Apontada como uma "nova forma de escravidão", a ideia de penhorar salários para o pagamento de dívidas como empréstimos ou crédito consignado foi alvo de críticas dos especialistas reunidos no painel "Direito do Consumidor", realizado ontem, em Curitiba, durante a XXI Conferência Nacional dos Advogados. Para os advogados, a prática viola a condição de sustentabilidade vital do indivíduo, atentando contra sua própria existência.
Ao fim do painel, os advogados presentes no encontro votaram uma resolução contrária à inclusão da possibilidade de penhora dos salários no novo Código de Processo Civil, mantendo as limitações existentes, que garantem a disponibilidade do salário para manutenção do assalariado e seus familiares. Apesar da restrição, recentemente alguns bancos entraram com recursos no Superior Tribunal de Justiça (STJ) para reter integralmente ou em grande parte os salários de devedores.
"O consumidor é vulnerável. Consumimos porque necessitamos, mas também por impulso. Os bancos sabem que somos tentados a consumir e oferecem crédito farto, fazendo depois o desconto das prestações em conta corrente, o que na prática significa a penhora dos salários", aponta o presidente da OAB-PB, Odon Bezerra Sobrinho, mestre em Direito do Consumidor. Ele cita o caso de uma professora no interior da Paraíba que chegou a receber apenas R$ 18 de salário. "É um problema recente, fruto do superendividamento. Ocorre o mesmo com os aposentadorias através do crédito consignado", completa.
O advogado e professor de Direito do Consumidor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Bruno Miragem diz que a penhora dos salários é expressamente vedada em países como Holanda, Alemanha e Inglaterra. "Todas as democracias evoluídas do mundo protegem o salário do trabalhador. É o recurso básico usado para o sustento. Não descarto a hipótese de que essa prática seja até mesmo inconstitucional", aponta.
A resolução aprovada ontem ainda será votada na plenária final do encontro e, se aprovada, será encaminhada ao Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Se aprovada pelo órgão consultivo, a decisão passa a ter o caráter de posicionamento oficial da OAB em relação ao tema. "Dependendo da natureza da questão, a OAB pode sugerir um Projeto de Lei ao Congresso ou divulgar publicamente essa posição à sociedade", explica o presidente nacional da OAB, Ophir Cavalcanti.
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Ao tratar da vulnerabilidade do consumidor diante do fornecedor conceituada juridicamente como "hipossuficiência" , o desembargador do TJ-SP Rizzatto Nunes falou sobre o conflito entre a publicidade e o Direito do Consumidor. "Os marqueteiros conhecem profundamente os consumidores e engendram produtos e serviços que são entregues em qualquer lugar. O sistema de marketing é capaz de entender as necessidades e medos dos consumidores: o que queremos, desejamos, precisando ou não. Cria-se uma necessidade de que as pessoas se endividem para comprar coisas de que não precisam para mostrar para pessoas de que não gostam", avalia.
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