Oito dias após a “batalha” do Centro Cívico, o coronel César Kogut pediu na noite desta quinta-feira (8) exoneração do comando da Polícia Militar do Paraná (PM). Ele alegou ao governador Beto Richa (PSDB) “dificuldades insuperáveis” no relacionamento com a direção da Secretaria da Segurança Pública. Horas depois, em entrevista exclusiva à Gazeta do Povo, Kogut voltou a responsabilizar diretamente o secretário da Segurança, Fernando Fra ncichini, pela ação policial contra os professores e servidores estaduais, que deixou 213 feridos.
Não estou saindo pelos atos lá da Assembleia [no último dia 29]. Estou saindo porque acho realmente que não tem como eu me relacionar com o secretário [Francischini].
Saída de Kogut não agrada a cúpula da PM
- Katna Baran
A saída do coronel César Kogut do comando da Polícia Militar não agradou a cúpula da PM. Conforme apurou a reportagem, a intenção do coronel era de deixar o comando desde que o secretário de Segurança do estado Fernando Francischini se eximiu da culpa pela ação ocorrida no Centro Cívico na semana passada, mas Kogut acabou ficando por apelo de colegas da corporação. Na quarta-feira (6), associações que representam os policiais já haviam manifestado repúdio às declarações do secretário.
Para o coronel Elizeo Furquim, presidente da Associação de Defesa dos Direitos dos Policiais Militares Ativos, Inativos e Pensionistas (AMAI), mesmo com a troca de comando, o relacionamento da instituição com o secretário é insustentável. “A desconfiança que se instalou é permanente e não foi apenas em relação ao comandante [Kogut]. Ele [Francischini] está incompatibilizado com a corporação”, declarou. A AMAI deve ingressar com uma ação de improbidade administrativa contra o secretário. Segundo Furquim, “na pior das hipóteses”, o governador deveria trocar ambos. “Ele poderia aproveitar a oportunidade para tirar um ganho qualquer nesse sentido, no sentido de mudanças positivas, mas não vejo como isso possa ser estabelecido com esse grau de desconfiança com o secretário. Ele também precisa ir embora para partimos para uma vida nova na corporação.”
Crise institucional
Para o sociólogo e coordenador do Centro de Estudos da Violência da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Pedro Bodê, a área da segurança pública do estado passa por uma “crise institucional sem precedentes”. “Virou um jogo de empurra-empurra. Não me espantaria se os punidos forem alguns soldados que puxaram o gatilho contra os manifestantes, enquanto que os responsáveis estavam no comando da operação, envolvendo Executivo e Legislativo”, disse.
Para ele, a situação deveria ser resolvida com a composição de um gabinete de crise, no qual conversariam o governador, o secretariado e o comando da PM para, finalmente, encontrar uma solução para o problema. Bodê aponta ainda que essa crise pode gerar efeitos à população. “A segurança pública do estado pode ficar prejudicada, enquanto o momento deveria ser usado para produzir mudanças positivas ”, observa.
Segundo o ex-comandante, o planejamento e o tamanho da operação, que contou com 1,6 mil policiais, foram determinados por Francischini e pelo subcomandante-geral da PM, coronel Nerino Mariano de Brito. “O secretário conhecia e participou de tudo”, disse Kogut. Em entrevista coletiva na segunda-feira (4), Francischini havia responsabilizado a PM pela operação, alegando que a secretaria é encarregada apenas pela parte administrativa do setor de segurança. Na quarta-feira (6), Kogut e outros 15 coronéis da PM enviaram carta ao governador em que repudiaram as declarações de Francischini. O secretário reagiu e disse que havia sido mal interpretado.
Coordenação
De acordo com Kogut, a coordenação operacional da PM é legalmente do secretário da Segurança. Por consequência, a responsabilidade pela ação não pode ser somente dos policiais militares. “A responsabilidade pelos atos, certos ou errados, é em conjunto entre a PM e quem esteve na execução do planejamento. Legalmente, a coordenação operacional pertence à Sesp [Secretaria Estadual da Segurança Pública]”, disse o ex-comandante.
