Brasília - O ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, costura um acordo entre governo, indústria e revendedores para ampliar para 20 milhões o número de computadores a serem fabricados no Brasil neste ano e, assim, baratear o produto. O volume é 42% superior ao produzido no ano passado (14 milhões de unidades, segundo a Associação Brasileira da Indústria Eletroeletrônica) e maior do que a previsão inicial de 17 milhões feita por empresários do setor para 2011. Para isso, o governo estuda promover mais isenções fiscais, abrir novas linhas de crédito em bancos públicos para a compra de computadores e oferecer outros incentivos dentro da revisão da política industrial que deve ser anunciada nos próximos dias.
A negociação, que passa pelo barateamento dos computadores, foi revelada ontem em entrevista exclusiva à Gazeta do Povo. "Eu vejo as lojas parcelarem os computadores em no máximo 12 meses. Nós poderíamos estender isso para 24, 36 meses. Com isso, vamos dar mais um avanço nessa área. E rapidamente", disse. Equipamentos como tablets também receberão atenção especial.
Outro acordo tratado por Paulo Bernardo está sendo feito com os estados para reduzir os custos da banda larga de 500 a 600 kbps. Segundo ele, com desconto do ICMS é possível chegar a uma tarifa mensal de R$ 29,00 R$ 6,00 a menos do que o teto previsto inicialmente pelo governo. O ministro admitiu que a velocidade é baixa, mas adiantou que a solução passa pela expansão da rede de fibra óptica no país, o que dependerá da Eletrobrás.
O ex-ministro da Secretaria de Comunicação Social Franklin Martins disse que o Ministério das Comunicações precisava de uma "refundação". É isso o que o senhor vai promover?
O que eu recebi de encomenda da presidenta foi o seguinte: nós precisamos cuidar de políticas públicas para essa área com a máxima prioridade. Se o Brasil caminha para ser a 5.ª maior economia do mundo, vai precisar de um desenvolvimento extraordinário nas comunicações. Hoje, a demanda que as pessoas têm para usar novas tecnologias e ter acesso à informação é imensa. Você fala em banda larga e as pessoas param para ouvir. Há uma avaliação de que o nosso serviço nessa área é deficiente e caro. Precisamos saber o que é preciso em termos de políticas públicas para reverter essa situação. Também estamos trabalhando com o Programa Geral de Metas de Universalização, que trata de telefonia fixa. Fizemos hoje [ontem] a primeira reunião formal com as empresas para discutir isso. Queremos levar telefone público para mais de 100 mil localidades que têm dificuldades com telefonia fixa e ter telefonia rural em larga escala. A gente fala tanto em prestigiar as pessoas que moram no campo, mas elas precisam ter esse tipo de retaguarda. Essa questão da telefonia rural e da banda larga são prioridades já para os próximos meses.
Em que preço de banda larga é possível chegar?
Nós estamos trabalhando com um patamar de R$ 35,00 por mês para uma velocidade de 500 a 600 kbps (kilobit por segundo), se os estados cobrarem o ICMS. Mas ainda estamos negociando com os governadores para eles abrirem mão do ICMS para a banda larga e só para ela, não para as telecomunicações em geral. Aí o preço ficaria em até R$ 29,00.
Como está essa negociação com os estados?
Já temos uma manifestação feita no ano passado pelos secretários estaduais de Fazenda, que se propuseram a abrir mão do ICMS. Falei mais recentemente com o presidente do Conselho Nacional de Política Fazendária, Carlos Santana, e ele manteve essa disposição. Mas eu disse que eles não deveriam abrir mão de nada até que façamos um acordo para garantir que as empresas transponham esse desconto para o preço do serviço. Se abrirmos mão do ICMS e o preço continuar caro, não adianta nada.
Muita gente diz que essa velocidade proposta pelo governo, de 500 a 600 kbps, não pode nem ser considerada banda larga...
Também acho isso. Mas a verdade é que as pessoas não têm acesso. Esses dias fui tomar um café e o garçom veio me perguntar se era verdade mesmo que iria baixar o preço da internet. Ele mora aqui em uma cidade do entorno do Distrito Federal, Águas Lindas (GO), e disse que paga hoje R$ 80,00 por esse serviço com a mesma velocidade. Esse é um movimento que precisamos fazer: com a infraestrutura que dispomos hoje, dar acesso às pessoas e baratear os computadores. Além disso, precisamos construir mais infraestrutura para termos mais ligações, até em gbps [gigabit por segundo, ou seja, 1 milhão de vezes mais rápido do que 1 kbps]. O Barack Obama lançou um plano agora para que todos os órgãos públicos dos EUA sejam conectados, dentro de um prazo de 3 a 4 anos, a 1 gbps. Aqui nós vamos ter de fazer alguma coisa parecida. Mas é preciso de infraestrutura basicamente, espalhar linhas de fibra óptica pelo Brasil inteiro.
