A decisão da prefeitura de Curitiba de reajustar a tarifa do transporte coletivo com índice maior do que o dobro da inflação deve dificultar ainda mais a tarefa de reverter a tendência de queda no total de passageiros transportados pelo sistema da cidade. De 2011 para 2016, o total de passageiros pagantes caiu de 246,8 milhões por ano para 211 milhões – redução de 20%. E a projeção é de nova queda para 2017.
O problema é que quanto menor a demanda maior será o preço cobrado na catraca, uma vez que a tarifa do setor leva em conta a quantidade de passageiros transportados. A saída para esse ciclo, segundo representantes das empresas, está em oferecer um transporte de qualidade e dividir o custo da tarifa com toda a sociedade e não apenas com os passageiros.
A primeira parte dessa equação, a qualidade, é um dos alvos da justificativa do prefeito Rafael Greca (PMN) para o aumento da tarifa de R$ 3,70 para 4,25. No anúncio, ele prometeu renovar a frota vencida em até seis meses e implantar o Ligeirão no eixo Santa Cândida-Capão Raso até o fim deste ano. Um dos problemas da medida, porém, é que o passageiro vai pagar essa conta antes de o sistema ser de fato melhorado.
“Se estivéssemos satisfazendo o passageiro de forma concreta, você teria espaço até para dar um aumento acima da inflação. Mas o discurso vem na frente: paga primeiro, para depois você aproveitar. Isso causa alguma desconfiança no usuário, que ainda não está recebendo o que é prometido para o futuro”, disse Marcos Bicalho, diretor administrativo e institucional da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU).
Já o subsídio para custear parte da tarifa parece distante do que o prefeito pretende para o setor. Em um texto postado na sua conta no Facebook, Greca criticou o expediente. “A política de subsidiar o transporte com dinheiro público municipal foi anestesia que não funcionou, e apenas adiou responsabilidades”, disse o prefeito na rede social.
Ainda sem a qualidade prometida, não foram poucas as pessoas que disseram estudar novas alternativas de transporte para deixar de lado o ônibus durante as primeiras horas de vigência do novo valor. E a própria Urbs já projeta uma queda de 8% no total de passageiros transportados neste ano em relação a 2016, seguindo uma tendência que vem desde 2011. Vale destacar, porém, que a empresa da prefeitura não poderia prever cenário que não fosse o mais realista possível. Por contrato, essa projeção precisa seguir a lógica porque ela é é um dos elementos que definem a tarifa técnica do setor.
Transporte coletivo perde passageiros em todo o Brasil
A queda na demanda do transporte coletivo não é exclusividade de Curitiba. Levantamento divulgado pela Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU) no ano passado mostrou que os sistemas de transporte coletivo no Brasil perderam, em média, 14,2 milhões de passageiros por mês entre 2014 e 2015– 4,2% de redução média.
Mas houve quem sentisse menos essa perda. No ano mais agudo da crise econômica, em 2015, São Paulo viu sua demanda pelo transporte coletivo encolher apenas 0,87% em relação ao ano anterior. Nesse período, a cidade vu explodir a quantidade de faixas exclusivas, que ajudam a dar mais velocidade operacional ao ônibus, e também o valor do subsídio pago pelo município ao sistema. A gestão do ex-prefeito Fernando Haddad (PT), que defendia a medida, terminou 2016 com subsídios na ordem de R$ 2 bilhões anuais. E a atual gestão João Dória (PSDB) parece encarar a situação da mesma forma: ele prometeu não reajustar o preço da tarifa em 2017, mesmo sabendo que isso aumentaria o subsídio pago pelo município.
O problema desse expediente, entretanto, é que ele fica a gosto do gestor da ocasião e da situação econômica do país. Em nome de um ajuste fiscal, por exemplo, o governo do Mato Grosso retirou neste ano a isenção do ICMS do óleo diesel. Segundo cálculos das empresas locais, isso aumentou o custo do transporte em R$ 0,22 em Cuiabá. O governador do Rio de Janeiro Luiz Fernando Pezão (PMDB) cortou o subsídio que mantinham o Bilhete Único.
No Paraná, o governador Beto Richa (PSDB) reduziu seu subsídio ao enfrentar uma briga pública com o ex-prefeito da capital Gustavo Fruet (PDT). O governo do estado hoje desembolsa para as linhas metropolitanas um valor menor do que pagava para todo o sistema dois anos atrás.
Para driblar essa questão, há uma proposta de emenda à Constituição tramitando na Câmara dos Deputados que pretende destinar ao transporte coletivo parte dos recursos obtidos com a venda de combustíveis no país. Naturalmente, a ideia é apoiada pelas empresas do setor. Mas ela também conta com o apoio da Frente Nacional de Prefeitos.