Durante todo o dia, políticos da oposição se mantiveram na ofensiva sobre o governo, exigindo punições para os envolvidos no episódio de escuta clandestina da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) nos telefones dos presidentes do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, e do Congresso, senador Garibaldi Alves (PMDB-RN). Em São Paulo, o governador de São Paulo, José Serra (PSDB), classificou de "insulto à democracia" o grampo clandestino. "Grampear o presidente do STF e um senador, é uma afronta às instituições republicanas. É preciso que o governo ponha um fim a esse verdadeiro poder paralelo que começa a tomar forma, mediante investigações isentas urgentes, e punições exemplares aos agentes do Poder Executivo responsáveis por essas ações ilegais e clandestinas."
Na mesma linha, o governador de Minas, Aécio Neves (PSDB), sugeriu em Belo Horizonte que os três Poderes adotem "normas rígidas" para investigar e punir "exemplarmente aqueles que ultrapassaram suas responsabilidades" e violaram conversas telefônicas. "É preciso que, inclusive, os órgãos de inteligência, necessários à defesa do Estado de Direito, não se transformem em instrumentos de ataque, de atentado e de instabilidade ao Estado de Direito."
Aécio lembrou a manifestação feita na véspera pelo vice-presidente José Alencar, que considerou a espionagem ilegal uma "prática intolerável num regime democrático". "Qualquer tipo de intromissão na vida pessoal de qualquer cidadão, seja ele uma figura pública ou não, é abominável e deve ser repelida com absoluto rigor pelo próprio governo e pelos outros Poderes constituídos do País", afirmou o governador mineiro.
Cobrança
Para o senador Álvaro Dias (PSDB-PR), não é mais possível isentar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva de responsabilidade por esse tipo de episódio. "A Abin é órgão ligado à Presidência da República, o presidente é quem nomeia, portanto não há como isentá-lo de responsabilidade", afirmou Dias, em Curitiba, ressaltando que a oposição "não pode ser condescendente".
"Não há como aceitar mais a consagração da tese de que o presidente da República é cidadão inimputável", protestou o senador paranaense. "Nada o atinge, ele não é responsável por nenhum dos crimes que ocorrem ao seu redor, parece que ele não foi eleito para ver e saber."
O senador Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR) foi mais longe. Em discurso na tribuna do Senado, defendeu o impeachment de Lula e a adoção do parlamentarismo no Brasil. Sob esse sistema, argumentou, seria possível ao Congresso demitir membros do governo envolvidos em escândalos sem precisar esperar a ação do presidente da República. Segundo Mozarildo, o presidente "nunca sabe de nada" nem demite os envolvidos nos "sucessivos escândalos".
Em Porto Alegre, o deputado José Aníbal e o senador Arthur Virgílio, ambos do PSDB, afirmaram que a espionagem de integrantes de altos escalões dos três Poderes remete à negação do Estado de Direito e reprisa as práticas do Serviço Nacional de Inteligência (SNI) do regime militar.
"O Congresso tem de tomar uma posição dura", defendeu Aníbal. "Vamos ver como dar uma ampla satisfação à sociedade de que não estamos criando um monstro semelhante ao que foi o SNI, próprio de um regime policialesco."
Virgílio lamentou que "se ressuscitem práticas da ditadura militar". "É preciso dar um basta nisso, deixar claro que o Brasil não pode conviver com as trevas, o dedurismo e a chantagem decorrente da luta de grupos que suplanta a Constituição."
O líder do governo na Câmara, Henrique Fontana (PT-RS), defendeu uma investigação para apurar os responsáveis pela escuta clandestina. "Não podemos sair cortando cabeças na República quando nós não sabemos quem são os responsáveis", afirmou Fontana. "Nós temos o Estado de Direito preservado, temos uma Abin que exerce seu papel e, se um erro ou uma ilegalidade ocorreu, ele será punido exemplarmente."