Qual vai ser o papel da Telebrás nesse processo?
A Telebrás será um ator na difusão da banda larga. Em princípio, vai fazer o provimento dessas linhas de fibra óptica. Se ninguém prover internet em determinadas localidades, podemos até pedir para a Telebrás fazer isso. Embora eu ache que essa não é a vocação da empresa. Não acho que isso vá acontecer porque hoje já contamos com mais de 3 mil provedores espalhados pelo Brasil. Se a gente viabilizar um bom ambiente para esse pessoal, algum recurso do BNDES, da Caixa Econômica, do Banco do Brasil, isso se resolve com a iniciativa privada. A gente tem que aumentar a competitividade para conseguir preços cada vez melhores para o consumidor.
Os computadores e tablets também vão ficar mais baratos?
A presidenta me pediu para conversar com os produtores nacionais. Nós fizemos progressos no governo Lula. Em 2003, 80% dos computadores comercializados no Brasil eram montados aqui, a partir de componentes trazidos do Paraguai. Como nós fizemos a eliminação de impostos, assim como alguns estados, hoje 85% é montado no Brasil. É claro que ainda temos componentes importados em larga escala, mas uma boa parcela já é produzida aqui. O mais importante é que os preços despencaram. Hoje você pode ir no mercado e comprar um computador desktop por R$ 800. O resultado é que foram montados 15 milhões de computadores no Brasil em 2010 [na verdade, os números oficiais dos fabricantes apontam para 14 milhões]. Os produtores estão projetando que neste ano serão 17 milhões. Acho que podemos chegar em 20 milhões. Esse desafio foi lançado. Dá para baratear mais. Eu já conversei com o pessoal da Positivo Informática, o Hélio Rotenberg e o Oriovisto Guimarães, e estou agendando conversas com a associação dos produtores nacionais. Nós estamos fazendo uma revisão da política industrial e eu já falei com o ministro Fernando Pimentel [Desenvolvimento, Indústria e Comércio] e marquei uma reunião com o Guido Mantega [Fazenda] para incluir componentes de comunicações e telecomunicações nisso aí. Com isso, vamos baratear.
Como será essa negociação com os outros ministérios?
Até onde eu percebi nós estamos de acordo. Também falei com o Luciano Coutinho (presidente do BNDES). Nessa revisão da política industrial, nós vamos colocar linhas de crédito para os equipamentos de comunicações e telecomunicações. Vai baratear o financiamento e na área de imposto e eu acredito que podemos fazer mais alguma coisa. Eu vejo as lojas parcelarem os computadores em no máximo 12 meses. Nós poderíamos estender isso para 24, 36 meses. Com isso, vamos dar mais um avanço nessa área. E rapidamente.
Haverá uma política especial para os tablets?
Se houver o desconto de PIS/Cofins que já é dado para os computadores haverá uma isenção de 9,25%. Se depender de nós, dá pelo menos para zerar o PIS/Cofins. Em alguns casos, dá ainda para diminuir o IPI sobre os componentes.
O mesmo Franklin Martins que falou sobre a refundação das Comunicações conduziu o anteprojeto que trata do marco regulatório de mídia eletrônica, que agora ficou a cargo do senhor. A proposta está madura para ser enviada ao Congresso?
Não. A primeira coisa que o Franklin me falou ao entregar o projeto foi que ele precisava de mais um mês para terminá-lo. Nós estamos pegando um projeto que não foi acabado. A partir disso, já montei um pequeno grupo para tentar avançar. Nós vamos, antes de tomar qualquer providência, ter uma posição de governo. São questões importantes, sensíveis. O que eu falo sempre para o pessoal que me cobra sobre o assunto é o seguinte: se nós conduzirmos de forma acertada, vai ser um longo e amplo debate. Se conduzirmos errado, vai ser curto, enterrado logo na primeira curva. Há quatro dispositivos da Constituição para serem regulamentados, que envolvem o setor de telecomunicações, de radiodifusão. Não é nada simples, precisamos tratar com cuidado.
O melhor caminho para o texto é segmentá-lo em vários projetos?
