Apresentado como alternativa para reduzir a interferência política nas empresas mantidas pelo Estado, o projeto de Lei de Responsabilidade das Estatais é um avanço, mas não garante o fim da corrupção nessas companhias. Na segunda-feira (6), o presidente em exercício Michel Temer (PMDB) anunciou a paralisação de todas as indicações para diretoria e presidência de estatais e fundos de pensão até que a proposta seja aprovada.
O projeto, aprovado no Senado e hoje em tramitação na Câmara, altera as regras para preenchimento de cargos de diretoria e conselho de administração em empresas públicas ou sociedades de economia mista. Pessoas com filiação partidária, de acordo com o texto, não poderão mais fazer parte da gestão das estatais. A proposta estimula que técnicos e funcionários de carreira ocupem os cargos de direção. Mas a Operação Lava Jato mostrou que nem isso é suficiente para evitar a corrupção.
O projeto estabelece critérios para indicação de membros do Conselho de Administração e cargos de diretoria, inclusive presidente, diretor-geral ou diretor-presidente. Entre os requisitos estão: ter no mínimo dez anos de experiência profissional no setor de atuação da empresa; formação acadêmica compatível e no mínimo dois anos de atuação profissional em cargo de direção em uma empresa do mesmo porte.
Para o caso de indicações de funcionários de carreira das estatais para os cargos em questão os requisitos são diferentes. Entre os critérios estão, por exemplo, a necessidade de que o funcionário tenha ingressado na organização por concurso público; tenha mais de dez anos de trabalho na empresa e tenha ocupado cargos na gestão superior da estatal. O projeto também proíbe a indicação de pessoas com filiação ou vinculação político partidária e pessoas que tenham atuado em organização sindical no período de um ano antes da nomeação.
Lava Jato
O projeto tem como objetivo coibir casos de corrupção dentro das estatais, mas pode não ter o efeito esperado. A Lava Jato, por exemplo, já mostrou que diretorias ocupadas por técnicos de carreira não estão imunes a casos de corrupção.
Deflagrada em março de 2014, a Lava Jato desvendou um esquema de desvio de recursos da Petrobras em pelo menos três diretorias: Abastecimento, que foi comandada por Paulo Roberto Costa; Internacional, pela qual passaram Nestor Cerveró e Jorge Zelada; e Serviços, cujo diretor foi Renato Duque. Os quatro diretores – e gerentes dessas áreas – já foram presos pela Polícia Federal e respondem a processos na Justiça Federal por participarem do esquema.
Paulo Roberto Costa e Nestor Cerveró firmaram acordos de colaboração premiada com o Ministério Público e passaram a colaborar com as investigações. Atualmente, Costa cumpre prisão domiciliar e Cerveró já tem data marcada para deixar a prisão e aproveitar o mesmo benefício do ex-colega.
Zelada foi condenado pelo juiz Sergio Moro a 12 anos de prisão em uma das ações que correm em Curitiba referentes à Lava Jato. Já Duque acumula até agora três condenações: 20 anos e oito meses de prisão no processo envolvendo irregularidades na Diretoria de Serviços; 20 anos e três meses no processo referente à participação da Odebrecht no esquema; e 10 anos de prisão no processo que respondia junto com o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu.
Costa, Cerveró, Zelada e Duque já eram funcionários de carreira da Petrobras quando foram indicados aos cargos de diretores da estatal. Caso o projeto em tramitação na Câmara já estivesse aprovado e já fosse lei, nada impediria os quatro de assumirem os cargos na diretoria da Petrobras.
Bom começo
Para o professor e doutor em direito Egon Bockmann Moreira, o projeto em tramitação pode não coibir totalmente os casos de corrupção em estatais, mas pode ser considerado um bom começo. “Você estabelece um começo de avanço para estabelecer um critério técnico para preenchimento de cargos técnicos”, analisa.
“O projeto tem algumas regras bastante interessantes que dizem respeito a proibição de assumir cargos em estatais por pessoas ligadas a partidos políticos”, diz Moreira. “Talvez pior do que nomear um técnico com conhecimento político é nomear um político sem conhecimento técnico”, reflete o professor.
Para Moreira, o projeto em tramitação é um começo, mas não uma garantia para acabar com a corrupção. “Eu acredito que não vai resolver o problema, mas vai inibir alguns atores que causam problemas”, diz. “Nós continuaremos nomeando seres humanos, sujeitos a tentações”, pondera o professor.
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