As vozes contrárias aos desdobramentos da Operação Lava Jato repetirão o conhecido mantra, bradado à exaustão por agentes políticos, de todas as matizes ideológicas, quando instados a prestar contas de desvios de conduta: perseguição política, golpismo e congêneres, rouba mas faz, dentre outros velhos chavões da lamentável política brasileira.
Apartada a paixão, natural tanto na política quanto no futebol, que leva as pessoas a extremos, é fundamental que se avalie com objetividade e distanciamento o processo de investigação de suspeita de vícios na utilização de recursos públicos e de poder público por parte dos detentores do poder. Aristóteles bem ponderou na Política que “embora nem todas as funções públicas participem do manejo de dinheiro público, mas como algumas estão amplamente envolvidas nisso, é preciso que haja acima delas outro magistrado que, sem que ele mesmo administre alguma coisa, faça com que os outros prestem contas de sua administração e as corrija”. O filósofo tratou do tão necessário controle da conduta dos agentes públicos, que no prisma do constitucionalismo liberal democrático se exerce a partir do princípio da independência harmônica entre os poderes da República, do sistema constitucional e pelo exercício de funções públicas por parte daqueles que têm como atribuição fiscalizar a legalidade, a legitimidade e a economicidade da conduta dos Administradores Públicos.
Não pode existir democracia legítima sem controle do exercício do Poder Público
Não pode existir democracia legítima sem controle do exercício do Poder Público. E ninguém, neste processo de controle, pode estar, se sentir ou se julgar imune a ele. É nuclear para o regular funcionamento da democracia e da república (coisa pública) que todas as pessoas que administram poderes e recursos públicos sejam submetidas a controle e, em caso de desvios de conduta, sejam responsabilizadas por isso.
Não é imaginável que se possa defender que um partido, pessoa ou grupos de pessoas possam estar situados fora do alcance dos mecanismos democráticos, constitucionalmente previstos, de controle e de responsabilização pelo cometimento de ilícitos. Ao revés de perceber a intimação do ex-presidente da República para prestar depoimento junto à Polícia Federal como um ato atentatório à democracia se deve percebê-lo como prova cabal de que os mecanismos republicanos e constitucionais estão funcionando.
Registre-se que a própria Constituição de 1988 contém garantias que se violadas podem ensejar, por seu turno, a responsabilização de quem as violou! Assim, se provados o cometimento de excessos e ilegalidades na condução do processo da Lava-Jato, se deve encontrar no próprio sistema constitucional os mecanismos para recondução da legalidade e da legitimidade, com preservação das garantias do devido processo legal.
Como as decisões até então proferidas no processo referido tem sido mantidas pelos Tribunais Superiores (STF e STJ) é de se supor que não estão contaminadas por vício de legalidade ou de constitucionalidade.
Deve ser convocada a militância. Mas a militância que deve ser convocada nesta oportunidade é a militância do Brasil, que almeja com toda a força da alma, com vistas às gerações futuras desta nação, que se reduzam os índices de corrupção a patamares toleráveis e suportáveis no mundo civilizado. Então chegará o dia em que tomaremos por natural e normal que aqueles que cometem desvios no uso de dinheiro público sejam devidamente punidos. Sem paixão!
Deixe sua opinião