A decisão do ministro Luiz Edson Fachin que suspendeu provisoriamente a formação da comissão especial que analisará o pedido de impeachment despertou debate jurídico sobre a interpretação adotada pelo magistrado. Fachin atendeu ao pedido cautelar do PCdoB, ajuizado no Supremo Tribunal Federal, que requereu a que comissão fosse suspensa por que a votação para a escolha de seus membros foi secreta, o que seria irregular, por não estar previsto na Constituição.
Em entrevista à Globo News, Fachin afirmou que considerou plausível a interpretação do artigo 188 do Regimento da Câmara dos Deputados, apresentada na ação, de que só seria possível fazer a votação secreta para presidente e vice-presidente da comissão. Mas reiterou que caberá ao plenário do STF avaliar questão na próxima semana.
Para alguns juristas, a interpretação doutrinária predominante indica que é proibido o voto secreto de parlamentares em casos que não estiverem expressamente previstos na Constituição. Ivar Hartmann, professor de Direito Público da FGV Direito Rio considera que, a não ser que a Constituição determine e deixe explícito, nem regimento nem lei podem estabelecer voto secreto de parlamentar.
Para constitucionalista, voto secreto tem sido restringido ao longo do tempo
A professora Estefânia Barboza, da Faculdade de Direito da UFPR, considera a que o texto constitucional ainda chegou a prever votação secreta para parlamentares porque foi promulgado em um período de transição. Além disso, o texto atual não prevê votação secreta em nenhuma hipótese para deputados federais, apenas para senadores - em casos de escolha dos chefes de missão diplomática de caráter permanente e de exoneração, de ofício, do Procurador-Geral da República antes do término de seu mandato.
Estefânia ressalta, ainda, que ao longo do tempo, artigos da Constituição que previam votos secreto de parlamentares, como o 53 (sobre manutenção da prisão em flagrante por crime inafiançável cometido por parlamentar) e o 55 (sobre a perda de mandato de parlamenta), foram revogados. Isso demonstraria uma tendência em restringir essa prática.
Essa interpretação não está explícita na Constituição mas, segundo Hartmann, é um entendimento que sempre existiu entre professores de Direito Constitucional e entre alguns ministros. “Não caberia ao ministro Fachin dizer algo em contrário. A decisão dele [sobre a manutenção da prisão de Delcídio] de duas semanas atrás foi nesse sentido”.
Estefânia Barboza, professora de Direito Constitucional da Universidade Federal do Paraná, também avalia que Fachin manteve a coerência com a decisão anterior. Segundo ela, a lógica da votação de parlamentares deve ser a da transparência e da publicidade, e voto secreto é exceção. “Não sendo expresso na Constituição, [o voto secreto] é vedado”, afirma a professora.
Intervenção
Na opinião do Presidente Conselho Fundador da Academia Brasileira de Direito Constitucional (ABDConst) Flávio Pansieri, “o que está em discussão é possibilidade ou não de o sistema de requisitos formais para a deliberação política da Câmara podem ou não ser debatidos pelo STF”. Segundo o jurista, o Supremo não deve interferir em situações como a votação para a escolha da comissão. “Eu entendo que a suprema corte não tem legitimidade para desconstituir decisões parlamentares. Isso é ato interna corporis, que deve ser solucionado no âmbito do Poder Legislativo ”, argumenta Pansieri.
Pansieri considera, ainda, que o Brasil passa por um momento em que é preciso repensar a longa mão do Poder Judiciário, “em razão da legitimidade democrática que a ele não é conferida pelas urnas”.
Prazos
Os prazos relacionados ao processo de impeachment estão suspensos até o dia 16 de dezembro, quando o plenário do STF deve deliberar sobre o pedido do PCdoB. Hartmann, explica que o pleno vai decidir se mantém a liminar ou não. Depois disso, ainda será preciso fazer julgamento o mérito do pedido, que, na opinião do professor, dificilmente ocorrerá neste ano.