A Associação Nacional dos Delegados da Polícia Federal (ADPF) vai encaminhar nesta segunda-feira (13) ao presidente Michel Temer um pedido de substituição do diretor-geral da corporação Leandro Daiello. A entidade atribui à gestão de Daiello a saída de delegados que integravam a força-tarefa da Lava Jato e vê risco de prejuízo às investigações com a permanência do atual diretor-geral da PF.
A decisão de abrir uma campanha explícita para derrubar o diretor-geral – inédita na história da PF– foi aprovada em assembleia na sexta-feira (10) por 72% dos participantes. O movimento busca aproveitar a provável mudança no comando do Ministério da Justiça para trocar também a direção da PF.
Falta de apoio
Em nota, a associação afirma que, por falta de apoio da direção, “delegados que coordenavam operações policiais foram deslocados para outras áreas e locais, devido ao esgotamento físico, mental e operacional a que são submetidos”.
O comunicado coincide com a saída do delegado Márcio Adriano Anselmo (foto) da Lava Jato. Considerado um dos cabeças da operação, ele foi transferido para a Corregedoria da PF no Espírito Santo alegando justamente “esgotamento físico e mental” depois de mais de três anos de investigações.
Anselmo é o quinto delegado da PF a deixar a Lava Jato desde o início da operação. Ele havia pedido para deixar a equipe em meados de 2016 e, em janeiro, recebeu convite para assumir a Corregedoria da PF no Espírito Santo. Antes dele, foram deslocados os delegados Eduardo Mauat, Luciano Flores, Duilio Mocelin e Erika Mialik Marena – especialista em crimes financeiros e lavagem de dinheiro.
A investigação da própria Lava Jato em Brasília também estaria perdendo quadros, sendo que, cada vez mais, mira políticos com foro privilegiado. “Há um sentimento na corporação de que a Lava Jato está chegando ao fim”, diz o presidente da associação, Carlos Eduardo Sobral.
Outras insatisfações
A associação dos delegados também se diz insatisfeita com suposta falta de suporte às operações Acrônimo e Zelotes – ao lado da Lava Jato, as principais investigações de corrupção atualmente em curso. Embora não apresente números, a entidade sustenta que, nos dois casos, houve redução das equipes de investigação, o que prejudica o andamento de inquéritos com foco em políticos e executivos de grandes grupos econômicos.
A ADPF alega que a Zelotes, que investiga empresários por “comprar” medidas provisórias e decisões de impacto bilionário do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), deixou de ser conduzida pela Diretoria-Geral e foi transferida à Superintendência da PF em Brasília – o que seria um sinal de que perdeu importância.
Sugestão de nomes
Uma das delegadas que deixou a Lava Jato, Erika Marena (foto) encabeça a lista tríplice de nomes sugeridos pelos delegados da PF, em maio do ano passado, para ocupar o cargo de novo diretor-geral da Polícia Federal. Ela foi eleita por 1.330 dos 1.700 delegados em atividade. A “eleição” foi promovida pela ADFP logo depois do afastamento da presidente Dilma Rousseff da Presidência da República. À época, havia o temor de que o então presidente interino Michel Temer nomeasse um diretor-geral que pudesse interferir na Lava Jato. Temer manteve Daiello, que já comandava a Polícia Federal com Dilma.
Na carta que será apresentada a Temer, a associação voltará a defender que um dos nomes da lista substitua o atual diretor-geral. A primeira foi quando Temer tomou posse interinamente e nomeou Alexandre de Moraes para o Ministério da Justiça. Agora a ADPF quer se valer da saída de Moraes, indicado para o Supremo Tribunal Federal (STF), para emplacar um dos nomes da lista tríplice.
“Levando em conta que a atual direção da PF está à frente da instituição há mais de seis anos, sem mudanças significativas nos cargos de comando, sem modernização e avanços na gestão; considerando a vontade manifesta da ampla maioria dos Delegados de Polícia Federal que, reunidos em assembleia, decidiram apoiar a mudança da direção geral e a indicação de um dos representados em lista tríplice já votada e aprovada”, diz trecho da carta.
Além de Erika, integram a lista os delegados Rodrigo Teixeira e Marcelo Freitas, ambos de Minas Gerais.
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Na carta a ser entregue a Temer a associação argumenta que a escolha de um dos nomes da lista tríplice não alimentaria o “eventual receio da sociedade que tais mudanças possam comprometer o destino de grandes operações em curso”.
Os delegados avaliam que o temor no governo de que a substituição de Daiello possa ser interpretada como uma tentativa de estancar a Lava Jato é o principal trunfo do diretor-geral para se manter no cargo.
Para o diretor regional da ADPF em Minas Gerais, Luiz Augusto Pessoa Nogueira, a corporação precisa de “oxigenação”. “É necessário alguém que fortaleça a instituição”, afirmou. O delegado disse ainda que um dos momentos em que Daiello foi mais criticado ocorreu quando a Procuradoria-Geral da República, segundo Luiz Augusto, anunciou que delações da Lava Jato seriam tratadas sem os delegados da PF para evitar vazamentos.
A assessoria de imprensa da Polícia Federal foi procurada pela reportagem, mas disse que não iria se manifestar.
Defesa de autonomia é tema sensível na PF
A autonomia da Polícia Federal sempre foi um assunto sensível para a corporação. Em fevereiro de 2016, quando a então presidente Dilma Rousseff anunciou a troca de comando no Ministério da Justiça, com a saída de José Eduardo Cardozo e a nomeação de Wellington Cézar – às vésperas de a Lava Jato deflagrar sua ofensiva direta contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva –, delegados em Curitiba interpretaram a mudança como uma interferência direta nas investigações.
Na ocasião, a troca do delegado-geral da PF, Leandro Daiello, era dada como certa pela equipe de investigadores da Lava Jato, em Curitiba. A mudança não aconteceu. O titular da Justiça acabou substituído por Eugênio Aragão, que em maio do ano passado deu lugar a Alexandre de Moraes após o afastamento de Dilma.
Expectativas
A chegada do novo ministro, sob o comando do governo Michel Temer, provocou nova expectativa de mudança no comando da Polícia Federal e preocupação com possíveis interferências nas investigações da Lava Jato. Daiello foi mantido, no entanto, e a equipe de investigação do cartel e desvios na Petrobras acabou reforçada.
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