Com uma dívida de R$ 1,2 bilhão a ser paga e um cenário econômico que derruba a arrecadação de tributos, todos os olhos da prefeitura de Curitiba estão voltados para a Secretaria de Finanças. À frente da pasta, o advogado e procurador do estado Vitor Puppi, de 35 anos, mantém um discurso austero e declarado como realista sobre a contabilidade municipal. A prioridade é pagar os servidores em dia e manter os serviços básicos em funcionamento. No atual cenário, mesmo essas ações exigem esforços.
O secretário não esconde que uma das dificuldades da gestão será pagar a reposição anual da inflação aos servidores – previsto em lei sancionada pelo próprio Rafael Greca na década de 1990.
Vitor Puppi recebeu a reportagem da Gazeta do Povo em seu gabinete na última sexta-feira, 3 de fevereiro.
Como as dívidas deixadas sem empenho afetam as finanças municipais em 2017?
A dívida sem empenho é aquela que não tem cobertura orçamentária, feita em desacordo com o orçamento. Obviamente isso é vedado por lei. O que acontece é que o custeio do município ficou muito grande, muito inflado. Então o município não conseguiu fazer os cortes que deveria ter feito na época e isso tudo acabou correndo por fora do orçamento.
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Leia a matéria completaEsses serviços e produtos relativos às dívidas sem empenho já foram entregues ao município?
São serviços prestados: são hospitais, são merendas das crianças, são diversos fornecedores que prestaram serviços, entregaram e não foram atendidos financeiramente.
Como essa dívida será paga?
O prefeito determinou que nós paguemos primeiro os pequenos credores. Nós vamos estabelecer uma linha de corte, isso ainda não está determinado, depende do pacote de ajuste que será encaminhado para a Câmara, mas nós vamos pagar primeiro os pequenos e depois precisamos ter fluxo e fôlego financeiro para pagar os grandes credores. Por exemplo, só em relação ao lixo, Curitiba deve mais de R$ 100 milhões, então não é um valor que o município tem no caixa para pagar.
A cidade corre o risco de ficar sem esses serviços?
Nós estamos fazendo de tudo, estamos atendendo aos credores da forma que podemos. a ordem do prefeito é não parar absolutamente nada, nenhum serviço. Mas, é claro, a situação é difícil. A gente está contando com a colaboração também dos credores, conforme temos caixa estamos fazendo uma gestão para pagar essas pessoas para que a população não seja prejudicada e nenhum serviço seja cortado.
Como fica a gestão financeira do município com essas dívidas pressionando ainda mais um ano com expectativa de receitas ruim?
Além de ter uma redução [de receitas], nós ainda temos esse passado que está fora. É uma despesa que já existe e não tem a receita para pagar. Para pagar isso estamos fazendo um contingenciamento de 5%, num total de R$ 400 milhões. O município vai ter que se ajustar. As secretarias vão ter que caber dentro delas mesmas. Esse contingenciamento é praticamente linear; atinge todas as secretarias, não ficou ninguém de fora.
A prefeitura tem condições de pagar o reajuste da inflação aos servidores previsto para março?
O prefeito tem a intenção de pagar, porque obviamente, foi ele quem redigiu a lei. Agora, esse ano, a nossa preocupação primordial é pagar os salários. Se nós não estamos com dificuldade de pagar os salários é difícil falar em aumento e até reajuste. Mesmo assim, o prefeito pediu que nós façamos os esforços possíveis para pagar o reajuste. Mas, hoje em dia, não tem espaço orçamentário. Teria que ter alguma outra receita para ter o reajuste do servidor.
A prefeitura cogita aumentar tributos para aumentar a receita?
Os tributos que a prefeitura cobra, por natureza, têm uma característica diferente do estado. Então, o estado consegue aumentar o ICMS e ter um salto de arrecadação; o município é um pouco mais engessado. O IPTU já teve um aumento de alíquota, e o ISS e o ITBI dependem também do cenário econômico. O que nós vamos fazer é um ajuste de procedimentos, de modernização na arrecadação. Tem espaço para trabalhar com esses tributos, mas não com o aumento de alíquota.
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Leia a matéria completaJá há alguma medida definida para o ajuste fiscal que será enviado à Câmara?
Nós ainda estamos fechando. Vai passar por uma reengenharia da previdência, o prefeito já adiantou isso. Temos que repensar a previdência. Não adianta ter uma contribuição elevada se o município não consegue pagar.
Dentro deste cenário, como garantir investimentos para a cidade?
Os investimentos caíram, de 2012 para 2016, 67%. Estava em R$ 479 milhões e chegou em R$ 156 milhões, em 2016. O que aconteceu é sintomático. O custeio apertou e não teve mais caixa para fazer investimento. Temos conversado com a Agência Francesa, o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), vamos explorar as possibilidades dentro das prioridades que o prefeito determinou. A conclusão da Linha Verde é uma prioridade.
No relatório das dívidas, a prefeitura deu bastante destaque à situação da Cohab. Qual a condição da companhia nesse momento?
Na Cohab a situação é tão grave que não se pode nem ter dinheiro em caixa porque tem ordem judicial de bloqueio dos ativos. A Cohab tem se virado para pagar os fornecedores, tem feito esforços para pagar o pessoal. O histórico da dívida é com fornecedores, construtoras, ações judicias. Nesse valor [R$ 40 milhões] não estão as contrapartidas da caixa para financiamento. Essa dívida da Cohab é de despesas correntes, embora seja uma sociedade de economia mista, são despesas correntes, então não faz parte da dívida fundada. Tem uma situação emblemática, a Cohab, com uma dívida monstruosa dessa, ao final de dezembro renovou um contrato de cerca de R$ 170 mil para o aluguel de sua sede. O prefeito já determinou que se cortem os aluguéis pela metade.
Nos relatórios contábeis, a prefeitura parece bem. Tem ainda boa capacidade de endividamento, teve superávit primário em 2016 e está dentro dos limites da responsabilidade fiscal. Como explicar essa situação?
Isso é interessante, porque nem sempre as publicações, o superávit primário, refletem a realidade. Isso porque quando tem despesas que correm por fora do orçamento, pouco importa superávit primário. Porque isso não aparece, esse empenho não vem compor essa base de superávit primário. Essas questões têm que ser ajustadas para que os quadros previstos pela Lei de Responsabilidade Fiscal não sirvam apenas de exposição, sem refletir a realidade do município. Se as despesas sem empenho tivessem sido contabilizadas, certamente teríamos um deficit, não um superávit.
Na Cohab a situação é tão grave que não se pode nem ter dinheiro em caixa porque tem ordem judicial de bloqueio dos ativos.
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