completa Oliveira.