A obesidade infantil gera muitas dúvidas e conclusões equivocadas, segundo o nutrólogo pediátrico da Abran Carlos Alberto Nogueira de Almeida:
Crescer emagrece
Se a afirmação fosse verdadeira, ao final da adolescência todas as crianças obesas teriam crescido e emagrecido, mas isso não acontece.
A culpa é da avó
A obesidade tem um fator genético importante, portanto a culpa não é de uma pessoa ou de outra. O caso é de definir responsabilidades para a alimentação e exercícios físicos da criança.
Vitamina engorda
Quando receitadas por médicos, as vitaminas são nutrientes ingeridos em tão pequena quantidade que não engordariam alguém.
Criança obesa é preguiçosa
Para a criança obesa às vezes é muito difícil realizar certas atividades físicas, como correr ou saltar, deixando a impressão de que são preguiçosas.
Emagrecer é perder peso
Emagrecer é perder gordura. A criança pode ganhar peso porque cresceu ou porque está fazendo mais exercícios e aumentando a massa muscular.
Fruta não engorda
Quase todos os alimentos engordam. Tudo depende da quantidade que se come. Algumas frutas são ricas em açúcar (frutose) e, se ingeridas em excesso, ajudam a engordar.
Quem emagrece engorda de novo
Depois de mudar seu estilo de vida (exercitando-se e comendo menos), emagrece. Mas, se depois ela volta a ser sedentária e comer em excesso, voltará a engordar.
Para emagrecer é preciso eliminar os doces
Não é necessário tirar os doces da alimentação para emagrecer. Basta controlar a quantidade e a frequência das refeições.
Crianças obesas são mais alegres
O papel de gordinho feliz é mais bem aceito pelo grupo social. Mas afirmar que toda criança obesa é feliz, não é uma realidade.
Fique atento
Ponha em prática algumas ações simples que podem melhorar a rotina das refeições e dos exercícios físicos de toda a família:
Os televisores devem ser desligados na hora das refeições: sem distração, o momento de comer é voltado para a degustação.
Os alimentos devem ser bem mastigados: para dar o tempo adequado ao organismo sentir quando é hora de parar de comer.
Ordem de apresentação dos alimentos: primeiro a salada, depois legumes e proteínas, por último os carboidratos. Quando deixados por último, as crianças acabam comendo menos.
Fim de semana de exercícios físicos: sábado e domingo de caminhada no parque, andar de bicicleta, jogar vôlei com a família ou qualquer outro jogo que incentive e mostre a atividade física como algo positivo e divertido.
Nada de comida como prêmio ou para acalmar a criança: essas atitudes acabam pré-dispondo o indivíduo ao sobrepeso.
Perigos silenciosos
Pressão arterial e colesterol alterados se manifestam antes do aumento no peso Durante o doutorado da nutricionista Caroline Filla Rosaneli, 5,7 mil crianças entre seis e 10 anos tiveram a obesidade avaliada. Resultado: o peso não precisa estar elevado para que os pequenos apresentem alto colesterol e alta pressão arterial.
Do total, 24% das crianças apresentavam excesso de peso e 14% tinham pressão arterial alterada. "Os pais só buscam o diagnóstico quando o excesso de peso está acentuado, porém não necessariamente ele precisa estar elevado para que comecem a surgir outras doenças", comenta.
Um indicador recente apontado pela nutricionista tem sido analisado nos Estados Unidos. "Um estudo desenvolvido em Harvard tem demonstrado que se uma criança cresce e ganha peso dois percentis (medida da curva de crescimento infantil tanto para peso quanto para altura) até os seis meses de idade, ela tem sérios indícios de ser obesa aos cinco anos. É um estudo revolucionário, porque se refere à idade em que a principal recomendação é o aleitamento materno exclusivo.
A questão é: o que estas crianças estão comendo e quem é o responsável por isso?", indaga a também professora do curso de Nutrição da PUCPR.
NÚMERO
12 vezesé o mínimo de vezes que a criança deve ser apresentada ao alimento para que definitivamente decida se gosta ou não.
Foi-se o tempo que ser gordinho era sinônimo de criança saudável. E o apoio da família ao tratamento da obesidade infantil é a chave para combater os quilos a mais. Caso contrário, os pais tornam-se os maiores sabotadores dos filhos, alertam os especialistas. Afinal, mudar o que a genética predispõe não é tarefa de uma pessoa só, ainda mais quando se é criança.
Doze meses é o período máximo que uma criança normalmente fica em tratamento contra a obesidade, quando a família toda assume o compromisso. "No consultório, percebo que a criança segue tudo à risca. Quem costuma sabotar são os pais. Por isso, o tratamento tem dois momentos: com a criança, para modificar o comportamento alimentar, e depois com os pais, orientando a seguirem a dieta. A mãe tem de sumir com as guloseimas. Não dá certo ter bolacha em casa para outra criança mais magra ou ter refrigerante para toda a família", diz a psicóloga clínica e especialista em obesidade e transtorno alimentar Denise Cerqueira Leite Heller.
A imposição de limites é essencial e a comida não deve ser usada como forma de acalmar a criança, conforme explica o diretor do Departamento de Nutrologia Pediátrica da Associação Brasileira de Nutrologia (Abran), Carlos Alberto Nogueira de Almeida. "Se a família, toda vez que a criança faz birra, oferece um doce para parar, esse comportamento predispõe à obesidade."
