O ex-ministro da Fazenda Guido Mantega (governos Lula) declarou à Polícia Federal nesta segunda-feira (9) que manteve ‘relações comerciais’ com o empresário Victor Sandri, do grupo Cimento Penha.
Mantega foi conduzido coercitivamente pela Polícia Federal em São Paulo para depor no inquérito da Operação Zelotes que investiga suposta manipulação de julgamentos do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), braço do Ministério da Fazenda que funciona como uma espécie de ‘tribunal da Receita’ – julga recursos de empresas contra multas aplicadas pelo Fisco.
Entenda o que são Operação Zelotes e Carf
Leia a matéria completaEm depoimento que se arrastou por mais de duas horas, Mantega respondeu a todas as perguntas que lhe foram feitas pela PF. Sobre a ligação com Sandri – que teria sido beneficiado por um julgamento do Carf –, o ex-ministro declarou que o conheceu na década de 1990, ‘por ocasião de um negócio imobiliário’.
“Na época, eu sequer era ministro da Fazenda”, disse Mantega.
O ex-ministro relatou que herdou do pai dois terrenos na Vila Olímpia, ‘na ocasião em pleno desenvolvimento’.
“Sandri era dono de uma construtora, viu os terrenos ociosos e me consultou sobre a possibilidade de fazermos uma incorporação. Eu daria os meus terrenos e receberia em pagamento algumas unidades do edifício que iria ser construído”, contou Mantega.
Segundo ele, a primeira operação, com um dos terrenos, foi executada por volta de 1990. A outra, alguns anos depois.
“Conheci Sandri nessa operação negocial e nunca mais tive contato com ele, foi um relacionamento estritamente profissional”, reiterou Guido Mantega.
O ex-ministro revelou que ‘esteve em uma única ocasião’ com o empresário depois do negócio realizado entre ambos. “Houve, de fato, um encontro. O Sandri tem um sítio, uma propriedade a 30 quilômetros de Ibiúna (Grande São Paulo), onde tenho uma casa. Depois de concluído aquele negócio, uma única ocasião nos encontramos. Ele (Sandri) me convidou para jantar para celebrarmos a entrega das obras. Foi o único contato que tivemos afora as reuniões que ocorreram para o estabelecimento daquela incorporação.”
Mantega respondeu a todas as perguntas da PF, sem restrições. Ele esclareceu que as nomeações de integrantes do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais é atribuição do ministro da Fazenda - ao qual fica vinculado o colegiado. Ressaltou que “nenhuma outra pessoa ou autoridade teria competência de nomear conselheiro do Carf senão o próprio ministro da Fazenda”.
Sobre as multas aplicadas pelo Conselho, o ex-ministro afirmou que “não tem conhecimento de absolutamente nada”.
A PF insistiu muito no capítulo da investigação relativo às nomeações dos conselheiros do “tribunal da Receita”. Mantega ressaltou que foi em sua gestão na Pasta que criou uma “comissão de notáveis” para avaliar os indicados. “Eu cumpria o papel de ministro da Fazenda de fazer as nomeações. Quando da minha gestão criei uma comissão de notáveis, cujos integrantes eram responsáveis pela avaliação dos nomes e dos currículos submetidos ao Ministério da Fazenda para ocupar cargos no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais.”
O ex-ministro anotou que, antes do governo Lula, as nomeações “eram diretas”. “Quando assumi o Ministério da Fazenda criei a comissão de notáveis que fazia um filtro dos indicados. Só então, submetidos os nomes ao crivo dessa comissão, é que as nomeações eram feitas.”
Mantega disse que também criou uma Corregedoria. “A Corregedoria era responsável pelo recebimento de qualquer denúncia de irregularidades no âmbito da Fazenda e, portanto, no âmbito do Carf, subordinado ao Ministério.”
O ex-ministro disse que muitos fatos que estão sob investigação da Operação Zelotes foram apurados pela Corregedoria que ele próprio implementou.
Defesa
O advogado de Guido Mantega, criminalista Guilherme Batochio, classificou a condução coercitiva do ex-ministro como “ato arbitrário e ilegal”.
“O ministro Mantega já havia prestado depoimento sobre essa mesma investigação (Zelotes) recentemente. Na ocasião, respondeu a todas as indagações, como hoje respondeu. A condução coercitiva é uma truculência contra o ministro, uma ação completamente desnecessária. Um abuso. Bastava um singelo telefonema que ele (Mantega) lá se faria presente. Lamentavelmente, o juiz Sérgio Moro (da Operação Lava Jato) vem fazendo escola no País sob o beneplácito dos tribunais. Lamentável. Esse tipo de conduta não é digno de um Estado democrático de direito”, afirmou Guilherme Batochio.
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