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Hoje, é quase unanimidade entre a população que todos os policiais e políticos são bandidos, apesar de não ser verdade. Por causa disso, o que se tem criado na sociedade é um sentimento cada vez mais autoritário, um clamor de punição a todos. "Se houvesse uma pesquisa com a população, provavelmente ela decidiria por fechar o Congresso Nacional. Seria uma surpresa desagradável porque muita gente defende a cassação de políticos. Digo que é o fim dos tempos", afirma o presidente da OAB-RJ, Wadih Nemer Damous Filho.

Damous participou do painel sobre "As Garantias e os Direitos dos Advogados" na XXI Conferência Nacional dos Advogados, em Curitiba, e concedeu entrevista à Gazeta do Povo sobre as ações pirotécnicas feitas pela polícia e pela mídia quando alguém é preso. Para ele, não há dúvidas sobre a influência da imprensa nas decisões de juízes, magistrados e ministros. "Existe um clamor popular pela punição e acho que alguns magistrados se deixam influenciar por isso. O poder judiciário só acaba homologando este pré-julgamento." Confira outros trechos da entrevista:

O senhor acredita que o Brasil vive em um Estado policial?Esta expressão foi cunhada há três anos em um mandato anterior na OAB do Rio. Eu, ao contrário, vejo esta afirmação com algumas ressalvas. Vivemos em uma democracia e não em um Estado policial. Isso era no tempo da Ditadura.

A mídia influencia nas decisões judiciais?Sem dúvida. Hoje a imprensa está demitindo ministros no Brasil. Cada semana é um. O caso termina, viram-se as costas e ninguém mais fala em Ministério dos Esportes. A bola da vez agora é o ministro do Trabalho. Daqui a pouco cai e vem outro para ser derrubado.

Como o senhor avalia a cobertura da mídia em casos policiais?Diria que existe na sociedade um clamor pela punição a qualquer preço e acho que a mídia faz, muitas vezes, declarações no sentido de pré-culpabilizar pessoas. A imprensa acaba consolidando no pensamento de alguns este clamor punitivo. Sempre uso o exemplo da Escola Base de São Paulo. Os diretores da escola foram linchados moralmente e fisicamente. Isso gerou o suicídio de um senhor que foi acusado. Foi uma situação muito triste e um grande exemplo de desrespeito aos direitos de defesa em decorrência de uma conduta irresponsável da mídia.

Mas os próprios policiais fazem dos presos um troféu, não? É só lembrar do caso dos Nardoni, em que a polícia os levou em uma viatura sem insulfilm porque isso era um presente para a imprensa. Existe uma associação entre a mídia e alguns agentes que querem ter seus minutos de fama. Isso é ruim. Aqui seria chamado de censura, mas, na Suécia, por exemplo, a mídia só pode noticiar que fulano matou cicrano depois de a decisão judicial ter transitado em julgado. Até isso ocorrer, o preso é inocente.

Qual a sua visão sobre a atuação das UPPs no Rio?Tem tido êxito. Desde que estou à frente da OAB no Rio eu critico a atuação da polícia em invasão de favelas no modelo antigo, que saia atirando e executando sumariamente pessoas inocentes. As UPPs são uma superação desta política. Por quê?As UPPs pressupõem uma política mais ampla de relações sociais que influenciam na segurança pública. A criminalidade diminuiu radicalmente e as pessoas tiveram a sua cidadania respeitada. Claro que ainda há problemas, mas, no geral, as UPPs merecem aplausos.

Quais seriam os problemas?Muitas outras favelas continuam sem UPPs e a política antiga de sair atirando continua, infelizmente. Na Rocinha, agora, os juízes estão assinando mandados de busca e apreensão genéricos, ou seja, dando poderes à polícia para entrar em qualquer barraco ou casa. Isto é ilegal e inconstitucional.

E a corrupção policial?Um outro item da segurança pública é o combate à corrupção da polícia. Isto é fundamental. Lá no Rio, um grande problema são as milícias compostas em grande parte por agentes públicos, policiais, bombeiros, parlamentares.

A prisão do traficante Nem foi feita com exageros?Não houve violência. A operação na Rocinha, neste sentido, talvez tenha sido a mais correta de todas, porque não se gastou uma bala. Mas a prisão do Nem teve uma exposição excessiva. O secretário de Segurança do Rio falou com propriedade: não vamos tratar o Nem como troféu, porque o nosso troféu é a conquista do território para o cidadão que mora na Rocinha e no Rio de Janeiro. Mas infelizmente houve excessos.

Como amenizar o clamor da população pela punição imediata?É um processo pedagógico, de educação social. Deve começar nas escolas. As pessoas precisam entender que qualquer um, desde a Madre Teresa de Calcutá ao mais terrível assassino, todos têm direito à ampla defesa. A noção de processo é um instrumento civilizatório. Supera o princípio da justiça com as próprias mãos. Não podemos retroceder nisso. O agente do Estado tem de entender que o preso sob sua custódia tem que ter a integridade física e moral preservada.

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