A 18.ª fase da Operação Lava Jato, deflagrada na semana passada, abriu uma nova frente de investigação de lavagem de dinheiro. De acordo com os investigadores, pela primeira vez na Lava Jato aparecem escritórios de advocacia como destinatários de dinheiro supostamente desviado de contratos com órgãos públicos. A Polícia Federal (PF) agora investiga se políticos – inclusive do Paraná – teriam sido beneficiados pelo esquema através de pagamentos de honorários advocatícios durante campanhas eleitorais feitos, de forma mascarada, pela empresa Consist – já investigada em fases anteriores da operação.
Segundo a PF, R$ 37,5 milhões foram repassados pela empresa a quatro escritórios entre 2011 e julho de 2015 a pedido de Alexandre Romano, suposto operador do esquema preso na quinta-feira (13) .
Suspeita
O escritório Gonçalves, Razuk, Lemos & Gabardo recebeu quase R$ 300 mil em pagamento de serviços para candidatos do Paraná no ano passado:
Campanha eleitoral de 2014 | ||
Candidato | Cargo | Repasse |
Gleisi Hoffmann (PT) | Governadora | R$ 100.000,00 |
Marcelo Almeida (PMDB) | Senador | R$ 160.000,00 |
Pedro Guerra (PSD) | Deputado Federal | R$ 17.647,00 |
Angelo Vanhoni (PT) | Deputado Federal | R$ 10.000,00 |
Bernardo Ribas Carli (PSDB) | Deputado Estadual | R$ 10.000,00 |
TOTAL | R$ 297.647,00 | |
Fonte: TRE-PR. |
Um dos escritórios investigados é o Guilherme Gonçalves & Sacha Reck, que foi desmembrado em dois em 2013: Sacha Reck Advogados Associados e Gonçalves, Razuk, Lemos & Gabardo Advogados Associados. A PF considera plausível que “os recursos pagos pela Consist conforme a orientação de Romano tenham servido a beneficiar, de alguma forma, agentes políticos e/ou partidos políticos, por meio do pagamento de serviços jurídicos a eles prestados”. Os investigadores dizem que Romano atuava como operador do PT junto à Consist desde 2010, quando a empresa obteve um contrato no Ministério do Planejamento.
Para a PF, chama a atenção o fato de o escritório Gonçalves, Razuk, Lemos & Gabardo ter recebido cerca de R$ 300 mil de candidatos nas eleições de 2014, de acordo com a prestação de contas ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). “Há que se perquirir se os pagamentos feitos pela Consist ao escritório não foram utilizados para o pagamento de despesas eleitorais, maquiando-se e ocultando-se a origem do dinheiro empregado para tanto”, questionam os delegados da Lava Jato.
Entre os políticos que pagaram pelos serviços do escritório, o que mais gastou foi Marcelo Almeida (PMDB): R$ 160 mil. Em segundo lugar aparece a senadora Gleisi Hoffmann (PT), com o pagamento de R$ 100 mil. Angelo Vanhoni (PT) e o deputado estadual Bernardo Ribas Carli (PSDB) pagaram R$ 10 mil cada um. Já Pedro Guerra (PSD) gastou R$ 17,6 mil.
Segundo a PF, pesquisas em fontes abertas apontam que não existe relação entre os escritórios de advocacia Guilherme Gonçalves & Sacha Reck e Gonçalves, Razuk, Lemos & Gabardo e as empresas do grupo Consist. Mesmo assim, as empresas do grupo pagaram aos escritórios cerca de R$ 7,2 milhões entre 2011 e 2015.
“Tal fato causa estranheza pelo fato de que, caso os escritórios tenham prestado serviços jurídicos contenciosos ao grupo Consist, seria inevitável a vinculação entre eles em decorrência de publicações em diários oficiais, por exemplo”, diz o inquérito da PF.
Os investigadores afirmaram que executivos da Consist confirmaram que realizavam pagamentos a empresas indicadas pelos operadores Milton Pascowitch e Alexandre Romano sem a devida prestação de serviços. A PF investiga agora quem seriam os destinatários finais do dinheiro.
Políticos e advogados negam irregularidades
- Kelli Kadanus e Katna Baran
A senadora Gleisi Hoffmann (PT) disse, por meio de nota, que conhece o advogado Guilherme Gonçalves de sua militância no partido e de três campanhas eleitorais que fizeram juntos (2008, 2010 e 2014). Mas ela diz desconhecer as relações comerciais do escritório de advocacia dele. A senadora diz ainda que o pagamento por todos os serviços prestados constam das declarações feitas à Justiça Eleitoral. Gleisi ressalta também que o advogado é “conceituado e referência em direito eleitoral no estado do Paraná, atendendo a vários partidos e candidatos”.
O ex-deputado federal Angelo Vanhoni (PT) também afirma que conhece o advogado Guilherme Gonçalves há tempos e diz que o escritório prestou serviços jurídicos na campanha de 2014. “Aquilo que está declarado [na prestação de contas] foi exatamente o que aconteceu”, disse. Vanhoni nega que a Consist tenha feito qualquer pagamento ao escritório para cobrir honorários relativos à sua campanha.
O deputado estadual Bernardo Ribas Carli (PSDB) diz que contratou o escritório para a campanha e que foi tudo feito de forma legal. Pedro Guerra (PSD) –que foi candidato a deputado federal na última eleição, mas não se elegeu – contou que contratou o escritório para sua campanha porque já conhecia um dos sócios desde 2010. Ele não se recorda, porém, o valor repassado ao escritório em 2014. “Me indicaram ele e, como já havia atuado para mim anteriormente, contratei para a campanha”, diz.
Marcelo Almeida (PMDB), que saiu derrotado na campanha ao Senado em 2014, declarou que o escritório atuou legalmente em todas as suas campanhas eleitorais.
Escritórios
Em nota, Guilherme Gonçalves afirmou que “prestou serviços de advocacia, consultoria e assessoria jurídica, devidamente documentados, para a empresa [Consist], conforme está firmado em contrato”. Gonçalves ainda afirma que está cooperando com a Polícia Federal na investigação, tendo liberado acesso aos documentos relativos a essa prestação de serviço.
Já o advogado Sacha Reck alega que havia um acordo entre ele e Gonçalves que, apesar da sociedade, cada um cuidava de uma área específica e de clientes específicos – no caso, os contratos com a empresa Consist seriam de responsabilidade do seu sócio.
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