O economista Gilmar Mendes Lourenço, presidente do Ipardes, publicou em setembro passado um artigo elogiando a decisão do Banco Central de baixar os juros. Foi aqui mesmo nesta Gazeta, logo que o BC iniciou uma série de cortes na Selic: foi essa virada que levou a taxa de 10,75% ao ano para os atuais 8,5%. Diz ele que muita gente o criticou por ter apostado que a inflação não subiria. Alexandre Tombini, defendia ele, teria dado o pulo do gato e descoberto que o país podia economizar bilhões em dívida pública sem haver risco de os preços subirem.
De lá para cá, os juros vêm caindo regularmente. Hoje, ao fim de mais uma reunião do Copom, devem diminuir de novo. E o mundo não acabou. Pelo contrário. A inflação, que supostamente estava saindo de controle no ano passado (lembram de todas as charges com dragõezinhos voltando à ativa?) convergiu para o centro da meta. De quebra, deixamos de acumular uma montanha em dívida pública.
A estimativa é de que, para cada ponto de Selic, pagamos ao ano um adicional de R$ 15 bilhões. Ou seja: os dois pontos a menos desde setembro passado significam uma economia anual de R$ 30 bilhões. Economizamos mais do que o custo de Belo Monte só com isso. Essa diferença dava para pagar quatro vezes a modernização dos aeroportos feita para a Copa. Dava para pagar toda a Copa!
O "pulo do gato" foi descobrir que o aumento de preços que assustava a todos não estava nos preços que o BC pode controlar por meio de juros. O que subia eram os preços internacionais. E, contra isso, não adianta elevar juros até os céus. Portanto, o melhor era desafogar a nossa vida por aqui e tentar movimentar a economia. Veio tarde: mesmo com isso, nosso crescimento patina e continuamos endividados. Ao fim do ano, a dívida pública deve estar em R$ 2 trilhões.
O que fica, porém, é uma pergunta. Em toda essa brincadeira, quanto é que Henrique Meirelles ficou devendo para a gente? Sim, porque em oito anos de governo Lula os juros ficaram sempre em níveis altos. Quem não se lembra do vice José de Alencar fazendo a sua eterna peroração contra o abuso e o absurdo das taxas da época? Ele, que era empresário e sabia das coisas, ensinava que não faz sentido deixar que o sujeito ganhe mais dinheiro especulando com títulos do que investindo em produção.
Para Lourenço, o problema é que Meirelles vinha do mundo dos bancos. E quem mais ganha com os juros altos são os banqueiros. Portanto, Meirelles decidir qual é a taxa Selic é mais ou menos como deixar Luiz Felipe Scolari apitar a final da Copa do Brasil de hoje à noite.
Só para se ter uma ideia, em 2008, quando a crise norte-americana estourou e todos os países estavam abaixando suas taxas de juros, o movimento no Brasil foi o contrário. Além disso, o BC reduziu a taxa de depósitos compulsórios dos bancos em R$ 100 bilhões. "E o que aconteceu com esse dinheiro?", pergunta o presidente do Ipardes. Simples: os bancos compraram títulos da dívida pública, corrigidos pela Selic. E, com a taxa lá em cima, ganharam ainda mais dinheiro.
Só lembrando: em outubro de 2008, a Selic foi a 13,75%. Mais de cinco pontos superior à atual. Ou seja: se fosse possível ter a taxa que temos hoje, teríamos economizado R$ 75 bilhões por ano. A dúvida é: será mesmo que não era possível?