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Em 21.07.2010, o presidente Barack Obama sancionou a lei denominada “Dodd–Frank Wall Street Reform and Consumer Protection Act” ou, simplesmente, “Dodd-Frank Act”, como parte da reforma financeira realizada no país após a crise econômica de 2007/2008.

Dentre as centenas de disposições constantes na lei, chama especialmente atenção a regulamentação da atividade realizada por informantes de condutas criminosas, também conhecidos como whistleblowers ou “sopradores de apito”. A lei oferece aos informantes proteção e recompensas que podem variar entre 10% e 30% das multas acima de US$ 1 milhão que forem aplicadas em decorrência das informações prestadas.

Na semana passada, mais precisamente no dia 09.06.2016, a Securities and Exchange Commission (SEC) anunciou o pagamento de um prêmio de US$ 17 milhões a um ex-funcionário de determinada empresa, cujas informações levaram a SEC a avançar na investigação dos crimes financeiros e na ação de execução fiscal. É o segundo maior prêmio já pago pela SEC, ficando apenas atrás de um prêmio de US$ 30 milhões de dólares pago em setembro de 2014 e logo à frente de um outro prêmio, de US$ 14 milhões, pago em outubro de 2013. Vários prêmios menores também foram pagos, bastando apenas mencionar que no mês passado, em maio de 2016, cinco informantes receberam prêmios que totalizaram US$ 26 milhões.

Em uma experiência de escala financeira menor, embora igualmente importante, Buenos Aires, capital argentina, lançou no final de 2014 um aplicativo (BA Denuncia Vial) que permite a qualquer cidadão fotografar e denunciar veículos estacionados em locais proibidos. Nos primeiros 10 dias após o lançamento, foram feitas 2000 denúncias. Um ano após, mais de 30 mil pessoas baixaram o aplicativo e mais de 7000 denúncias foram realizadas.

No Brasil, além da delação premiada (Lei nº 12.850/13), com a qual participantes da organização criminosa podem alcançar a redução da pena, caso forneçam informações relevantes que permitam levar ao esclarecimento de outros crimes, nenhum outro estímulo existe para se prevenir a corrupção, os desvios de dinheiro público e, tampouco, contribuir com a formação cívica da população.

A Operação Lava-Jato, na linha do julgamento do Mensalão, começou o trabalho de desmontar o sistema de premiação do criminoso, que garantia, pela impunidade, a possibilidade de o transgressor aproveitar em liberdade dos resultados do crime. É preciso, no entanto, avançar, de preferência rapidamente, consolidando os resultados da Lava-Jato e se aprovando uma nova legislação contra a corrupção, principalmente com estímulos e prêmios aos cidadãos vigilantes.

Tramitam no Congresso Nacional algumas medidas importantes, como o PL nº 362/2015 (Senado Federal), que procura regulamentar no âmbito nacional a figura do whistleblower, prevendo prêmios ao informante que variam entre 15% e 50% da multa aplicada.

A vigilância premiada é um poderoso estímulo contra corrupção. Apesar da sensação de o Brasil ser refém de criminosos, a grande maioria do servidores públicos e funcionários de estatais é formada por pessoas honestas e cumpridora de seus deveres. Certamente, muitas dessas pessoas conheciam e conhecem esquemas de corrupção nos órgãos públicos, mas se sentem ou sentiam impotentes em denunciar, seja por medo de serem prejudicadas em seu local de trabalho, seja porque suspeitavam que nada aconteceria aos denunciados. Houvesse legislação favorável, muito provavelmente famigerados escândalos de desvio de dinheiro público teriam sido denunciados muito antes.

Por outro lado, não é preciso esperar o Congresso Nacional aprovar medidas de âmbito nacional. Os municípios podem seguir o exemplo de Buenos Aires e aprovar o uso de aplicativos que permitam aos demais cidadãos denunciarem os infratores de trânsito, e, quiçá, aprimorar a ferramenta para que possam denunciar casos de maus-tratos a animais, poluição de rios e lagos, descumprimento das normas para prevenção dos mosquitos transmissores de doenças, dentre tantas outras possibilidades.

No momento em que dados demonstram que aumentou em 2016 o percentual da população (62%) que admite “ter dado um jeitinho” no ano que se passou (fonte: Consultora Ipsos), mecanismos legais que promovam a vigilância premiada, conquanto não exclusivamente, podem ser um importante fator de reconstrução da moralidade cívica da população.

*Anderson Furlan é juiz federal, e foi presidente da Associação Paranaense dos Juízes Federais (Apajufe) em duas gestões.

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