A opção do Franklin era por um projeto único. Mas, como se trata de vários temas de regulamentação da Constituição, pode sim haver a divisão em vários projetos. Isso pode acontecer. Não tenho opinião firmada sobre isso, mas acho muito mais difícil aprovar um único projeto. Se você põe todos esses temas espinhosos juntos, a chance de chegar no Congresso e empacar é muito maior.
Que pontos da proposta o senhor respalda?
O projeto está muito bom. Fala, por exemplo, sobre a obrigatoriedade de as grandes empresas de radiodifusão produzirem conteúdo nacional e local. E fala também da produção independente. Além disso, há a questão da propriedade cruzada [dos meios de comunicação, quando uma empresa é dono de mais de um veículo em uma mesma região]. A polêmica que surgiu sobre esse assunto é a seguinte: se esse conceito ainda é o mesmo de dez anos atrás. É provável que não seja. Mas é uma discussão que precisamos fazer. O projeto está bem conduzido, mas nós precisamos fechar questão no governo antes de sair por aí falando alguma coisa.
E a questão de proibir políticos de ter concessão de rádio e televisão?
O projeto proíbe [a concessão] para detentores de mandato eletivo. A preocupação disso é a seguinte: quem defere as concessões é o Congresso. Então um congressista, por exemplo, não pode votar uma coisa que é para ele mesmo ou votar para um colega de partido que é deputado estadual. Acho mesmo que deveria proibir. Mas faço a ressalva: nós não somos tolos e sabemos que isso é dificílimo de ser aprovado no Congresso.
O senhor tem posição sobre a proibição da propriedade cruzada?
Eu não tenho uma posição clara. A lei hoje já diz que um mesmo grupo não pode ter mais de duas emissoras de televisão no mesmo estado, nem pode ter mais de quatro rádios AM ou seis FM. Já há uma lei nesse sentido. Precisamos chegar na fórmula mais indicada para, ao mesmo tempo, fortalecer o setor e dar chance para mais gente atuar.
Meios impressos, como jornal, estão totalmente fora dessa regulação?
Sim. A Constituição não fala nada sobre jornal. A única coisa que você pode regular, mas que não está no projeto, é direito de resposta. Jornal não é objeto da proposta, assim como outdoor, busdoor e internet. O projeto trata de radiodifusão e telecomunicação, porque há uma intersecção de empresas de telecomunicações que atuam no mercado de TV a cabo.
Nessa linha, não é contraditório ser contra a propriedade cruzada de meios de comunicação e, ao mesmo tempo, defender uma licença única para as teles oferecerem serviços múltiplos de internet banda larga, TV a cabo, telefonia fixa e móvel?
A licença única é diferente. No caso das telecomunicações você precisa de uma licença para TV a cabo, uma para internet, uma para telefone fixo e outras para celular. O que a Agência Nacional de Telecomunicações está fazendo é ver se é possível haver uma licença para tudo isso junto. Não sei se é contraditório. Acho que não.
E quanto à proposta de regulação de conteúdo, o senhor é a favor?
Regulação de conteúdo quer dizer o seguinte: não pode haver manifestações racistas, pregações à violência, mensagens que firam os direitos da criança e do adolescente. Qual é a forma de fazer isso? A priori, não dá para esperar o que cada emissora vai fazer. O que deveríamos ter é um conselho que verifique essas práticas. Tem que haver alguma penalidade.
Esse é o ponto mais delicado do anteprojeto?
Com certeza, porque não pode deixar margem para subjetividade. Há liberdade de expressão. Nós temos que garantir o direito à livre circulação de ideias. Mas, se alguém está usando esse direito de forma errada, é preciso achar algum meio de tratar isso. Talvez seja o caso de veicular respostas de que o que foi veiculado fora da lei foi um equívoco. Só isso já é uma vergonha para uma rádio ou televisão. Eles vão tomar mais cuidado.
O monitoramento das chamadas telefônicas que será implementado pela Anatel foi alvo de muitas críticas. Como vai ser garantida a inviolabilidade dos cidadão nos seus contatos por telefone celular?
A questão é que tem que garantir. A Constituição garante o sigilo telefônico, como garante sigilo bancário e fiscal. O que a Anatel está fazendo é uma sistematização que permitirá ter os dados gerenciais agregados das ligações, até para poder verificar se as reclamações por conta de má prestação de serviços que chegam até ela são procedentes ou não. A Anatel está muito tranquila de que isso não se trata de quebra de sigilo.
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