Autor do projeto “Dez Medidas Contra a Corrupção”, que tramita no Congresso, o Ministério Público Federal (MPF) tem recorrido às mesmas associações, federações e movimentos de rua que mobilizaram a sociedade civil pelo impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff.
Os braços estaduais do órgão têm ativamente procurado as entidades que eles consideram ser capazes de pressionar deputados a aprovar as 10 Medidas, incluindo lideranças estaduais dos grupos Movimento Brasil Livre (MBL) e Vem Pra Rua.
A reportagem apurou que as procuradorias em cada estado estão mapeando entidades de interesse em seus territórios e convidando-as para reuniões com membros do MPF, dentro dos prédios do órgão. Não há relatos de grupos de esquerda entre os convidados.
Dos grupos com que o Ministério Público entrou em contato, pede-se o mesmo trabalho feito para afastar a presidente petista: ações na internet, protestos de rua e pressão sobre parlamentares.
As “Dez Medidas”, que conseguiram a assinatura de mais de 2,5 milhões de apoiadores, tramitam na Câmara como projeto de iniciativa popular.
Em Santa Catarina, a primeira reunião com movimentos de rua foi há mais de dois meses e participaram representantes do Movimento Brasil Livre (MBL), do Vem Pra Rua e de um terceiro grupo anti-Dilma. Eles foram procurados por Rafael Falcão Gonçalves da Silva, da Assessoria e Seção de Planejamento e Gestão Estratégica da Procuradoria da República no Estado de Santa Catarina.
Nos contatos, Silva chegou a apontar os quatro deputados catarinenses que integram comissão de análise do projeto das Dez Medidas.
No Paraná, o procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Lava Jato e idealizador das “Dez Medidas”, recebeu no prédio da Procuradoria em Curitiba representantes do G7, grupo que concentra entidades do setor produtivo do estado, inclusive a Federação das Indústrias do Paraná (Fiep).
Fotos do encontro, chamado de “primeira reunião da rede social de apoio das Dez Medidas Contra a Corrupção e a Impunidade”, foram publicadas nas redes sociais.
O G7 apoiou o impeachment de Dilma na reta final antes da votação na Câmara. As entidades no Paraná foram procuradas por intermédio do Mude, um movimento de apoio ao projeto.
No site das “Dez Medidas”, há uma relação de centenas de entidades que apoiam a iniciativa. A lista não inclui os movimentos sociais mais envolvidos na organização de protestos pró-Dilma, como o Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST).
A única exceção é o Central de Movimentos Populares, que tem a seção de Sergipe listada uma vez e a nacional, duas. A Central afirma que a seção Sergipe não é reconhecida e que entrará em contato com o Ministério Público para desautorizar a citação, já que as medidas não foram discutidas com eles.
MBL
Diferentemente do Vem Pra Rua, o MBL vê as “Dez Medidas” com ressalvas.
De acordo com o coordenador Kim Kataguiri, o movimento é favorável ao endurecimento das penas contra corrupção, mas contrário ao teste de integridade, em que ofertas seriam simuladas para testar a honestidade do servidor. “Isso não é coisa de democracia”, disse. “É coisa de regime totalitário, que usa espiões”, acrescentou.
Outro ponto rechaçado é a validade de provas ilícitas feitas de boa fé, critério considerado muito subjetivo pelo movimento, que também é contrário à limitação do habeas corpus para discutir nulidade de processo.
À reportagem o Ministério Público Federal no Paraná informou que “procurou algumas entidades, independente de sua posição política ou partidária, para explicar o projeto e deixar clara a importância de sua aprovação”.
“O posicionamento dos apoiadores das ‘Dez Medidas’ em relação a outras questões, sejam econômicas ou políticas, não reflete, de forma alguma, o posicionamento do MPF, que é apartidário”, diz nota enviada.
A assessoria do Ministério Público Federal de Santa Catarina foi procurada, mas não se pronunciou.
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