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Esplanada dos Ministérios com Congresso ao fundo: corrupção domina Brasília. | Marcelo Camargo/Agência Brasil
Esplanada dos Ministérios com Congresso ao fundo: corrupção domina Brasília.| Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Deflagrada em março de 2014, a Operação Lava Jato já pode ser considerada a maior operação contra a corrupção na história do Brasil. Arquitetada inicialmente para desmontar quatro núcleos de doleiros, a Lava Jato já colocou atrás das grades empresários, políticos e ex-funcionários públicos depois de chegar a um esquema de corrupção dentro da Petrobras.

A Lava Jato escancarou para os brasileiros a maneira como a política é feita no país. “Nosso sistema político é criminógeno, gera criminalidade”, diz o procurador do Ministério Público Federal (MPF) Carlos Lima, que faz parte da força-tarefa da operação.

Além de deixar às claras a maneira como os políticos costumam negociar apoios e conseguir recursos para financiar campanhas e partidos, a Lava Jato trouxe importantes aprendizados para o país. “A principal lição é o fim da impunidade. Nós descobrimos com a Lava Jato que não existem pessoas intocáveis no Brasil”, diz o cientista político Marcos Coimbra.

A partir do que foi descoberto na Lava Jato, é possível levantar diversas discussões sobre o sistema político brasileiro. “A Lava Jato não resolve. Ela aponta um problema”, lembra Lima. “A Lava Jato percebeu que o nosso problema é o custo da política. Agora, eu posso conseguir as Dez Medidas no Congresso, posso gerar uma conscientização temporária nas pessoas ou um medo temporário para que não tomem esse tipo de atitude. Mas daqui a cinco, dez anos, se não mudar o motivo da corrupção, não vamos ter uma mudança efetiva”, critica o procurador.

Fragmentação partidária

Um ponto que merece discussão é a diminuição do número de partidos, que seria possível, por exemplo, por meio da adoção do voto distrital. “É melhor ser líder de um partido de dois, do que ser mais um em um partido de 60”, afirma o procurador Carlos Lima, ao comentar o surgimento sistemático de novas legendas. A mudança também possibilitaria o surgimento de novas lideranças. “Elas [lideranças] estariam focadas dentro de seus distritos, em seus problemas locais, e, por serem eleições mais baratas, você teria uma renovação na política de maneira muito mais eficiente”, analisa o cientista político Marcos Coimbra.

Outra possibilidade seria a adoção de uma cláusula de barreira. Assim, partidos que não conseguissem pelo menos 5% dos votos nas eleições não poderiam existir. Mais um caminho seria proibir as coligações nas eleições proporcionais.

Foro privileagiado

Atualmente, têm prerrogativa de foro qualquer pessoa que ocupe um cargo público no país. “É necessário ver que ser político hoje, além de tudo, garante uma expectativa de impunidade”, critica Lima. Para Coimbra, é essencial que os políticos paguem por seus crimes da mesma forma que o brasileiro comum. “Se não houvesse foro privilegiado, nós já teríamos tido uma renovação política brutal, porque muitos dos políticos que nós temos hoje já estariam na cadeia”, opina. “Os detentores de foro nos parece que têm uma certa áurea de impunidade.”

Presidencialismo

“Nosso sistema partidário é caro, e uma das formas de financiamento dele é a distribuição de cargos”, aponta Lima. Já para Coimbra, o problema no Brasil é ter uma Constituição parlamentarista, mas um sistema de governo presidencialista. “A formação de maioria que a gente tem no Parlamento é claramente parlamentarista. Nós distribuímos os apoios na Esplanada de acordo com as forças políticas que estão no Congresso”, explica.

A solução para evitar crises políticas como a atual, de acordo com Coimbra, seria definir apenas um dos regimes. “Ou instauraramos o regime parlamentarista com a atual Constituição ou precisamos revisar a Constituição para que tiremos dela os instrumentos parlamentaristas”, opina.

A melhor opção, segundo ele, seria a adoção do sistema parlamentarista, em que o primeiro ministro é eleito pela Câmara. Dessa forma, a solução de crises seria menos traumática.

A principal lição [da Operação Lava Jato]é o fim da impunidade. Nós descobrimos com tudo isso que não existem pessoas intocáveis no Brasil.

Marcos Coimbracientista político.

Voto

Para Lima, um dos motivos que levam à corrupção é o custo das campanhas eleitorais. “O sistema proporcional de voto em lista aberta faz com que o candidato a deputado, por exemplo, concorra contra todos os outros, inclusive do seu partido. É o método mais caro de todos”, diz.

Uma maneira de corrigir essa falha seria adotar um sistema de voto distrital. “Ele dividiria o Brasil em 513 distritos e todas as partes do país estariam representadas no Congresso. Isso tornaria a campanha mais barata, porque teríamos eleições majoritárias por distritos”, analisa Coimbra.

Justiça eleitoral

“A Justiça Eleitoral tem que ter possibilidade de ser eficiente. Há casos julgados depois que a pessoa nem está mais no cargo”, diz Lima. “Se houve um problema, ela tem que ter uma flexibilidade maior, para produção de provas, para uma investigação aprofundada.”

Aniele Nascimento/Gazeta do Povo

Nosso sistema político gera criminalidade. A Lava Jato percebeu que o problema é o custo da política. Daqui a cinco, dez anos, se não mudar o motivo da corrupção, não vamos ter uma mudança efetiva.

Carlos Limaprocurador do Ministério Público Federal (MPF).

Solução, só a médio prazo

Seja quais forem as lições que a Lava Jato trouxer para o país em termos de combate à corrupção na política, a solução para o problema não é simples e não deve ser rápida. Pouco tempo atrás, o Congresso tentou discutir uma reforma política, mas o que foi aprovado está longe de ser o ideal.

O cientista político Marcio Coimbra só vê um horizonte de mudanças efetivas em termos políticos a médio prazo. “Mas a crise da Lava Jato é uma grande oportunidade. A gente tentou fazer uma reforma política no Congresso Nacional no ano passado e as medidas não passaram, o sistema continua praticamente do jeito que era, só se acabou com o financiamento privado de campanha, o que na minha opinião é um erro”, avalia.

“A solução não passa em financiamento público ou privado, passa em diminuir os custos da campanha fazendo as campanhas majoritárias por distrito”, opina o cientista político.

Para o procurador do MPF Carlos Lima, o cenário pode ser mais otimista. “Eu vejo que pelo menos algumas discussões já estão acontecendo. Existem movimentos, e eu tenho a impressão que o próprio presidente atual interino tem o conhecimento do problema. Ele é um constitucionalista, eu estudei pelo livro dele, ele sabe do problema, e quem sabe possa encaminhar uma solução”, avalia Lima. “Não existem só medidas econômicas e eu tenho visto alguns indicativos de que ele vai fazer uma reforma política. Eu espero que seja uma reforma política para corrigir”, conclui o procurador.

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