A insatisfação com os partidos políticos tradicionais e seus representantes é um ponto de ligação entre a crise político-econômica na Europa e no Brasil. Nos dois lados do Atlântico, há um sentimento de frustração com as respostas dadas pelos grandes partidos, seja pelas decisões de suas equipes econômicas, seja pelo crescimento da corrupção, seja pela dificuldade em se conectar com a realidade da população.
No velho continente, a resposta dada pela sociedade foi a construção de novos movimentos políticos, sejam eles à esquerda, à direita ou de centro. E no Brasil? Para os cientistas políticos consultados pela Gazeta do Povo, a natureza das crises políticas e a configuração da legislação eleitoral dificultam a transformação de movimentos políticos em atores reais da política.
Emerson Cervi, cientista político da UFPR, diz que a natureza da crise de representação na Europa e no Brasil, embora tenha pontos comuns, é essencialmente diferente. Em países como Grécia, Itália e Espanha, houve um “novo apelo” às instituições partidárias – mas de instituições que estavam surgindo, como o Syriza, e não das instituições tradicionais.
AGORA VAI?
Nesta terça-feira (25), a Rede Sustentabilidade deu um passo importante para se tornar o 33º partido do Brasil. A Procuradoria Geral Eleitoral emitiu parecer favorável ao registro e resta o TSE julgar.
No caso do Brasil, há um desgaste generalizado sem que uma alternativa real tenha se apresentado até agora. Ele pondera, entretanto, que há uma diferença de tempo: o desgaste da política tradicional já existe há mais tempo, e esses movimentos não surgiram do dia para a noite.
David Fleischer, cientista político da Universidade de Brasília (UnB), também avalia como improvável que esses movimentos se repitam no país – pelo menos neste momento. Por um lado, há a rigidez da legislação eleitoral. Ela determina, por exemplo, que apenas políticos formais possam lançar candidatos. Partidos como o Movimento Cinco Estrelas, na Itália, e o Podemos, na Espanha, começaram a lançar candidatos e a crescer no meio político como organizações informais.
Além disso, a legislação favorece, de maneira geral, partidos já estabelecidos e grandes. O tempo de televisão e o acesso ao fundo partidário são distribuídos de acordo com a representação partidária – e as grandes empresas preferem apostar em partidos e políticos com mais chances de vitória. Nesse sentido, tem maiores chances de sucesso um partido que surge de dentro do meio político, como foi o caso do PSD, do que de fora.
Fleischer considera, também, que há um aspecto fundamental que é o envolvimento. No Brasil, a população não tem um histórico de participação em movimentos políticos como na Europa.
Muito ou pouco?
Há, além disso, o número alto de partidos oficiais – 32, sendo que 28 tem representação parlamentar. Fleischer avalia o número como preocupante. Ele lembra que, na Alemanha, durante a república de Weimar (período histórico entre o fim da primeira guerra mundial e a ascensão do nazismo), eram 40 partidos representados no parlamento. A instabilidade política foi um dos fatores que ajudou o partido nazista a chegar ao poder.
Já Cervi avalia que o Brasil tem muitas legendas, mas poucos partidos. No seu entendimento, o país não deveria debater mecanismos para impedir a criação de novos partidos, mas sim para extinguir aqueles que não são representativos. Além disso, cabe a sociedade brasileira “ocupar” os partidos já existentes. “As pessoas que criticam o modelo representativo não se propõem a fazer política elas mesmas”, afirma.
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