Após as recentes manifestações populares, a presidente Dilma anunciou um pacote anticorrupção, contendo uma série de propostas e medidas de prevenção e combate a prática de condutas lesivas ao patrimônio público. Em meio às ações previstas, o governo federal enfim anunciou a tão aguardada regulamentação da Lei Anticorrupção, através do decreto n° 8.420 de 18 de março de 2015.

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Aprovada há aproximadamente dois anos, a lei ainda tinha alguns aspectos centrais que não possuíam critérios específicos para o seu emprego, o que poderia provocar uma enorme insegurança jurídica na sua aplicação. A norma carecia de uma maior delimitação do rito processual com o detalhamento das fases de contraditório, prazos e recursos cabíveis, o estabelecimento de parâmetros objetivos para dosimetria da pena, a especificação das regras para os acordos de leniência e os benefícios às empresas que os adotarem. Ademais, não foram inicialmente estabelecidos os padrões a serem considerados na utilização dos programas de integridade (compliance).

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Em razão desta opção legislativa pela superficialidade, a publicação do decreto era ansiosamente aguardada tanto pelo setor público, quanto pelo setor privado, (neste caso, principalmente pelas pessoas jurídicas interessadas em contratar com a administração pública). E em uma primeira análise do texto regulamentar, a impressão é muito positiva.

Logo no início constata-se a preocupação do governo federal em detalhar o procedimento para aferição da responsabilidade administrativa das pessoas jurídicas possivelmente envolvidas nos atos lesivos estabelecidos na lei. Entre as medidas previstas, foram definidos os prazos para conclusão da investigação preliminar e instauração do processo administrativo, de modo a verificar os indícios de autoria e materialidade, bem como os períodos para apresentação de defesa e recurso.

O decreto preocupou-se também em fixar parâmetros objetivos para aplicação das sanções, ao confirmar a importância da garantia de segurança jurídica, na medida em que permite um mínimo de previsibilidade para os órgãos julgadores, evitando a execução de medidas punitivas diferentes em casos semelhantes.

Outro aspecto controvertido e de enorme interesse das pessoas jurídicas bem como dos órgãos julgadores era a delação premiada, ou, na redação legal, o acordo de leniência. O decreto estabeleceu algumas condições para sua celebração e validade, como a interrupção da prática delitiva. O efetivo resultado da colaboração também passa a ser relevante. Além disso, estão definidos os efeitos do acordo, com a descrição dos respectivos benefícios que as pessoas jurídicas podem receber, tais como a isenção da publicação da decisão administrativa sancionadora, ou a dispensa (e atenuação) das punições administrativas.

Ainda, de forma inovadora o decreto disciplinou detalhadamente os procedimentos para elaboração dos programas de compliance, possibilitando que pessoas jurídicas responsabilizadas pela prática de qualquer ato ilícito previsto na Lei Anticorrupção sejam beneficiadas na dosimetria das suas respectivas sanções. No Brasil, as legislações vigentes, com exceção da Lei de Lavagem de Dinheiro, não obrigam as pessoas jurídicas a adotarem programas de integridade. Entretanto, com a implementação desta regulamentação, é orientado de forma mais objetiva o comportamento ético das pessoas jurídicas interessadas em contratar com a administração pública. A ideia central é motivar a adoção de mecanismos de controle e integridade nas empresas, ainda que tal sistema não seja exatamente obrigatório.

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As conclusões são parciais, afinal ainda não há confirmação de algum caso concreto de aplicação da lei. De início pode-se constatar que as chances de efetividade da Lei Anticorrupção aumentaram, tendo em vista a forte redução da discricionariedade administrativa, ao menos em nível federal. Tornou-se mais fácil acreditar que alguma empresa terá interesse na delação, na adoção de programas de integridade e na cooperação durante os processos administrativos.

Ao que parece, a regulamentação também servirá como alicerce para que os demais entes federativos estabeleçam ou atualizem seus próprios decretos, de acordo com suas peculiaridades. Mas este é um assunto difícil, pois nem todas as entidades federativas (notadamente os municípios) possuem a estrutura necessária para a aplicação de uma normatização tão sofisticada.

Neste momento, nos resta aguardar que a lei comece a ser aplicada. Aparentemente, e infelizmente, casos práticos para isso não faltam. Por certo os primeiros a se adaptarem às diretrizes estabelecidas, por exemplo com criação dos programas de compliance, tendem a não ser prejudicados. A palavra de ordem agora é “prevenção”.