Para mudar
Tentar compreender os pensamentos da criança com sobrepeso é um fator importante no tratamento. "Gordinhos não falam, comem. A psicóloga ensina a criança a ser assertiva, a desenvolver a capacidade de falar o que está pensando e sentindo. Os pais não sabem o que faz a criança buscar a comida. Quando pergunto para eles se sabem que o filho come quando está triste, quando está com raiva, eles desconhecem esta dinâmica", comenta a psicóloga.
A renovação do cardápio diário pode ser uma etapa mais fácil de ser administrada em casa. O problema maior, segundo especialistas, está em achar tempo para levar o filho às atividades físicas. "As crianças de hoje não têm ninguém com paciência para levá-las às aulas de dança, de vôlei, de futebol. Elas não podem sair andar de bicicleta na rua porque a violência é muito grande e acabam presas na frente da tevê", diz a psicóloga Denise Heller, assinalando ser comum que os pais desenvolvam, por esse motivo, um sentimento de culpa.
Conscientizar a família e fazer com que todos estejam de acordo com as pequenas e constantes mudanças é um longo processo. "Quando a mãe vem à consulta com o filho, nem sempre está pronta para assumir as mudanças. Às vezes ela passa a responsabilidade ao filho, mas não percebe que ela tem papel fundamental na questão. A criança ou adolescente precisa de regras e de apoio", diz a nutricionista e professora do curso de Nutrição da PUCPR Caroline Filla Rosaneli.
Reflexão
Gordinho, fofinho, obeso?
A cultura do brasileiro ainda teima em acreditar que a criança acima do peso esbanja saúde, quando na realidade a obesidade tornou-se uma doença crônica entre adultos. De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no país, 49% das pessoas com 20 anos ou mais estavam acima do peso em 2010 e 15% estavam obesos. Com relação às crianças entre 5 e 9 anos, um em cada três (33,5%) tem excesso de peso e 14,3% são obesas. Normalmente, de acordo com a nutricionista clínica Luciana Papp, é o pediatra quem identifica se a criança apresenta indícios de desenvolver a obesidade, por meio das curvas de crescimento. "Tudo é levado em consideração. A descendência da criança, o porte físico, a altura. Tudo é avaliado com muito cuidado", indica.
Cardápio sempre natural
A família da massoterapeuta Helena Taborda sempre foi adepta do estilo de vida saudável. Avessos aos fast foods, eles preferem comida caseira, com muita salada e evitam ao máximo o refrigerante. Por isso, o sobrepeso da filha Eduarda, de 9 anos, veio como uma surpresa para Helena. "Um pouco é genético. A gente faz tudo de acordo, mas sempre dá para melhorar. Trocamos o arroz normal pelo integral, comemos mais vegetais cozidos e, de sobremesa, frutas", comenta. A experiência com sobrepeso é familiar a Helena, que não quer o mesmo para a filha e a incentiva a praticar exercícios. "Ainda nos batemos para levá-la ao judô e a natação por causa da falta de tempo, mas ela gosta muito. Por isso, fazemos um esforço", relata.
Eduarda Taborda, de 9 anos, disse adeus aos quilos a mais graças a uma alimentação saudável e a aulas de judô e natação
Família em atividade
Reduzir os doces foi o primeiro passo da analista de tecnologia da informação Josmara Malaquias quando percebeu que o filho Vitor não queria mais sair de casa por causa do sobrepeso. "Até hoje não consegui incluir muito a salada na alimentação, mas não tem mais fritura, nem bolacha, chocolate em pó, cereal, só muita fruta, suco natural e isso tudo com exercícios físicos", conta Josmara, que é mãe também de Matheus, irmão gêmeo de Vitor, das gêmeas Amanda e Nathália e esposa do Amarildo.
Para o tratamento funcionar, a família toda entrou na rotina de alimentação saudável aliada a exercícios. Hoje, com 18 anos, Vitor agradece aos pais pela mudança. "Não havia dietas loucas, mas a família inteira entrou no esquema. Agora todos fazem academia e eu acabo acompanhando os meninos", diz a analista.
Os gêmeos Matheus e Vitor na pre-adolêscencia tiveram excesso de peso e hoje frequentam a academia todos os dias
Consciência veio tarde demais
Daniela Anile teve mais dificuldades em superar o sobrepeso na infância. A estagiária de TI, de 23 anos, conta que a família sempre regulava o que ela comia e os exercícios que praticava, mas nunca se envolveu na reeducação alimentar da filha. "Quando minha mãe não me deixava comer algum doce, eu comia escondido no colégio, no terminal de ônibus a caminho da escola", conta.
Ainda na adolescência, ela começou a entender melhor a importância em controlar a alimentação, mas foi no início da fase adulta que a consciência bateu. "Em dezembro do ano passado fiz a cirurgia bariátrica e a partir de então eu controlo mais a alimentação e faço musculação e caminhada de segunda à sexta."
Para ajudar as crianças da família, Daniela sempre orienta os primos e sobrinhos a regularem aquilo que comem. "Eu oriento, tento ajudar, mas sei que é difícil entenderem principalmente por serem crianças. Se minha família tivesse se envolvido na infância, talvez eu não precisasse ter chegado até a cirurgia", relata. Para incentivar o exercício físico, Daniela não perde tempo e sempre que pode apresenta à sobrinha Alice, de um ano e três meses, os benefícios das atividades.
Daniele Anile tem 23 anos e luta desde a infância contra o sobrepeso. Na foto, Daniela com o cunhado Marcos Chella e a filha Alice
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