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Fernando Haddad: “Há de se desnudar todo o sistema de financiamento político, não só o do PT”. | Wilson Dias/Agência Brasil
Fernando Haddad: “Há de se desnudar todo o sistema de financiamento político, não só o do PT”.| Foto: Wilson Dias/Agência Brasil

Com Dilma Rousseff à beira do afastamento e Luiz Inácio Lula da Silva acuado por denúncias de corrupção, Fernando Haddad ganha cada vez mais o status de principal nome do Partido dos Trabalhadores. A pouco meses de tentar sua releição, o prefeito de São Paulo avalia o avanço da Lava Jato além das fronteiras petistas e insiste na teoria do casuísmo no impeachment – mesmo que para se manter de pé, isso dependa de uma verdadeira conspiração entre diferentes atores do jogo político e judicial. Confira a entrevista:

Nestes últimos dias o presidente do PSDB, Aécio Neves, e o deputado federal Carlos Sampaio, do mesmo partido, foram implicados na Lava Jato, ao mesmo tempo em que Eduardo Cunha foi afastado da Câmara. A tese da seletividade da investigação com o PT cai por terra?

É uma esperança dos republicanos, uma vez que o sistema de financiamento é universal. São problemas que podem existir em vários partidos, nas esferas municipais e nacionais. É uma análise complexa de relações que dependiam de apenas uma única pessoa. Há que se desnudar todo o sistema de financiamento político, não só o do PT.

Você acredita que será desnudado?

Acredito que a perspectiva melhora. De que isso não tenha um viés de partido. A administração pública no Brasil tem problemas, sobretudo em relação aos grandes players das obras públicas e tal. Obviamente que tem. É uma coisa histórica, de décadas. Está havendo oportunidade agora de explicitar de uma vez por todas como funciona e fazer uma reforma pra valer. Por isso que a Lava Jato tem que ser apoiada nesse sentido. Temos que apoiar, desnudar o sistema político como um todo. Agora, se esse processo for instrumentalizado como um fim, almejando um determinado resultado político partidário, causa angústia em pessoas que querem o bem do Brasil e a verdade.

Qual sua avaliação do afastamento do presidente da Câmara [Eduardo Cunha]?

Li os fundamentos pela imprensa. Embora seja uma decisão extremamente radical, e um gesto inédito na história, pelo que li, foi muito bem fundamentada pelo relator. É uma medida extrema, que me parece que foi fundamentada. Toda essa crise em que o pais está envolvido, tem que ser concluída com fortalecimento de garantias individuais, nem pode desejar que para o país seja passado a limpo se viole direitos iniciais.

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O sr. tem uma eleição pela frente e está num partido que vive um terremoto particular. Que futuro enxerga?

Acredito que o PT está vivendo um momento muito delicado, mas é tapar o sol com a peneira não perceber que o sistema político está em xeque. As últimas pesquisas de intenção de voto mostram a queda drástica dos principais candidatos da oposição. É revelador de um quadro muito particular da vida nacional em que ninguém está ganhando com a crise, do ponto de vista político, pra não falar do econômico. O Brasil tinha uma mudança de rota previsível depois da eleição que faria o país superar talvez com um ano de ajuste as suas dificuldades momentâneas que eu não as considerava estruturais.

E o que aconteceu no caminho?

A crise política está levando água para a crise econômica, também turbinada pelas investigações da Lava Jato. E isso está criando um caldo de cultura bastante perigoso, porque não se descortinam cenários alvissareiros. E não há como negar o casuísmo na decisão tomado em relação ao caso da presidenta Dilma.

Por que chama de casuísmo?

Porque se esse critério fosse adotado para governadores e prefeitos muitos teriam que ser impedidos também em função de manobras, por assim dizer, contábeis que ajustam as contas em final de mandato. Isso aconteceu em vários governos subnacionais e nunca foi considerada propriamente uma ilegalidade. O que significa dizer que a base da decisão da Câmara era casuística, porque provavelmente ela não vai se aplicar mais a nenhum outro governante.

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A tese de casuísmo levaria a pensar que a procuradoria geral da República, o Ministério Público, o Supremo estaria envolvido. Não parece um pouco de teoria conspiratória?

Talvez eu esteja me expressando mal. Estou dizendo que tem havido uma mudança de entendimento sobre várias regras numa velocidade frenética. A mudança de entendimento causa um tipo de apreensão, isso é um tipo de apreensão. O outro tipo de apreensão a que eu me refiro é se vai valer pra todo mundo. Ai eu me referi à questão da tal da contabilidade criativa vai valer para os governadores que foram reeleitos em 2014. Os ministérios públicos dos estados estão atentos para eventualmente propor ações de improbidade contra os gestores.

Mas a pedalada que está sendo julgada é relativa a 2015.

E está valendo, então?

A partir de agora sim, parece que se criou uma “jurisprudência” nacional.

Mas no ano, se criou uma jurisprudência no ano para impedir uma presidenta? Para pra pensar. Cassando um presidente com esse argumento?

A própria oposição admite que se trata de um julgamento jurídico político, como nos disse o senador Aloysio Nunes, alegando que havia a razão jurídica. E inclusive ele lista outros problemas de governabilidade, como a falta de controle na Petrobras, entre outros fatores.

Isso é que a gente chama de casuísmo, que é quando você começa a fazer uma ginástica. Uma ginástica pra justificar uma cassação.

Mas se ela tivesse atuado pari passu com o que ela tinha em caixa não teria sido melhor, ainda que saísse em 2014?

Eu entendo que a presidenta Dilma estava convencida de que as políticas anticíclicas não produziriam o efeito que produziram, ela manteve a inflação e o desemprego controlados, como seria um rito de passagem para uma recuperação da economia em função do quadro internacional. Essa aposta foi perdida.

Mas represou e depois ele soltou tudo, tanto no desemprego como na inflação.

A guinada de 180º dada pelo [ex-ministro da Fazenda] Joaquim Levy depois da eleição acabou agravou a situação. Ao invés de dar um choque de credibilidade, provocou uma confusão geral nas expectativas, as pessoas não sabiam mais aonde se apoiar. Obviamente que o PSDB soube jogar com isso e pautou o impeachment dois dias depois da proclamação do resultado das eleições e nunca mais deixou o palanque cobrando o afastamento da presidente. Se colocando na posição do empresário, ele vê o governo dessa maneira e a oposição de outra, ele aguarda. A principal razão, a quase única razão da queda do PIB foi a retração do investimento, entre 70 e 80 % da retração se deve a queda do investimento, pode pegar os dados. E como a crise não se resolve, a economia cai, ela não reage porque o investimento está travado. E aí tem a política monetária né? A política monetária, sinceramente o que o Banco Central está fazendo com o país, de juro real de 7%, é inexplicável.

Sim, mas como controlar a inflação?

Mas ninguém é contra, tanto é que a inflação está caindo, está despencando.

Mas isso depois de a gente estourar a meta. Inflação sob controle é um patrimônio do Brasil, não?

Mas porque [os preços] foram desrepresados os preços administrados, não era problema de demanda propriamente.

Mas isso sempre houve o alerta, ao longo de 2013 e 2014 de que isso ia dar uma distorção lá na frente.

Não estou querendo fazer uma defesa de medidas que eu já tive oportunidade de criticar pessoalmente. A energia elétrica, nós tivemos uma seca. Agora o preço da energia vai cair. Os combustíveis também, a expectativa era de que valia a pena segurar os preços porque o preço do petróleo ia cair, como de fato caiu. O tempo que isso levou e o passivo que isso gerou é que não estava dentro das expectativas do governo, mas nós vamos ter queda agora.

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