Pressionado pela perda do selo de bom pagador e sob a ameaça de deterioração ainda maior da economia, o governo Dilma Rousseff decidiu cortar gastos e aumentar impostos para tapar o rombo de pelo menos R$ 30,5 bilhões no orçamento de 2016 enviado ao Congresso Nacional.
Saída de Unger abre caminho para corte de ministérios
- brasília
Ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos, o filósofo Mangabeira Unger pediu demissão nesta segunda-feira (14). Em nota, a presidente Dilma Rousseff afirma que aceitou o pedido e agradece “todo o trabalho prestado por Unger durante sua gestão [...], esperando que ele possa continuar contribuindo com seus valorosos serviços como consultor do governo federal”.
Unger comunicou à presidente que estava deixando o cargo por motivo de “doença grave” na família. A decisão de Unger, no cargo desde fevereiro, foi tomada no momento em que o Planalto anunciou o corte de ao menos dez ministérios –uma das medidas contra o déficit. Segundo assessores de Dilma, o ministro pode ter se antecipado à reforma, que vai extinguir sua pasta.
Com a saída, Dilma deflagrou a reforma ministerial que será detalhada na semana que vem.
Os ministros Joaquim Levy (Fazenda) e Nelson Barbosa (Planejamento) anunciaram o tamanho do corte de gastos: R$ 26 bilhões – que incluem o congelamento dos salários dos servidores federais e de concursos e o contingenciamentos de programas sociais, como o Minha Casa Minha Vida – que perderá R$ 4,8 bilhões dos R$ 15,6 bilhões que estavam previstos para 2016.
Empresários criticam cortes no Sistema S e aumento de tributos
O governo também propôs o aumento e a criação de impostos, como a nova CPMF – o imposto sobre movimentações financeiras. No total, as receitas previstas para o ano que vem vão aumentar R$ 40,2 bilhões. Com isso, o governo espera tapar o rombo e economizar cerca de R$ 30 bilhões para fazer 0,7% do PIB de superávit primário. Com isso, pode pagar juros – o motivo de o Brasil perder o selo de bom pagador.
A maior parte das medidas depende do apoio do Congresso, que terá de aprová-las. O governo precisa da aprovação de seis medidas provisórias, duas propostas de emenda constitucional (PECs) e um projeto de lei para aprovar o ajuste fiscal.
Imposto do cheque
A alíquota proposta para a nova CPMF, de 0,2% sobre movimentações financeiras, deve gerar R$ 32 bilhões para os cofres do governo em 2016, dinheiro que irá abastecer a Previdência Social. Segundo Levy, o objetivo é que o imposto seja provisório e “não dure mais do que quatro anos”.
Outra medida que deve encontrar resistência é o adiamento do reajuste dos servidores que começaria a ser pago em agosto de 2016. Com isso, o governo economiza R$ 7 bilhões. Apenas para o funcionalismo do Poder Executivo, o gasto com aumentos chega a R$ 13,15 bilhões. O governo também anunciou a suspensão dos concursos em 2016, gerando uma economia de R$ 1,5 bilhão.
Joaquim Levy anunciou ainda que haverá aumento do Imposto de Renda (IR) sobre o ganho de capital de pessoas Físicas, que é o cobrado na alienação de bens. Segundo ele, a medida terá um impacto de R$ 1,8 bilhão na arrecadação de 2016. Atualmente, é cobrada uma alíquota de 15% em todas essas operações de vendas de imóveis de pessoas físicas. Com a mudança, operações cumulativas de até R$ 1 milhão por ano continuarão com a mesma alíquota, mas haverá faixas mais altas para valores superiores: de R$ 1 milhão a R$ 5 milhões (20%), de R$ 5 milhões a R$ 20 milhões (25%) e transações superiores a R$ 20 milhões (30%).