Kogut, que deve ir para a reserva da PM, defendeu a tropa ao reafirmar que os policiais não provocaram o confronto com os professores e servidores, pois os manifestantes avançaram primeiro. A PM, disse ele, reagiu depois que os bloqueios para proteger a Assembleia Legislativa foram furados.
Sobre os disparos de balas de borracha, o coronel revelou, pela primeira vez, o nome dos homens que deram as ordens. “Teve ordem dos comandantes operacionais – que eram, no momento, Nerino e Arildo [coronel Arildo Luís Dias, que foi o comandante da operação no dia 29]”. Kogut ainda afirmou que apenas o Ministério Público e a PM, que abriu um inquérito militar, poderão dizer se houve excessos da corporação.
Apesar de deixar o comando da PM, Kogut disse que não se sente abandonado pelo governador Beto Richa e nem que perdeu uma queda de braço com Francischini. “Não estou saindo pelos atos lá da Assembleia. Estou saindo porque acho realmente que não tem como eu me relacionar com o secretário.” O coronel afirmou que em momento algum se sentiu desamparado pelo governo. “Não fui abandonado pelo governo. Foi uma decisão em conversa entre eu e o governador. O governador está abalado.”
Na avaliação de Kogut, Francischini terá muitas dificuldades de relacionamento com a corporação em razão do que disse durante a entrevista coletiva. “Hoje a PM inteira tem uma visão. Os coronéis tomaram uma posição em nome da corporação”, disse, se referindo à carta de repúdio enviada a Richa. O manifesto foi assinado por 16 dos 19 coronéis da ativa da PM. “Saio de bem com o efetivo. A PM está bem unida e continua trabalhando.” Kogut disse também que acredita que a relação entre professores e policiais será restabelecida em breve.
Kogut ressaltou ainda que o subcomandante Nerino Mariano de Brito foi exonerado antes de ele deixar o comando da PM. Portanto, quem assume o comando-geral automaticamente é o chefe do Estado-Maior, coronel Carlos Alberto Bührer Moreira e não Nerino. O novo comandante também é o responsável pelo inquérito policial militar que apura os abusos cometidos pela PM na manifestação de 29 de abril.
No Palácio Iguaçu, a saída de Kogut é vista como “o começo do processo de reestruturação da segurança”. Especula-se que Francischini também não permanecerá no cargo. Mas no governo ninguém confirma oficialmente a possível saída do secretário. Na quarta-feira, Francischini chegou a ser dado como demitido, mas depois de uma reunião com o governador teria sido confirmado no cargo. As cartas assinadas pelos coronéis, divulgadas logo a seguir, no mesmo dia, contudo, teriam tornado ainda mais difícil a permanência do secretário.
Outro lado
A reportagem procurou à noite a assessoria de imprensa da Sesp para que Francischini se manifestasse sobre as declarações de Kogut. Mas a secretaria informou que, devido ao horário, não seria possível dar um retorno. A Gazeta do Povo não conseguiu localizar os coronéis Arildo e Nerino.
Richa sacramenta a 4ª troca no comando da Polícia Militar
Esta é a quarta troca de comando da Polícia Militar (PM) em menos de cinco anos de governo Beto Richa (PSDB). O coronel César Kogut assumiu a função em outubro de 2013. Ele substituiu o coronel Roberson Luiz Bondaruk, que esteve no cargo por dois anos e pediu afastamento por motivo de saúde. A entrada dele no comando ocorreu em meio a impasses sobre a proposta de colocar policiais na guarda de presos em delegacias e cadeias públicas. No discurso de posse, Kogut ressaltou que daria continuidade ao trabalho do seu antecessor. Antes de assumir o comando, ele chefiava a 2ª Regional da Polícia Militar, em Londrina. Quando da ação policial que culminou em cerca de 200 feridos no Centro Cívico, na semana passada, o comandante defendeu a atuação dos PMs, ressaltando que um grupo de manifestantes tentou furar o cerco em torno da Assembleia. Kogut daria uma entrevista coletiva nesta sexta (8), mas o evento foi cancelado pela PM na noite desta quinta (7).
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