Peritos do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) constataram várias falhas na contabilidade de três gráficas que receberam recursos em 2014 da campanha à reeleição da presidente afastada Dilma Rousseff (PT). Em suma, elas não apresentaram documentos que comprovem a prestação dos serviços, “não afastando nessa hipótese, o desvio de finalidade dos gastos eleitorais para outros fins que não o de campanha”.
As gráficas Rede Seg, VTPB e Focal também falharam em demonstrar que subcontrataram outras empresas para tocar parte do serviço. Outro problema são notas fiscais que, mesmo canceladas, apareceram na prestação de contas. A perícia foi determinada em abril pela ministra Maria Thereza de Assis Moura, corregedora do TSE, e entregue a ela na segunda-feira (22).
A auditoria será anexada no conjunto de provas das quatro ações que pedem a cassação da chapa vitoriosa e são relatadas pela corregedora. Se o impeachment de Dilma for confirmado, o presidente interino Michel Temer, que foi vice na chapa, herdará todos os processos. A perícia é assinada pelos contadores Eron Junior Vieira Pessoa, José Carlos Vieira Pinto, Alexandre Velloso de Araujo e Thiago José Rodrigues de Queiroz, servidores do TSE.
As conclusões da perícia são piores no caso da Focal, na qual foram encontradas “inúmeras inconsistências”. Há notas fiscais, por exemplo, que foram canceladas e, mesmo assim, tiveram seus serviços “remunerados pela chapa presidencial eleita e registrado na contabilidade da empresa como pagamentos recebidos em espécie”. Assim, concluem os peritos, “a empresa foi remunerada pela campanha por um serviço não prestado”.
“Contabilmente, o cancelamento posterior das notas, sem o correspondente registro de estorno ou de devolução dos recursos, pode representar uma simulação de prestação de serviços, a fim de justificar o recebimento de recursos, em espécie ou por meio de conta bancária”, escreveram os peritos. Há ainda nota fiscal indicando entrega de produto em quantidade inferior àquela produzida, e outras notas fiscais sequenciais emitidas na mesma data.
Todas as três empresas tiveram problemas em comprovar a subcontratação de empresas. Simplesmente não apresentaram documentos que pudessem confirmar isso. A Rede Seg, por exemplo, não apresentou contratos, ordens de serviço, notas fiscais ou comprovantes de pagamentos das subcontratadas. Já a Focal remunerou as subcontratadas num valor muito interior ao cobrado da campanha de Dilma. Recebeu R$ 5,1 milhões em bens e serviços que foram subcontratados a outras empresas por R$ 1,5 milhão.
Na Rede Seg, também houve problemas na aquisição de matéria-prima. “Além da Rede Seg não possuir qualquer controle de entrada e saída de insumos, controle de estoques, registre-se que os insumos adquiridos pela Rede Seg foram entregues em outra gráfica, a Graftec Gráfica e Editora Ltda., que, a exemplo da Rede Seg, também não possuía funcionários declarados na RAIS (Relação Anual de Informações Sociais), nos exercícios de 2013 e 2014”, diz trecho do documento.
No caso da Gráfica VTPB, os peritos concluíram que a empresa conseguiu comprovar apenas 21,5% das suas receitas em 2014. Naquele ano, a empresa faturou R$ 26.555.977, sendo a maior parte - R$ 22.398.620 - vinda da campanha de Dilma. Os peritos afirmam, porém, “que a empresa somente apresentou documentos fiscais das empresas subcontratadas e de aquisição de insumo no valor de R$ 5.708.447,10”.
Depoimentos de testemunhas
A ministra Maria Thereza também tinha determinado perícia na Editora Atitude. Nesse caso, os peritos disseram que, ao analisar as contas da campanha, não foram declarados gastos com a empresa. Assim, não foi feita a perícia, porque esse era um dos pressupostos requeridos para sua realização. Durante as investigações, apareceram indícios de que a gráfica teria prestado serviço para a campanha de forma ilícita, mas a suspeita não foi comprovada. Na Operação Lava Jato, essa empresa teria sido usada pelo ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto para lavar dinheiro desviado da Petrobras.
O laudo da perícia foi entregue na segunda-feira a Maria Thereza. Terminada a auditoria nas empresas, a ministra inaugurou uma nova fase nas investigações e determinou o depoimento de dez testemunhas. Na lista, estão o ex-gerente da Petrobras Pedro Barusco; o lobista Julio Camargo; o engenheiro Zwi Skornicki; o dono da UTC, Ricardo Pessoa; o ex-executivo da Camargo Corrêa Eduardo Hermelino Leite; e os ex-executivos da Andrade Gutierrez Otávio Marques de Azevedo e Flavio David Barra.
As testemunhas vão prestar depoimento nos dias 16 e 19 de setembro, algumas na Justiça Federal no Rio de Janeiro, outras na Justiça Federal em São Paulo. Maria Thereza também solicitou ao Supremo Tribunal Federal (STF) o compartilhamento de provas da Lava Jato. Ela quer cópias das delações premiadas feitas por Otávio Marques de Azevedo, Flavio David Barra e Ricardo Pessoa. A decisão de compartilhar ou não as provas será tomada pelo relator da Lava Jato no STF, ministro Teori Zavascki.