Cortes
Medida | Descrição | Impacto | Afetados |
---|---|---|---|
Mudança de fonte do Minha Casa, Minha Vida | Ideia é que o FGTS passe a participar dos gastos da faixa 1 do Programa Minha Casa, Minha Vida. | R$ 4,8 bilhões | Todos os trabalhadores |
Mudança no PAC | Emendas parlamentares serão direcionadas para execução de programas para o PAC. | R$ 3,8 bilhões | Deputados e senadores |
Reduzir despesa discricionária para o orçamento da saúde | 50% das emendas parlamentares impositivas já vão para saúde. Ideia é direcionar esse porcentual para programas prioritários do Ministério da Saúde | R$ 3,8 bilhões | Deputados e senadores |
Redução do custo administrativo | Renegociação de contratos, limites para gastos com servidores e redução de ministérios | R$ 2,0 bilhões | Servidores e fornecedores do governo federal |
Suspensão de concursos públicos | Suspender concursos públicos, não só para o governo federal como para os demais Poderes. | R$ 1,5 bilhão | Quem estuda para fazer concursos federais |
Eliminação do abono de permanência | BenefÃcio pago a servidores que adquirem condição de aposentadoria, mas permanecem no trabalho. Proposta de emenda constitucional (PEC) será enviada ao Congresso. | R$ 1,2 bilhão | Aposentados que continuam trabalhando |
Revisão do gasto com subvenção de garantia de preços agrÃcolas | Gastos previstos com garantias de preços agrÃcolas serão reduzidos. | R$ 1,1 bilhão | Produtores agrÃcolas |
Garantir a implementação do teto remuneratório do serviço público | Proposta é enviar um projeto de lei ao Congresso para disciplinar a metodologia de cálculo do teto de remuneração do serviço público. Envolve diversas esferas da federação. | R$ 0,8 bilhão | Servidores que ganham acima do teto |
Impostos
Medida | Descrição | Impacto | Afetados |
---|---|---|---|
CPMF | Recriação da CPMF, imposto que incide sobre operações financeiras, com alÃquota de 0,20%. Objetivo é que a CPMF não dure mais de quatro anos. | R$ 32 bilhões em arrecadação | Toda a população |
Imposto de Renda | Aumento da alÃquota do Imposto de Renda de pessoa fÃsica sobre ganhos de capital. O aumento do IR terá 4 alÃquotas, que vão de 15 a 30%, esta para ganhos de capital acima de R$ 20 milhões. | R$ 1,8 bilhão | Quem apontar aumento de capital na Declaração do IR |
Redução do gasto tributário | Redução das compensações do Reintegra, programa que devolve parte das receitas obtidas através de exportação de produtos industrializados, de forma gradual. | R$ 2 bilhões em economia | Empresas exportadoras |
Redução PIS/Cofins | Redução da alÃquota de PIS/Cofins no Regime Especial da Indústria QuÃmica. | R$ 800 milhões em economia | Indústrias do setor quÃmico |
Mudança no Sistema S | Mudança na dedução de valores do Sistema S. | R$ 2 bilhões em economia | Entidades do Sistema S, como Sesi e Senac. |
O ministro do Planejamento também informou que o governo vai renegociar contratos do governo de aluguéis, segurança, manutenção e outros serviços, gerando uma economia de R$ 1,6 bilhão no ano que vem.
Além disso, haverá um limite estipulado com o gasto com servidores com diárias, passagens aéreas, auxílio moradia e telefone, o que vai impactar em R$ 200 milhões por ano a menos. O teto salarial do servidor também será disciplinado, rendendo R$ 800 milhões de economia. Já com a redução de ministérios e cargos de confiança o governo espera economizar R$ 200 milhões. Outra medida tomada é o fim do abono de permanência pago aos servidores que têm idade para se aposentar, mas que permanecem no serviço público. A economia será de R$ 1,2 bilhão por ano. Já o PAC terá cortes R$ 3,8 bilhões.
Empresários criticam cortes no Sistema S e aumento de tributos
- são paulo
Empresários e representantes da indústria, do varejo e do setor de serviços criticaram a elevação de tributos, como a volta da CPMF, e a retenção de parte das verbas do Sistema S –conjunto de nove instituições, como Sesc, Senai, Sebrae e Senac.
Para o presidente da Confederação Nacional da Indústria, Robson Andrade, é preciso “negociar a forma como estes cortes vão acontecer”. O empresário afirmou que o corte linear vai prejudicar estados do Norte, Nordeste e Centro-Oeste, que contam com verbas para bancar programas profissionalizantes.
A redução nas verbas do Sistema S foi criticada também pela Abimaq, associação que reúne fabricantes de máquinas, e pela Fecomercio SP.
“O governo não cortou nada na carne. O que houve foi falta de transparência e uma transferência [da conta] para a sociedade”, disse o presidente da Fiesp, Paulo Skaf, ao se referir à CPMF.
Para Skaf, o ministro Joaquim Levy (Fazenda) foi irônico ao fazer comentários como “um aumentozinho de tributo”. “Um desrespeito. O Brasil não precisa de ministro para aumentar imposto, mas, sim, para combater a corrupção, reduzir o tamanho do Estado. O gastão da história é o governo, não são as famílias.”
José Romeu Ferraz Neto, presidente do SindusCon-SP, lamentou o corte adicional referente ao Minha Casa, Minha Vida, além da redução de R$ 15 bilhões nesse programa, já anunciada anteriormente. “Responsável por 60% dos investimentos produtivos, a construção será fundamental para a retomada do crescimento econômico”, afirmou.
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